Abá e Sua Banda convence transplantando fórmula Disney para animação brasileira
Bonito de olhar, ainda que um pouco familiar demais, filme de Humberto Avelar tem carisma
Créditos da imagem: Cena de Abá e Sua Banda (Reprodução)
É sempre bacana ver uma animação brasileira, como Abá e Sua Banda, chegar ao circuito comercial e/ou ao streaming - este longa, em específico, já impactou os dois - com uma proposta de atingir o mainstream infantojuvenil para o qual a maioria dos filmes nesse formato é dirigido. Infiltrar uma narrativa nacional em meio aos Meu Malvado Favoritos e Divertida Mentes do mundo é uma missão das mais nobres que o audiovisual pode empreender, incutindo em um público jovem a ideia de que se faz bom entretenimento, e se contam histórias bacanas, também em seu país. Só assim se formam artistas, é claro, mas também só assim se forma uma plateia que prestigia a indústria local, livre do complexo de vira-lata que ainda assombra gerações mais velhas.
Melhor ainda é quando uma animação brasileira faz o que se propõe tão bem, como esta dirigida por Humberto Avelar. A ideia de Abá e sua Banda, desenhada com clareza pelo roteiro de César Coelho, Daniel & Sílvia Frahia e Sylvio Gonçalves, é importar para o contexto de produção nacional uma fórmula testada e aprovada no cinema animado gringo. Dos arquétipos em cima dos quais os personagens são construídos (você vai identificar o vilão do filme assim que ele entrar em cena) ao arco narrativo pelo qual o filme empurra seus protagonistas, com direito a desvios específicos de rumo e um grande momento de revelação, este é um musical da Disney com DNA nacional. E, embora essa operação de transplante crie certa familiaridade que nem sempre ajuda Abá e Sua Banda, ela ainda deixa espaço para a invenção.
Esse espaço aparece, principalmente, no âmbito visual. O mais legal das quase 1h30 de Abá e Sua Banda é acompanhar enquanto Avelar vai incorporando estilos e formatos artísticos diferentes ao seu mundo. Uma animação 2D mais rudimentar, quase quadro-a-quadro, aparece no início do filme em um flashback; a combinação entre personagens e ambientes imediatos de CGI com backgrounds mais traçados encanta durante o miolo da história; e a elasticidade dos movimentos dos personagens impressiona nas cenas musicais. Não que não haja elementos e sequências que perdem em detalhismo e fluidez para produções hollywoodianas, é claro, mas há um impulso criativo muito claro no filme de Avelar que lhe empresta todo o charme que ele tem.
Isso e a construção de mundo dedicada do roteiro. Não satisfeitos em fazer dos seus protagonistas frutas antropomórficas - Abá vem de Abacaxi -, o longa os insere em todo um reino frutífero inventado, com hierarquias de poder, alianças e desafetos, tradições e rituais relacionadas à polinização e à preservação da natureza. E ainda por cima, além do texto ambiental, Abá e sua Banda se embrenha num espinheiro político ao configurar opressores e oprimidos com penetrância rara para um projeto infantil. Eis aqui, no fim das contas, a história de um governo que marginaliza parte de seus cidadãos e caracteriza sua resistência como subversão violenta - não por acaso, mas como parte do plano malévolo do grande vilão. Miséria e injustiça como projeto de poder, enfim.
É uma ideia audaciosa de se incutir em um filme destinado ao público infantil. Com canções contagiantes e um trilho narrativo sólido que ele busca seguir à risca, Abá e Sua Banda tem tudo para conquistar esse público. O que ele faz além disso, no entanto, é o que o torna mais interessante.
*Abá e Sua Banda foi exibido no Festival de Cinema Sul-Americano de Bonito - Bonito CineSUR 2025. Fique de olho no Omelete para a cobertura completa.
Abá e Sua Banda
Excluir comentário
Confirmar a exclusão do comentário?
Comentários (0)
Os comentários são moderados e caso viole nossos Termos e Condições de uso, o comentário será excluído. A persistência na violação acarretará em um banimento da sua conta.
Faça login no Omelete e participe dos comentários