Cena de Ugly Betty

Créditos da imagem: Reprodução

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Dez motivos para maratonar Ugly Betty, que chega ao Disney+

Versão americana do clássico mexicano foi a única a quebrar importantes padrões do clássico colombiano

30.01.2021, às 12H00.

Encontrar Ugly Betty para assistir tem sido um problema para todos os que se lembram com carinho da trama que ficou no ar pela ABC entre 2006 e 2010. Até mesmo adquirir os boxes em DVD das temporadas era problemático, já que a tiragem da quarta e última temporada se tornou uma raridade em muito pouco tempo. A era dos streamings chegou, se estabeleceu, e Ugly Betty permanecia no limbo. Neste 29 de Janeiro, o Disney+ presenteia os fãs com a chegada da série à plataforma. Uma vez que a própria ABC pertence ao grupo Disney, esse anúncio era uma questão de tempo. Betty Suarez e seu poncho poderão finalmente adentrar a modernidade.

Pensando nisso, preparamos uma lista com dez motivos para maratonar a série, seja lembrando de todo o sucesso que ela conquistou ou mesmo para conhecer essa encarnação de uma das histórias mais contadas do mundo, que teve na sua versão americana diferenças que dialogavam com o momento de diversidade e empoderamento que estamos vivendo, muito antes de determinadas problematizações terem começado na mídia. Ainda que com um desenvolvimento problemático Ugly Betty merece sua atenção, e logo abaixo vamos dizer porquê.

Yo Soy Betty, La Fea

Yo Soy Betty, La Fea
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A história de Betty foi criada em 1999 por Fernando Gaitán para a televisão colombiana e, sem nenhuma expectativa, alcançou um sucesso absoluto e impressionantes 335 capítulos. A história era uma espécie de Cinderella, que começava quando um jovem herdeiro assumia a presidência de uma publicação de moda e contratava uma secretária aspirante que apesar de hiper competente, era feia. É claro que com o tempo Betty vai “ficando bonita” e conquistando o coração do chefe.

Após o imenso sucesso da original colombiana, Betty foi adaptada para dezenas de países como Alemanha, Índia, México, Espanha e até China. O Brasil conheceu a personagem com a exibição do original, feita pela Rede TV. Mais tarde, a Record produziu sua própria versão, chamada de Bela, a Feia, que mudava o nome da protagonista, mas mantinha o esqueleto central da história. O mais interessante é que, apesar de tantas adaptações, a versão americana foi a única a olhar a história com uma ótica moderna e engajada, o que acabou sendo muito responsável por seu sucesso perante a crítica especializada.

America Ferrera

Ugly Betty
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Há um momento marcante da cultura pop proporcionado por Ugly Betty, que é seu primeiro dia na revista Mode, quando ela chega vestindo um poncho gigante com a inscrição “Guadalajara”. Patrícia Field (figurinista que também vestiu Sex And The City), estava estabelecendo o visual de Betty por meio de uma declaração política. Era muito importante que o público entendesse que aquela era uma mulher mexicana, orgulhosa de suas raízes, e que isso jamais iria mudar.

Para que a série funcionasse, o público precisava se apaixonar por Betty. America Ferrera não era muito conhecida, tinha poucas passagens pelo cinema, mas abraçou a personagem de uma maneira impressionante. Ela tinha a comédia, a doçura e ao mesmo tempo a determinação. A Betty criada por America não era só uma heroína atrapalhada, justamente porque a atriz não impedia que aquela persona evidenciarsse seus defeitos e fraquezas. Mesmo com coadjuvantes adoráveis, Betty nunca foi ofuscada e isso se deve absolutamente à sensibilidade de America.

Imagem corporal

Ugly Betty
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Em todos os episódios de Ugly Betty, a vinheta de abertura rasgava a tela com um close gigante da personagem e o título em uma fonte seca provocava a audiência com uma suposta obviedade: Betty é feia. Nos anos que se seguiram, America Ferrera dizia nas entrevistas que aquele título fazia parte da perspectiva alheia, do olhar do outro para aquilo que é considerado bonito ou não. Para ela, Betty nunca foi feia, ela só não era convencional e nem iria se deixar influenciar pelo mundo onde foi parar na busca por uma oportunidade de trabalho.

Apesar de todos os problemas com enredos malucos, a série nunca se perdeu desse propósito. Ao contrário da versão original e das versões espalhadas pelo mundo, a Betty de America Ferrera não passou pelo processo de “embelezamento” para conquistar o chefe ou ser aceita. De certa forma, toda vez que isso acontecia nas outras versões, Betty perdia a identidade, tornava-se um novo elo dos padrões e suas origens latinas desciam pelo ralo. A protagonista de Ugly Betty estava confortável com o próprio corpo e com a própria aparência, e sua evolução visual mantinha o pé no chão. Meninas latinas, gordinhas, não precisavam mudar nada para alcançar os próprios sonhos. Betty venceu e conquistou tudo que quis, sem nunca se perder de si.

No último episódio, o “Ugly” do título se apaga e temos apenas “Betty”. Uma história de bastidores resume bem do que a trama se tratava: ao contar para America Ferrera que ela seria Betty, Salma Hayek (a produtora) disse que “a personagem não tinha a missão de livrar-se da feiúra, ela sabia que era bela. Sua missão era acabar com a feiúra dos outros, pouco a pouco, de dentro para fora”.

Betty, a linda

Ugly Betty
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Outro aspecto libertador da história de Betty na versão americana foi a iniciativa de dar à personagem várias storylines românticas com atores que não seriam escalados para ser interesses românticos para a protagonista sem que ela tivesse passado pelo “makeover” (com exceção de um deles, o primeiro, que logo foi excluído). Da primeira até a última temporada, as paixões de Betty foram comuns a uma protagonista de novela, com triângulos amorosos, sacrifícios e dilemas. Em nenhum dos casos a personagem foi compelida a mudar em nome daquelas relações e os homens se apaixonaram por ela não “apesar” de sua aparência, e sim justamente por causa dela.

Fashion

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É importante reforçar que, apesar de todas essas questões engajadas, a série é pura diversão, com o exagero das novelas, mas com uma direção pop irresistível. Parte do grande apelo está no pano de fundo principal, que é a chegada de Betty até a revista Mode, um lugar que não é nem meramente capaz de entender a forma como a moça se expressa na vida e nas roupas. Por isso, quando Betty começa a trabalhar lá, passamos vários episódios nos deliciando com as perspectivas opostas que geram tiradas geniais tanto de Betty para o mundo fashion quanto do mundo fashion para Betty. Nenhuma das críticas que ela faz é ignorada pelo roteiro, mas algumas delas servem para serem analisadas mais profundamente, até que em algum ponto, a personagem perceba que moda também é uma forma de arte.

Alexis

Ugly Betty
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Hoje em dia a representatividade transgênero está ganhando cada vez mais do seu merecido espaço. Mas em 2006 não era bem assim. Por isso, Silvio Horta (o showrunner responsável pela série) precisou se esforçar muito para convencer os executivos da ABC a permitirem que Alex, o irmão supostamente morto de Daniel (Eric Mabius) retornasse como Alexis depois da transição. O mistério foi mantido quase até o final do primeiro ano, mas finalmente a revelação foi feita. Rebecca Romijn – que não é trans - ficou com o papel, mas declarou muito tempo depois que, nos dias de hoje, o correto seria que uma atriz trans assumisse a posição.

A presença de Alexis foi uma marco, já que era a primeira vez que uma personagem trans surgia como uma mulher poderosa. Mesmo assim, a série tropeçou em alguns momentos no desenvolvimento das histórias e, ainda que com boas intenções, cometeu erros. Aquela não era uma época onde o assunto estava amadurecido, o que não diminuiu seu impacto positivo.

Justin

Ugly Betty
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Se alguns erros foram cometidos com Alexis, podemos dizer sem medo que a trajetória de Justin (Mark Indelicato) foi bastante coerente. Quando a série começa e vemos que no seio daquela família mexicana existe um menino afeminado, achamos imediatamente que a história do personagem será sobre ser aceito. Um dos grandes acertos da produção foi fazer com que Justin nunca experimentasse desconforto ou rejeição dentro de casa. O avô, a mãe, a tia, o pai... todos o aceitam e o defendem. Justin ainda tem inseguranças e medos, mas eles são parte de seu enfrentamento com o mundo. O personagem também foi um dos poucos e dos primeiros a não tornar sua homossexualidade um argumento narrativo de dor e sofrimento. Além disso, suas tiradas sobre cultura pop e moda eram sempre espertas e engraçadas.

Mark e Amanda

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Com forte influência da amizade entre Jack e Karen, de Will & Grace, Mark (Michael Urie) e Amanda (Becki Newton) eram a dupla politicamente incorreta mais adorável da série. Os dois eram superficiais, maléficos, egoístas e hilários. Ele, assistente da vilã, e ela, a recepcionista. Assim como em Will & Grace, por mais que eles fossem seres humanos de caráter tão duvidoso, havia sempre um elemento de redenção, especialmente na última temporada, quando a proximidade com Betty se torna tão inesperada quanto fascinante. Urie sempre foi muito celebrado pela imprensa, mas o trabalho de Becki como Amanda provoca gargalhadas e lágrimas em vários momentos.

Wilhelmina

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Wilhelmina Slater (Vanessa Williams) é, sem dúvida, uma daquelas vilãs quase cartunescas que ficam marcadas na memória por serem detestáveis e ao mesmo tempo maravilhosas. Suas motivações são novelescas (ela quer mais e mais poder), seu figurino é estonteante e seus valores, mesmo ignorados, vem à tona quando ela está prestes a dar um passo definitivo para o lado sombrio da força. Vanessa Williams criou uma personagem charmosa, inteligente, que mesmo fazendo as maiores maldades, permanece fabulosa. Por ter sido a vilã dessa pseudonovela seriada, muitos dos absurdos criados para manter a série no ar caíram em cima dela. Contudo, o charme nunca foi perdido.

Betty e Daniel

Ugly Betty
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Em todas as versões da história de Betty, ela se apaixona pelo chefe, que precisa ver através da “feiúra” para se interessar por ela também. Ugly Betty foi a primeira a entender que a personagem não precisava de um homem para ter motivos para celebrar a própria autoestima ou a própria competência. Então, a decisão de fazer com que o amor entre Daniel e Betty fosse fraternal acabou sendo a mais acertada. Betty e Daniel se tornam amigos, e ao passo em que ela o ajuda a perceber que ele tem muito mais a oferecer do que lhe fizeram acreditar que podia, ele vai abrindo as portas da revista para ela, pouco a pouco, conforme o talento e a competência sobressaem àquela aparência que ele inicialmente considera jocosa.

A quebra dessa expectativa romântica entre eles foi o grande diferencial da série, que resistiu ao apelo dos fãs por anos e não cedeu. America Ferrera vinha falando em reunions e revivals (que se tornaram uma possibilidade ainda mais distante depois da trágica morte de Silvio Horta) - embora a possibilidade a animasse muito, ela não queria que um retorno acontecesse para que Daniel e Betty terminassem como um casal. Segundo ela, a presença de Betty na vida de Daniel o ajudou a compreender que ele não era um reflexo dos rótulos que lhe colocavam, já que ela mesma, Betty, nunca se deixou convencer das impressões que os outros tinham dela.

Sob esse aspecto, a série cumpriu sua missão. Ugly Betty era engraçada, inteligente, sagaz, cheia de ternura e cheia de beleza. Seu legado não é nada feio, e já estava na hora de ser disponibilizada para o deleite da nossa nostalgia. 

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