Anjos Exterminadores | Crítica
Anjos exterminadores - Festival do Rio 2006
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Os anjos exterminadores (Les anges exterminateurs, 2006) foi a forma que o cineasta Jean-Claude Brisseau encontrou para exorcizar seus próprios fantasmas. Ele foi condenado a um ano de prisão (não teve de cumprir) e a pagar 15 mil euros por assédio sexual a duas atrizes durante as filmagens de Coisas Secretas (2002). Segundo elas, o diretor de 62 anos as obrigou a se masturbar durante os testes de escolha de elenco com o objetivo de satisfazer seu próprio prazer. Brisseau alegou que era indispensável fazer as cenas para construir seu filme. Ele só esqueceu de dizer que prosseguiu fazendo esses testes, mesmo depois de já contar com outras atrizes contratadas.
Coincidentemente, o novo filme de Brisseau é sobre um cineasta cinqüentão chamado François (Frederic Van Den Driessche). Em uma certa noite, dormindo em seu quarto com sua esposa, ele recebe a visita de sua falecida avó. Ela o previne para se cuidar e não se deixar levar. Assistindo a tudo isso estão duas jovens (Raphaele Godin e Margaret Zenou), que representam anjos caídos. Elas parecem estar seguindo ordens que irão determinar o destino de François.
No outro dia, descobrimos que François está fazendo testes para um suspense erótico com uma atriz (Virginie Legeay). Ela precisa fingir um orgasmo. Ao final do teste, ela revela que teve um orgasmo durante a cena, pois se excitou com a presença da câmera e porque ele estava assistindo. Isso acaba inspirando François a iniciar um novo projeto cinematográfico: descobrir os verdadeiros prazeres das mulheres sem as amarras da sociedade. O que realmente as excita. Ele começa a busca por atrizes que possam ser filmadas se masturbando e discutindo suas fantasias sexuais para, desta forma, transgredir a natureza sexual feminina.
Em suas entrevistas, ele acaba encontrando três mulheres: Julie (Lise Bellynck), uma loira misteriosa, Charlotte (Maroussia Dubreuil), uma morena instável emocionalmente, e Stephanie (Marie Allan), outra loira esquisita. Durante os testes coletivos ou individuais, elas se entregam de corpo e alma num balé pornô-erótico de masturbação e carícias apaixonadas. François não participa. Só observa e filma. Mas isso não o impede de chegar em casa e fazer sexo apaixonado com sua esposa. Percebemos que os anjos estão manipulando os acontecimentos e que algum castigo está prestes a acontecer.
A defesa
É evidente que Brisseau realizou esse filme com a intenção de apresentar sua versão dos fatos para o público sobre as acusações que sofreu. Em sua concepção, o sexo é sempre acompanhado de hipocrisia e violência. No filme, as atrizes ficam visivelmente fascinadas pelas cenas que estão protagonizando. Não conseguem parar ao final das sessões. Uma delas chega até a se descobrir lésbica durante o processo. Outra busca em François uma forma de resolver seu complexo de Electra - acredita estar possuída por algum demônio. Tudo isso irá abalar suas vidas emocionalmente que buscarão se vingar de François. Fica claro que ele foi um simples catalisador de suas verdadeiras personalidades. Ao final acaba se tornando uma vítima dos desejos obscuros dessas mulheres.
O filme acaba ganhando um clima de fábula com as aparições do fantasma da avó, os anjos e mensagens radiofônicas enigmáticas. Essas mensagens são para demonstrar que muitas vezes não somos donos de nosso destino. Só seguimos instruções que nos são sussuradas por seres invisíveis. As filmagens são eroticamente registradas sem nenhum pudor. Nada é cortado. O fetiche masculino é explorado aos píncaros. Através das lentes se Brisseau, o público se torna um voyeur privilegiado. E com esse recurso, o diretor tenta provar que a psique masculina e feminina não são tão opostas assim. Segundo ele, homens gostam de olhar e mulheres de se exibir. Como observador, o homem pode descobrir os mistérios dos prazeres das mulheres. Assim ele consegue fazer a associação de que qualquer cineasta é um voyeur e a atriz uma exibicionista em potencial.
Com essa abordagem, Brisseau transpõe a representação do sexo, mostrando que é uma linha tênue o que separa documentário de ficção. As atrizes que o colocaram na justiça cometeram um equívoco. Ele não pode ser culpado por elas se descobrirem sexualmente. Brisseau chega até a mostrar que os tais anjos caídos o perdoaram. Se criaturas sobrenaturais têm esse poder, por que não os simples mortais? Mas essas teorias são construídas com o intento de manipular o espectador e oferecer uma visão simplista sobre um assunto bastante complexo. É impossível não ter a sensação de que as atrizes estão sendo realmente exploradas por François por causa de suas curiosidades eróticas. Brisseau alega que o roteiro estava pronto desde 2003 e que o filme não tem nenhuma relação com o processo judicial. Até nisso, ele se mostra manipulador.



