Abril de 2020 é um mês extremamente importante para o Batman. Afinal, marca o aniversário de oitenta da estreia de três dos personagens mais importantes da mitologia do Homem Morcego. Há exatos oitenta anos, a primeira edição do título solo do herói apresentava Dick Grayson, o primeiro Robin, a vilã/anti-heroína/interesse amoroso Selina Kyle/Mulher-Gato e o psicótico vilão Coringa. De 1940 para cá, o trio conquistou seu próprio espaço dentro da indústria dos quadrinhos – e da cultura pop como um todo – e se tornou essencial para o desenvolvimento do Cavaleiro das Trevas.
Um ano após sua primeira aparição na 27ª edição de Detective Comics, Bruce Wayne/Batman já havia se tornado extremamente popular entre os leitores de quadrinho, o que levou a então National Comics a expandir o universo do herói. Em abril de 1940, o número 38 da revista deu ao Cruzado Encapuzado seu icônico ajudante mirim, Robin, criado inicialmente para atrair fãs mais jovens para as histórias do personagem.
Apresentado como um jovem trapezista que perde os pais durante uma apresentação, Dick Grayson ajudou a trazer leveza para as HQs do Batman. Sua primeira aparição, que mostra Bruce Wayne treinando o garoto para ajudá-lo a prender o assassino dos pais, já apresentava não só seu colorido visual inspirado no lendário Robin Hood, mas também a relação de pai e filho característica da dupla.
O sucesso do personagem foi imediato, tanto que, nos primeiros anos após sua estreia, era extremamente raro que uma história do Batman não trouxesse o Menino Prodígio. A popularidade do Robin permitiu que o personagem se soltasse do Homem Morcego em diferentes histórias, culminando na criação dos Jovens Titãs, então formados por Grayson, Moça-Maravilha, Kid Flash e Aqualad, em 1964.
O amor que o público tinha pelo então Robin fez com que sua influência fosse sentida por toda a indústria dos quadrinhos. Imediatamente após a criação do personagem, figuras como Ricardito, Bucky Barnes, Superboy, Moça-Maravilha, Kid Flash e outras “versões teen” de super-herói foram introduzidas nas histórias de seus respectivos mentores.
Dentro da própria DC Comics, o Robin era visto como inseparável do Batman. Mesmo após a dupla de quadrinistas Dennis O’Neil e Neal Adams tentaram separar a dupla – e Marv Wolfman colocar o Robin como peça central dos Novos Titãs -, fãs seguiam fascinados pela dinâmica que o herói trazia para a revista do Cavaleiro das Trevas. Com isso, a década de 1980 marcou a chegada de dois novos ocupantes do cargo: Jason Todd, em 1983, e Tim Drake, em 1989.
Hoje, Dick Greyson chega aos 80 anos deixando marcas significativas nas HQs: além de ser um dos principais líderes da Bat-família, o herói estrela sua própria revista, criou e liderou diferentes encarnações dos Titãs e já substituiu o próprio Bruce como Batman em diversas ocasiões. Inicialmente criado para atrair crianças e adolescentes para as HQs, o Robin se tornou um dos principais símbolos da DC e dificilmente o Cavaleiro das Trevas terá seu nome desligado do Menino Prodígio no futuro.
De inimiga a grande amor
Introduzida em 1940 apenas como “The Cat” em Batman #1, a Mulher-Gato nem ao menos teve seu nome verdadeiro revelado em sua primeira aparição. Assim como o Robin, Selina Kyle foi criada com o objetivo de atrair um novo público para os quadrinhos: as mulheres. Ao contrário do Menino Prodígio, no entanto, a vilã foi concebida como uma femme fatale capaz de rivalizar intelectualmente com o próprio Batman, além de ser apresentada como um interesse amoroso em potencial para o herói.
Da mesma maneira que o Robin mostrava o lado paternal de Bruce Wayne, Selina foi, ao longo dos anos, mostrando sua fragilidade emocional. Em suas primeiras aparições, a vilã e o herói flertavam e ficava subentendido em algumas edições que o Cavaleiro das Trevas a deixava escapar por causa de seus sentimentos por ela.
A troca de flertes entre os personagens e seu eventual envolvimento amoroso fez com que o Batman fosse visto como um personagem mais humano, especialmente após a personagem conquistar de vez os holofotes da DC nos anos 1970.
No decorrer da década de 1990, as aparições da personagem em outras mídias, como Batman: O Retorno e A Série Animada solidificaram seu lugar na bat-família. Assim como Dick Greyson, Selina estrelou sua própria revista e, eventualmente, se uniu de vez ao Batman, com edições recentes mostrando os personagens em um relacionamento duradouro e esperando um filho.
No improviso, nasce um arqui-inimigo
Também introduzido em Batman #1, o Coringa por pouco não se tornou uma simples nota de rodapé na história do Cavaleiro das Trevas. Originalmente, o serial killer com visual inspirado no personagem de Conrad Veidt em O Homem Que Ri (1928), morreria no final da revista após não resistir a uma facada no coração. Um dos criadores do personagem, Bill Finger, acreditava que vilões recorrentes fariam o Batman parecer ineficiente e, por isso, não pretendia deixar que Príncipe Palhaço do Crime sobrevivesse à primeira edição. Então editor-chefe da National, Whitney Ellsworth mandou que o vilão não morresse e um último quadro foi desenhado rapidamente pouco antes da revista ser impressa.
A partir daí, o Coringa passou a evoluir e ser desenvolvido como o grande arqui-inimigo do Batman. Presença constante nas revistas do herói, o Arlequim do Ódio teve seus métodos e crimes amenizados, com assassinatos sendo substituídos por assaltos e pegadinhas, mudança que inspirou diretamente sua primeira aparição em live-action, na série clássica do Batman nos anos 1960.
Ainda que não fosse uma grande ameaça, os mistérios que cercavam o Coringa davam ao vilão uma aura quase mística, já que nem mesmo o Maior Detetive do Mundo conseguia descobrir suas motivações, seus próximos passos ou mesmo sua origem, que muda com certa frequência desde que Finger escreveu a icônica queda do Capuz Vermelho em um barril de ácido. Constantemente, as maneiras criativas como o vilão cometia crimes precisavam ser contra-atacadas de forma tão inspirada quanto pelo Batman, tornando as histórias com o confronto entre os dois algumas das mais intrigantes da indústria.
Com o tempo, o Coringa retornou aos seus métodos mais agressivos, levando o Batman ao limite da violência em diferentes momentos. Seus crimes em Morte em Família e A Piada Mortal não só mudaram a maneira como o vilão era visto, mas também afetaram por anos as vidas de personagens queridos como Barbara Gordon/Batgirl.
Entre os vários personagens na galeria de vilões do Batman, o Coringa é um dos poucos a estrelar a própria revista (que durou apenas nove edições) e certamente o mais influente na vida do protetor de Gotham. Hoje visto como o maior vilão da história das HQs, o personagem saltou das páginas para os cinemas, mídia em que rendeu um Oscar para dois atores em 11 anos.
Até hoje, 80 anos após sua criação, o mistério e o fascínio em torno do Coringa continuam. Diferentemente de outros personagens dos quadrinhos, sua origem nunca foi definitivamente estabelecida e seus crimes se tornam cada vez mais macabros e cruéis. Sua caracterização em constante mudança até hoje revigora as histórias do Batman e sua presença em diversos arcos diferentes mantém o leitor preso às revistas em que ele aparece, tornando o vilão, ironicamente, um dos grandes responsáveis pelo grande legado que o herói tem na cultura pop.
Apenas um ano mais novo que seu arqui-inimigo, o Coringa demonstra ainda ter um apelo similar para o público. Mesmo depois de oito décadas estrelando histórias impossíveis, o Príncipe Palhaço do Crime segue entretendo os fãs dos quadrinhos e é, ao lado de Dick Grayson e da Mulher-Gato, parte crucial da fundação que faz do Batman o herói amado que é hoje.
