Crítica: O Poder do Soul
Documentário recupera registros de show histórico em Kinshasa
Em 1974, Muhammad Ali e George Foreman se enfrentaram no Zaire, na contenda em que o primeiro buscou retomar seu título mundial dos pesos-pesados. Aproveitando a oportunidade, promotores musicais buscaram um evento casado, unindo esporte e música, apoiado pelo governo do país africano.
Em setembro, partiram então ao continente negro artistas como James Brown, B.B.King, The Spinners, Bill Whiters, Celia Cruz e vários outros, para três noites dedicadas ao Soul.
Soul Power
Soul Power
O Poder do Soul (Soul Power, 2009) é o registro 25 anos atrasado desse concerto.
Documentário competente, o filme não se vale de narrações em off, entrevistas atuais ou qualquer tipo de artifício habitual quando o assunto é um evento do passado. A edição excelente emprega apenas cenas de época - muito bem filmadas e com contraste vibrante - no desenvolvimento. Da farra no avião aos problemas na construção em uma época em que a comunicação era lentíssima, passando pelos entraves governamentais, os engraçadíssimos figurinos funk e as fantásticas e verborrágicas entrevistas filosóficas de Ali (Foreman não aparece em momento algum) até os shows em si, o longa é perfeito em todos os aspectos.
Jeffrey Levy-Hinte, o diretor, conhece muito bem o tema. É dele a montagem de Quando Éramos Reis (When We Were Kings, 1996), longa "irmão" deste, que detalha a parte esportiva daquela antológica primavera em Kinshasa. Ele consegue transmitir a sensação de euforia, de "volta para casa" dos artistas - em sua grande maioria negros - e a fascinante jam session cultural que se segue. O ritmo domina o Zaire, que durante três dias teve como idioma oficial a música. É de trazer lágrimas aos olhos a constatação, ao som de um percussionista norte-americano, a proximidade entre os povos. "Evoluímos separados, mas somos a mesma gente", explica um dos músicos.
A parte final de O Poder do Soul, claro, se dedica a um apanhado das três noites de apresentações. Cada banda e artista, seja ele local (espere só pra ver a orgulhosa e imponente cantora que se apresenta em sua língua nativa, com estalos!) ou norte-americano, ganha uma música. Exceto o "Godfather of Soul", Mr. James Brown, que encerra a produção com um clímax bem ao seu estilo, vestindo berrante um colante azul e disparando seus guinchos para o delírio da platéia - a do show e a do cinema.
Eram os caras mais legais do planeta em seu auge, fazendo seu melhor. Um documentário engajado sem ser chato, cheio de ritmo e celebração.
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