Crítica: Ondulação
Filme canadense fica entre a simpatia e a afetação ao trilhar a via indie das bizarrices
A primeira cena de Ondulação (Curling, 2010) já indica o rumo que o roteirista e diretor canadense Denis Côté dará ao seu quinto longa-metragem. Jean-François (Emmanuel Bilodeau) leva a sua filha Julyvonne (Philomène Bilodeau, filha de Emmanuel na vida real) ao oculista. Ela descobre ter astigmatismo, vai precisar de óculos. É a senha para um filme sobre os primeiros contatos com o mundo, contato contra o qual não há resistência possível.
Saint-Hilaire, ao sul de Montreal, no começo do inverno, logo depois do Natal, não é o lugar mais hospitaleiro do mundo. Percebemos isso já na segunda cena, o caminho de pai e filha do oculista para a casa, travessia a pé numa estrada castigada pela nevasca. Como um obstáculo contra o vento, Jean-François faz de tudo para proteger a filha. Julyvonne nunca foi à escola, na sua casa não tem TV nem internet. O máximo que Jean-François permite é levar a filha ao boliche onde ele trabalha.
curling
Curling adota o jeito dos filmes indie dos EUA de apresentar a diversidade do mundo: com personagens deslocados (góticos e tatuados, caubóis, idosos jogadores de curling) e situações bizarras (cadáveres congelados, telefonemas mudos, um tigre surgido do nada). Fica delimitada entre a simpatia e a afetação essa tendência a abrir caminho no mundo pela via da excentricidade.
Quem não se incomoda com o artificialismo ocasional e com simbolismos engraçadinhos - Jean-François deixa o solitário boliche e se interessa pelo coletivo curling num momento de desamparo - talvez enxergue no filme relances de sentimento autêntico. São tocantes e bem resolvidas as cenas com a prostituta. Já a subtrama da detenta soa incompleta. No saldo, Curling parece tentar achar uma voz própria dentro de uma estética que está tendo dificuldades em se renovar. O empate fica de bom tamanho.