Guarde o Coração na Palma da Mão expressa a dor de ver Gaza através das telas
Documentário é protagonizada por Fatima Hassouna, fotojornalista morta em bombardeio
Créditos da imagem: Reprodução
Com exceção de quem luta diariamente para sobreviver por lá, as explosões, tiroteios e destruição da Palestina são tipicamente vistos através das telas. Em reportagens de televisão, vemos os aviões israelenses sobrevoando Gaza, em documentários, testemunhamos a tensão na Cisjordânia, e através de redes sociais em smartphones, tudo isso e mais um pouco é infinitamente reproduzido. Não é à toa, então, que Guarde o Coração na Palma da Mão e Caminhe contextualiza uma guerra assim. Nas telas.
É uma decisão, claro, feita por necessidade. A diretora Sepideh Farsi não tem como ir a Gaza entrevistar Fatima Hassouna, a fotojornalista palestina de 24 anos que serve como sua correspondente no meio do caos; enviando fotos e dando testemunhos em primeira mão sobre o que é viver um dos episódios mais tristes da história moderna. Guarde o Coração, porém, também se tornou uma grande homenagem a Fatima. Ela foi morta num bombardeio um mês antes do filme estrear na mostra ACID, no Festival de Cannes 2025. Suas últimas imagens estão ali. Numa ligação por vídeo com uma diretora que também tem uma história de batalhas – Farsi foi presa e fugiu do Irã para escapar do regime.
A morte de Hassouna é uma tragédia. É verdade que assistir ao filme com isso em mente potencializa toda a obra, adicionando um ar de inevitabilidade pesado a cada minuto, mas isso nada mais é do que uma pequeníssima consolação diante do fim de uma vida. Essa vida, nos primeiros FaceTimes com Farsi, se apresenta com um lindo sorriso, constante apesar do sofrimento ao seu redor. Ela está feliz de participar de um filme, independente da situação. Ao longo do documentário, esse sorriso vai diminuindo. Os sonhos de Fatima vão junto. A princípio, ela diz a Farsi que sonha em viajar pelo mundo. Antes de morrer, seu sonho vira comer galinha pelo menos mais uma vez. Nenhum dos dois sonhos foram realizados.
Assistir a essa narrativa trágica através de um iPhone é algo simultaneamente poético e devastador. Estamos sempre com um grau a mais de afastamento de Fatima, e por mais que Farsi – que filma a chamada usando outro celular para sempre vermos as arestas a envolvendo e frequentemente deixa uma televisão ligada no noticiário global no fundo da cena, novamente situando o conflito em pixels – tenha longas conversas com a entrevistada, ela também se sente separada. Em momentos onde baixa a guarda, a diretora admite o desespero. O pior, ela diz, é saber que não há nada que ela possa fazer. “Você está ao meu lado,” responde Fatima, garantindo que aquilo é o suficiente para ela.
Farsi não discorda, mas nós sabemos que ela gostaria de estar mais perto. A separação entre o mundo e a Palestina, então, se mostra ali presente. Quando vemos as fotos de Fatima, ou assistimos às filmagens em baixa resolução – encontrar uma conexão de internet por lá já é difícil, mas uma conexão boa é impossível – de prédios demolidos que ela faz enquanto conversa com a cineasta iraniana, a realidade do momento se mostra inescapável.
Hoje, telas são infestadas de violência. E se as telas estão sempre à nossa volta, assim também está a violência. Guarde o Coração na Palma da Mão e Caminhe tira seu poder de situar os últimos meses da vida de Fatima Hassouna nos quatro cantos de uma imagem digital. É uma abordagem que ocasionalmente deixa o filme um tanto quanto cansativo. Mas, para ser justo, não é sempre assim que ficamos quando não desligamos do celular e suas imagens de desastres?
Guarde o Coração na Mão e Caminhe
Put Your Soul on Your Hand and Walk
Excluir comentário
Confirmar a exclusão do comentário?
Comentários (0)
Os comentários são moderados e caso viole nossos Termos e Condições de uso, o comentário será excluído. A persistência na violação acarretará em um banimento da sua conta.
Faça login no Omelete e participe dos comentários