Miriam Castro | Shirobako e a indústria de anime
O que podemos aprender sobre quem coloca as animações na tela
Se você gosta de anime e quer saber mais sobre como todas aquelas histórias são postas na TV, Shirobako é indispensável. O último episódio da temporada foi ao ar na quinta passada e superou as expectativas ao concluir a história das cinco garotas com o sonho de trabalhar na indústria de animação japonesa.
Ema é ótima desenhista, mas insegura de sua habilidade. Shizuka tenta se tornar seiyuu (dubladora), cargo que pode chegar ao estrelato na indústria, mas não sem dar em muitas portas fechadas antes. Misa quer fazer gráficos 3D convincentes, mas gostaria que seu trabalho tivesse uma história por trás. Midori sonha em ser roteirista, mas não consegue trabalho algum. E Aoi, a protagonista, sabe que gosta muito de anime, mas não faz ideia do que deseja pro futuro. Todas eram do clube de animação do colegial e prometeram ir atrás de seus sonhos na área.
Logo após a promessa das cinco amigas, o tempo avança dois anos e meio. Encontramos uma Aoi cansada e desiludida com cargo de assistente de produção na Musashino Animation, uma empresa decadente que tenta se recuperar no mercado. Logo vemos que o sonho é muito mais complicado na prática.
Desenhistas adoecem de tanto trabalhar; patrocinadores forçam escolhas de seiyuu não pelo talento, mas por lucros; conflitos de ego são frequentes; animadores envelhecem e perdem o reconhecimento. Ninguém sabe mais sobre a indústria de anime do que seus empregados, e Shirobako dá espaço para que os trabalhadores da área desabafem. Mas mesmo com seus momentos preocupantes, o anime é um slice-of-life e consegue tratar dos temas de forma leve, com toques de comédia.
As referências são escancaradas. Kinoshita Seiichi, o diretor enroladíssimo da Musashino (Musani), é baseado em Mizushima Seiji - ninguém menos que o diretor do primeiro Fullmetal Alchemist e Shaman King. Um carro pertence à produtora G.I. Staff, nada mais do que uma junção das conhecidas Production I.G (Ghost in the Shell e mais mil coisas) e J.C. Staff (Revolutionary Girl Utena e outras mil coisas). E praticamente todas as seiyuu têm base alguma estrela da vida real. O desenho preferido da protagonista, Yama Harinezumi Andes Chucky, é uma homenagem ao Yama Nezumi Rocky Chuck, da FujiTV, que passou no Brasil como Fábulas da Floresta Verde. É só ver como personagens e música são parecidos:
Coisas que vemos toda hora nos animes são explicadas para os leigos em Shirobako. Como capítulos inteiros dedicados a flashbacks: eles podem ser um recurso para o estúdio atrasado entregar o trabalho só na semana seguinte. Ou quadros intermediários desenhados de qualquer jeito, que fazem a animação "derreter" aos olhos do telespectador. (Não tenho conhecimento suficiente pra afirmar com certeza, mas diria que o infame episódio 167 de Naruto sofreu disso).
A quantidade de termos técnicos é tanta que pode confundir o leigo em animação, mas os 24 episódios se encarregam de definir bem qual é a função de quem em uma produtora. E algumas boas almas já se encarregaram de fazer um glossário com os principais termos mencionados - clique aqui (em inglês).
Com a quantidade de filmes metalinguísticos que tem por aí, é engraçado como não há tantos animes sobre o trabalho de animadores. Sobre o trabalho de mangakás, até encontramos alguns - Gekkan Shoujo Nozaki-kun e Bakuman são exemplos. E, se fôssemos acreditar no AnimeMaru (site de notícias falsas de anime), até que poderia existir uma série sobre os bastidores de Shirobako. Seria um anime sobre o desenvolvimento de um anime que fala do desenvolvimento de outros animes. Acho melhor não!
*Míriam Castro é repórter do Estado de S. Paulo e, nas horas vagas, vê anime e fala besteira no Twitter e no mikan³.