A Terra Encantada de Gaya | Crítica
A Terra Encantada de Gaya
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Dublagem é uma carreira ingrata. Muito espectador torce o nariz, diz que prefere legenda, áudio original. E dublador deve ficar irado quando contratam um ator global ou uma celebridade da TV para substituí-lo na tarefa que ele custou a aperfeiçoar.
Não é um trabalho fácil. Tem horas em que percebemos como é importante estudar interpretação, impostação de voz, educá-la a minimizar sotaques acentuados, etc. Vendo uma animação como A terra encantada de Gaya (Back to Gaya, 2004), por exemplo, é fácil perceber como uma dublagem sem preparo e direção resulta em desastre.
Sabrina Sato, ex- Big Brother, atual Pânico na TV, empresta sua voz de paulista de Penápolis à personagem Alanta, herdeira do trono de Gaya. Em certo momento na história fulano diz que eles precisam correr, recuperar um artefato, impedir o vilão. E ela responde: "Ééé verrrrrrrrrrrrdade!". A sala vem abaixo com as gargalhadas - e era uma cabine de imprensa, uma dúzia de críticos (paulistas).
Tudo bem que a caracterização visual da personagem, uma princesa que mais parece a Lara Croft do Funk Carioca, não ajuda muito. Mas no original a voz é da inglesinha meiga, ótima atriz, Emily Watson (A noiva cadáver)! E sotaque britânico rima com pompa, realeza... Tem tudo a ver com a natureza do filme. Não precisa manter o áudio em inglês, claro, afinal produção infantil tem que ser dublada mesmo - mas bem dublada. Não dá pra esculhambar. "R" retroflexo é demais.
Isso não chega a vitimar o filme. Mais integrantes do humorístico comparecem, e surpreendentemente Wellington Muniz, o Ceará, ao lado de Carlos Alberto, o Mendigo, se saem muito bem. O primeiro consegue passar emoção ao personagem Boo, usar de fato o microfone como se estivesse atuando. E Mendigo sabe transferir sua persona roufenha ao brutamontes Bramph, encaixando-os. Passado o ataque de riso do primeiro "Ééée verrrrrrrrrrrrdade!", portanto, é possível prestar atenção no que acontece na tela, enfim.
Fórmulas Disney, todas juntas
Co-produção inglesa, espanhola e alemã, Gaya tem equipe essencialmente germânica. O diretor Lenard Fritz Krawinkel vem de seis curtas e longas em live-action (com atores reais). Holger Tappe, que co-dirige o filme, é estreante. Cabe a Don McEnery e Bob Shaw - colaboradores dentre a infindável seleção de roteiristas da Disney/Pixar que criou Hercules (1997) e Vida de inseto (1998) - assinar o script e levar a fama de "criadores" pelo know-how adquirido na meca das animações.
Não que o filme esteja próximo do selo Pixar de qualidade, pelo contrário. Está mais perto das fórmulas Disney, todas elas reunidas. O amor proibido segundo a hierarquia do reino, a criatura que ensina lições ao mestre, a superação do personagem franzino e medroso, o galã e a heroína que não se bicam mas cooperam, o cientista louco e a terra de gigantes tentam se equilibrar na história.
Gaya é um reino fictício criado pelo simpático Sr. Albert Drollinger para uma série de TV. As crianças adoram as aventuras do galã Zino e seu escudeiro, Boo, contra os trapaceiros Snurks. Vibram com Alanta, que luta para sair da sombra do rei e mostrar seu valor. Um dia, porém, nenhum deles consegue impedir que a dalamite, pedra fundamental da energia dos gayans, seja roubada misteriosamente. Ela vem parar na Terra, juntamente com os personagens diminutos.
Mas Gaya não é uma obra de ficção dentro da ficção? Sim, e aí está o trunfo do desenho. Os gayans vieram parar num mundo que só os conhecia pela televisão. Até o próprio Albert Drollinger se surpreende quando assiste à sua obra saltitando, de verdade, na sua frente. A confusão de universos paralelos foi provocada pelo cientista Professor N. Icely, que tem objetivos bem nefastos. Para piorar, se Zino, Alanta e os outros não retornarem com a dalamite, Gaya estará condenada.
A metalinguagem rende bons momentos. Resta ao espectador decidir se isso serve de alívio, diante da dureza que é atravessar a animação de polígonos primários, a clicheria e a dublagem.



