Cameron minimiza “efeito DiCaprio” na bilheteria de Titanic: “Só uns US$ 100 mi”

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Cameron minimiza “efeito DiCaprio” na bilheteria de Titanic: “Só uns US$ 100 mi”

Em entrevista para o relançamento do filme nos cinemas, diretor também compara iceberg com aquecimento global: “Os pobres vão sofrer”

Omelete
8 min de leitura
09.02.2023, às 06H00.
Atualizada em 09.02.2023, ÀS 10H12

Poucos nomes no cinema mundial se comparam ao de James Cameron. Neste momento, o diretor canadense tem três das quatro maiores bilheterias da história da sétima arte em todo o mundo - números bilionários que vão continuar subindo. É que, além de Avatar: O Caminho da Água continuar em cartaz nos cinemas, Titanic retorna à tela grande nesta quinta (9) com uma edição especial comemorativa de 25 anos.

O cineasta poderia creditar parte dessa enorme conquista financeira a um dos astros de Titanic, Leonardo DiCaprio, correto? Afinal, no final dos anos 1990, o ator vivia um verdadeiro frisson, com uma horda de fãs devorando tudo relacionado ao astro. Jim - como é chamado pelos mais próximos - discorda.

Muito [dinheiro] foi feito com o apelo do Leonardo DiCaprio. Ok, eu dou um crédito, conseguimos cerca de US$ 100 milhões da bilheteria com o apelo dele com adolescentes de 14 anos”, diz Cameron, com leve sorriso, durante coletiva de relançamento de Titanic - um evento virtual com a presença do Omelete. “[Mas] O que eu acho que realmente estava acontecendo é que as jovens mulheres viviam nesse momento - da pós-adolescência, meados da adolescência - em que a sociedade lhes diz para não serem quem são.

[As jovens são doutrinadas para] Não para serem as pessoas incríveis e ilimitadas que realmente são, e estão sendo instruídas a se sentar, calar a boca, colocar aquele espartilho, e fazer o que a sociedade espera. Fazer o que a sociedade dominada pelos homens espera.

Para o cineasta, o que ressoou nesse público - e continua a ressoar - não é a beleza de Jack, o personagem de DiCaprio. “Este é um filme sobre Rose, o personagem da Kate Winslet”, afirma. A trajetória, o amor entre os dois é o catalisador nas transformações da protagonista. “Ela percebeu o seu potencial. Isso dialoga com a parte feminina do público”.

Em certo momento, a metáfora é transportada de forma poética para a tela: “[...] uma das cenas mais memoráveis é quando ela [Kate] está sendo colocada em um espartilho, o que obviamente é um símbolo visual para a restrição da sociedade e pela família”, explica.

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Um caminho que, como sabemos, se encerra com uma das maiores tragédias da humanidade, com Titanic se partindo em dois e afundando no Atlântico Norte - o que ajuda no impacto: “A beleza da história que culmina de forma trágica”, filosofa o diretor.

Você pode ter uma comédia romântica com um beijo no final, indo para o pôr do sol. Mas há algo muito mais poderoso, eu acho, sobre uma história de amor que contém a [dor da] perda. Em que há a separação. E, claro, não há separação mais permanente do que a morte”.

Ao final, após a tragédia e a resolução do conflito do enredo, temos Rose finalmente reencontrando Jack a bordo do Titanic - ambos jovens, bonitos e sorridentes. O que significa aquela cena?

Se é o além-vida, ou se é só a Rose, uma idosa de 103 anos, imaginando o reencontro com Jack?”, revida Cameron. “Talvez seja só a celebração da memória da coisa mais importante que aconteceu na vida dela. [...] Você pode ter uma interpretação secular, ou religiosa. Ou saudade. Um tipo espiritual de saudade”.

O iceberg é o aquecimento global

Para James Cameron não é apenas a libertação de Rose que faz de Titanic um filme atual, mesmo 25 anos após o seu lançamento. Há diversas outras camadas dentro do roteiro, incluindo uma alegoria para o aquecimento global.

Para o canadense, o iceberg no qual o gigante transatlântico colidiu pode ser visto como a mudança climática que estamos sentindo hoje, na Terra. “Fomos avisados sobre isso por anos, estamos vendo vindo direto para nós, e não podemos virar o navio. É exatamente como o maldito iceberg”, alerta de forma contundente. “Vamos bater de frente [com o aquecimento global], e adivinha quem vai sofrer mais? Os pobres. Não as nações ricas que causaram isso.

Foram o capitão e o proprietário da linha de navios a vapor, mesmo sabendo dos riscos, que atenderam à sua rica base de clientes (com sua impaciência para chegar a Nova York) e causaram o naufrágio em primeiro lugar”, desenha o diretor. “E foram os pobres que sofreram, numérica e estatisticamente.

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Como o cineasta relembra, morreram praticamente todos os homens da terceira classe - onde Jack, personagem ficcional inspirado em pessoas reais, estava. Metade das mulheres e crianças da mesma classe também perderam a vida na tragédia. Já entre os mais ricos, na primeira classe, praticamente todas as mulheres e crianças sobreviveram, enquanto morreram 50% dos homens.

Como você pode ver, há uma grande disparidade entre o que acontece com os pobres, o seu destino em uma crise, e o que acontece com os ricos”, afirma um categórico Cameron.

Nossa fé na tecnologia

Tirando a história de amor entre os dois protagonistas, que é uma ficção, James Cameron foi extremamente atencioso à fidelidade dos detalhes em Titanic, inclusive no desenrolar de eventos que levou o navio à tragédia. Para isso, a produção recriou grandes partes do transatlântico em escala 1:1. “O set tinha uma distância de 228 metros, uns 30 metros a menos que o Titanic real. Mas as pessoas entenderam errado, falaram que era uma miniatura com 90% da escala. Não é. É 100% da escala do navio real”, relembra.

Ainda assim, uma curiosidade: o cineasta afirma que foram chamados apenas figurantes “baixinhos” para as filmagens. “Nenhum extra com mais de 1m73 podia ser escalado, porque basta um cara com 1m93 para fazer todo o navio ficar menor”.

Curiosidade: Leonardo DiCaprio teria dificuldades em ser um figurante no filme que ele mesmo estrelou, já que o ator tem 1,83m de altura.

O resultado era algo impressionante, mesmo visto de longe. “Quando você dirigia pela colina em Rosarito, em Baja [Califórnia], no México, e via aquele navio, era como: ‘Cara, é o Titanic parado ali.’ Você via a quilômetros de distância. Foi louco”.

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Tudo isso, na concepção de Cameron, com o objetivo de passar para as novas gerações uma mensagem importante: de que somos humanos e falhamos.

É um lembrete do que pode acontecer quando se coloca muita fé na tecnologia e na nossa inteligência.

Curiosamente, o diretor diz que, hoje, não teria feito sets tão grandes, que foram inundados e destruídos para as filmagens da parte final do longa. “Não tivemos que construir Pandora [o planeta onde se passa Avatar] de forma real para nos satisfazer. Nós construímos pequenas partes e pedaços dos sets e fizemos todo o resto em computação gráfica. Então posso dizer seguramente que faríamos [Titanic hoje] de forma diferente. [Mas] O resultado final não seria diferente”, confessa.

Por que assistir a Titanic em 2023?

Vamos ser sinceros: por que assistir a Titanic nos cinemas hoje em dia? “Há o empoderamento feminino, há uma história de amor, há um tipo de grande cenário épico, trágico e altamente novelístico que realmente aconteceu. Há o que aprender sobre a História. Há a precisão histórica na filmagem que fizemos”, lista o diretor.

E caso você esteja cansado de “lacração”: “É uma história de amor. Você pode esquecer toda a intelectualização e apenas seguir o caminho da pura emoção”, complementa.

Agora, o filme está por aí há um bom tempo. Se você não tem uma das inúmeras edições do longa-metragem em DVD ou Blu-ray, ainda assim poderia vê-lo no Star+ até outro dia (o título não consta mais no streaming por conta do relançamento nos cinemas). Tudo isso com um ótimo equipamento, sem precisar sair do sofá.

Quer saber? Os televisores estão ótimos, sabe? E os sistemas de som em casa são bem bons hoje em dia. A diferença decisiva que existia há 25 anos, em termos de apresentação física, não é mais tão decisiva”, concorda Cameron.

Mas vou te dizer uma coisa que é fundamentalmente diferente sobre ir ao cinema: você toma a decisão de levantar o seu traseiro, entrar no seu carro, dirigir pela cidade, pagar caro pelo estacionamento, pagar um monte de dinheiro por ingressos e pipoca, e sentar sua bunda e gastar 3h15min em uma atração de parque”, diz o diretor enquanto pinta um cenário com as palavras. “Você não pode pausá-lo, não pode dividi-lo em duas ou três noites consecutivas porque é mais conveniente. Você não pode fazer várias tarefas ao mesmo tempo, cozinhar o jantar para as crianças, pedir uma pizza, pegar uma cerveja na geladeira, o que for. Você não pode pausar a maldita coisa, certo?”.

Então agora você está indo para uma atração e essa emoção está começando a crescer em você. [...] [Quando] Você chega ao fim daquela experiência, daquela sessão de três horas, é devastador de uma forma que não vai acontecer em casa”.

Além disso, na visão do cineasta, há toda uma sensação de nostalgia, de quando as pessoas assistiram a Titanic pela primeira vez, nos cinemas. “Eles lembram onde estavam em suas vidas e em seus relacionamentos, ou onde estavam, com quem estavam”, comenta. “Titanic nos liga a momentos no tempo porque é algo meio que atemporal”.

Nós podemos re-relançar essa coisa em dez anos, e dez anos depois disso. Eu já terei ido embora deste mundo e as pessoas ainda vão continuar querendo assistir”, conclui James Cameron.

Pois é, Jim. Se a trajetória do Titanic, o navio, se perpetuou na História por sua catástrofe, o filme Titanic continuará para sempre para nos relembrar da glória e tragédia humanas. E, de forma ainda mais fundamental, do verdadeiro amor, aquele que liberta.

Titanic reestreia nos cinemas brasileiros nesta quinta-feira, dia 9.

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