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Dom
Brasil, 2003
Drama - 91 min.

Direção: Moacyr Góes
Roteiro: Moacyr Góes, Machado de Assis (romance)

Elenco: Maria Fernanda Cândido, Bruno Garcia, Marcos Palmeira, Thiago Farias, Luciana Braga, Malu Galli, Gustavo Otoni.

Em 1899 não havia teste de paternidade por meio de exame de DNA. Quando Machado de Assis (1839-1908) escreveu Dom Casmurro, o seu romance mais conhecido, teve então que se contentar com um final aberto: nunca soube-se, como desconfiou Bento, o casmurro do título, se a sua esposa Capitu o traiu.

Mas hoje - esta época de acesso veloz e total à informação - existe a mastigação cultural. O público pede aquilo que já conhece, repele o que não entende, e os artistas arriscam no limite da segurança. Hoje existe também o exame de DNA. Faltava só alguém perceber a oportunidade à frente do nariz.

Diretor de teatro desde 1986, de telenovelas desde 1999, o natalense Moacyr Góes percebeu. Se uniu à Diler & Associados, produtora habitual dos filmes da Xuxa, e batizou de Dom (2003) a sua estréia no cinema. A trama é clássica. Depois de anos, Bento (Marcos Palmeira) reencontra Capitu (Maria Fernanda Cândido), o amor de sua juventude. Amam-se, casam-se e têm um filho. Mas à medida que Capitu investe em sua carreira de atriz, Bento se enciuma. Inclusive imagina que a criança nasceu de uma traição, entre o seu melhor amigo, Miguel (Bruno Garcia), e a mulher. No limite do descontrole, Bento recorre ao tal exame.

Góes faz questão de marcar o respeito pelo livro - com belos flashbacks da infância dos protagonistas, ou inserindo trechos literais do romance nos momentos de reflexão de Bento. A química entre os três globais do elenco também flui sem maiores embaraços. Os problemas começam quando Góes passa a interferir na história clássica.

Pá de cal


Primeiro surge escancarado um discutível bairrismo entre Miguel, o carioca despachado, e Bento, carioca que se muda para trabalhar em São Paulo. E não bastam as piadas que atiçam a rivalidade. Miguel precisa, necessariamente, posar de praiano sensual, enquanto Bento transpira em bicas e ensopa a sua camisa social.

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O bairrismo é, repita-se, discutível. Mas a segunda intervenção de Góes no texto machadiano, a ênfase lacrimosa que imprime aos dramas pessoais, é vexatória. As reviravoltas amorosas acontecem bruscamente e, em conseqüência, de maneira superficial. Do reencontro do casal de amigos ao beijo, dá-se um passo. Daí até Bento dispensar a sua antiga noiva, não vão mais que cinco minutos. Aliás, a cena da separação entre Bento e Heloísa (Malu Galli) é emblemática do maniqueísmo. Ela vestida de preto, ele de branco: um exemplo bom da teatralidade rasa e até da simplificação (cariocas/paulistas, tranqüilos/ciumentos, justos/destemperados) que marcará o resto do filme.

As falhas seguem com a consumação do amor de Bento e Capitu. Na tentativa de tornar o texto contemporâneo e dinâmico, Góes perpetra diálogos banais, dignos de novela de Manuel Carlos. Vale destacar o momento em que Bento e Capitu discutem com que carro sair, se vale a pena levar o bebê no jipe, se deixam o carro no estacionamento da empresa, e por aí vai. Tudo acompanhado por uma trilha sonora repetitiva, por vezes irritante, ora de chanchada oitentista, ora de suspense de segunda linha.

Maria Fernanda, em sua boa estréia no cinema, não desonra o prêmio de melhor atriz que recebeu em Gramado. Inclusive, são muito bem salientados também os seus atributos físicos. O problema aqui é a caracterização da personagem.

A Capitu machadiana era fria, provocadora, calculista, de certo modo distante tanto de Bento quanto do leitor - e aí reside a força do mistério principal. A Capitu de Góes ganha a luz de Maria Fernanda, mas nem todo o talento da atriz serviria para superar a obviedade que o roteiro empresta ao papel. Não há mais frieza, distância, nem mistério - apenas os berros sem razão de Bento diante da mulher acuada. A Capitu de Góes nunca seria adúltera, pois, ilibada, equivale a qualquer donzela injustiçada de qualquer telenovela. Eis a pá de cal derradeira em Dom.

Quando chega, enfim, o tal exame de DNA - elemento que, afinal, serve de justificativa para a releitura de Machado -, o filme já está sepultado. Fica difícil conter o riso, ou o descaso, ou a indignação. Nessa hora, só nos resta lamentar.

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