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Cantora ícone da cultura trans de SP, Linn da Quebrada vira estrela de documentário na Berlinale

Bixa Travesti discute identidade de gênero no festival alemão que, neste domingo, foi dominado pela aventura chinesa Monster Hunt

18.02.2018, às 16H00.

Muitas facetas do documentário brasileiro já chamaram a atenção dos europeus no 68º Festival de Berlim: sexta, Karim Aïnouz falou de geopolítica em Aeroporto Central e, no sábado, Luiz Bolognesi discutiu etnocídio indígena com Ex-Pajé. Domingo é dia de debate sobre gêneros sexuais e transfobia, com a luxuosa participação da cantora Linn da Quebrada em Bixa Travesti, que será exibido no CineStar. A direção é do casal Claudia Priscilla (realizadora de Leite e Ferro) e Kiko Goifman (que rodou Atos dos Homens e FilmeFobia). Juntos, eles já haviam falado sobre representação do corpo em relação ao desejo homoafetivo e à cultura trans em Olhe Pra Mim De Novo, exibido na Berlinale em 2012. Mas o novo trabalho é uma apoteose de Linn na luta contra o jugo da heteronormatividade.

“Linn é um paradigma de corpo que se pensa travesti, que se vê como pessoa trans sem usar prótese de silicone”, diz Claudia. “Ela canta ser uma ‘mulher com pau’, o que abre precedentes para a discussão de um novo corpo. Precisamos repensar o que é homem e o que é mulher e entender que, entre uma ponta e outra, pode existir dezenas de novos gêneros”.

Conhecida por hits como "Enviadescer", a cantora participou do projeto no roteiro e na edição. “É um filme com ela, e não sobre ela”, diz Claudia. “Estamos vivendo tempos muito difíceis no Brasil, onde o lugar da arte é o da provocação e da reflexão, incluindo sobre a identidade gênero. A partir desta reflexão, podemos repensar a transfobia e a homofobia, ciente de que o Brasil é o país que mais mata travestis no mundo inteiro. Curiosamente, é o país que tem mais procura pelo sexo virtual de pessoas trans. O Brasil é essa confusão”.

Reconhecidos internacionalmente pela estrutura narrativa inventiva de seus filmes, Claudia e Kiko esgarçam a fronteira entre fato e ficção em Bixa Travesti. “Criamos situações em que a personagem pudesse desenvolver suas performances. A Linn aparece aqui como locutora de rádio. E tem toda uma história de ficção no meio”, promete Kiko.  

Nesta segunda, a Berlinale confere o que pode ser o seu mais exótico concorrente ao Urso de Ouro em 2018: Season of the Devil, um musical com quase quatro horas de duração dirigido pelo filipino Lav Diaz, laureado aqui em 2016 por A Lullaby to the Sorrowful Mystery com o Troféu Alfred Bauer (que coroa invenção de linguagem). Seu novo trabalho, longuíssimo como lhe é peculiar, fotografado em preto e branco, vem sendo descrito como uma ópera rock sobre a opressão das milícias nas selvas das Filipinas. Misticismo e filosofia se fundem na obra do cineasta.

“As pessoas assistem maratonas de dez episódios de Game of Thrones e não reclamam disso. Por que um filme de quatro horas incomoda tanto?”, questionou o cineasta em um papo com o Omelete. “O tempo é o que cinema precisa ter de mais livre”.

Um evento em especial roubou a cena da Berlinale neste domingo: uma concentração de espectadores asiáticos, a maioria da China, com um ardor de torcida organizada, fez fila no Friedrichstadt Palast para aplaudir a continuação de um dos maiores blockbusters do Oriente: Monster Hunt. O primeiro filme da franquia, de 2015, faturou US$ 385 milhões só em território chinês. Na sequência, lançada aqui, o monstrinho Wuba conta com a ajuda de um trambiqueiro (Tony Leung, de Amor à Flor da Pele) para escapar de caçadores de criaturas mágicas. Calcadas em lutas de espada que desafiam a gravidade, as sequências de ação filmadas pelo diretor Raman Hui, de Hong Kong, injetaram adrenalina nas veias de Berlim, sem embotar a linha cômica.

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