Deixe-me Viver | Crítica
As cores separaram as fases da vida da protagonista com grande competência.
O título original de Deixe-me viver é White oleander, que em português quer dizer oleandro branco. Oleandro é o nome de um arbusto, cuja bela flor possui um veneno tóxico, capaz de matar. "Por que alguém teria algo assim em casa?", pergunta em determinado momento do filme um dos personagens. A resposta se confunde com a trama do filme e tem mais níveis do que a flor tem pétalas, passando pelos questionamentos da maternidade, orgulho e egocentrismo.
Baseado no livro As flores brancas de oleandro (Editora Globo), escrito por Janet Fitch, o drama mostra o crescimento conturbado e a adolescência de Astrid Magnussen (Alison Lohman).
Os primeiros doze anos da menina são confortáveis e pouco desafiadores, já que a companhia de sua mãe, uma artista plástica de comportamento agressivo, cuidou de afastar todos os elementos externos que poderiam prejudicá-las. Ingrid Magnussen (Michelle Pfeiffer), a mãe, despreza sentimentalismos e pessoas com personalidades mais dóceis, que qualifica como menores. Ciente de sua beleza, capacidade de sedução e domínio sobre o sexo oposto, Ingrid não suporta ser abandonada pelo namorado, e acaba assassinando-o.
Com a mãe condenada à prisão perpétua, Astrid passa a viver em lares adotivos, casas cujas famílias recebem subsídio do governo norte-americano para acolherem crianças que vivem nos orfanatos estatais. A vida tranqüila da menina entra em colapso e, longe da mãe, tem que encontrar forças para sobreviver nas casas adotivas por onde passa, enfrentando agressões e situações pelas quais nunca havia imaginado passar. Tais suplícios são enfrentados com inteligência e buscando refúgio em seu talento artístico nato, que se desenvolve conforme ela aprende quem realmente é e qual o verdadeiro significado de sua mãe para ela.
Apesar da história envolvente e elenco estrelado, Deixe-me viver peca em termos narrativos. Traz uma montagem linear, bastante burocrática, que não deixa espaços para surpresas ou inovações no filme. Talvez uma limitação do diretor Peter Kosminsky, mais acostumado a longas para a televisão.
Porém, se não soube explorar a edição, pelo menos Kosminsky contou com a sensível visão do diretor de arte Anthony R. Stabley, que trabalhou com Takeshi Kitano (Dolls) em Brother e ao lado de Rupert Wainwright em Stigmata. Stabley empregou cores para separar as fases da vida de Astrid com grande competência.
O filme começa com azuis na casa da mãe, passa para um confuso arco-íris no lar da ex-stripper Starr (Robin Wright Penn), emprega os tons pastéis para a solitária Claire (Renée Zellweger) e abusa do negro com a russa trambiqueira Rena (Svetlana Efremova). Todas as transições entre lares, passadas num orfanato, trazem a cor do ambiente anterior, desbotada.
O branco, como nas flores do oleandro, só chega no desfecho, explicando o título do filme (o original, não a equivocada versão brasileira) e dando sentido à natureza da planta e ao relacionamento entre mãe e filha.