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As previsões da política norte-americana no <i>Cavaleiro das Trevas 2</i>

As previsões da política norte-americana no <i>Cavaleiro das Trevas 2</i>

11.04.2003, às 00H00.
Atualizada em 19.11.2016, ÀS 21H00

Às vezes, eu morro de rir ao pensar nas maneiras divertidas que nós bolamos para gastar trilhões de dólares dos contribuintes. _ Lex Luthor, patrocinador do governo americano, durante sessão de tortura do Homem-Morcego.

Por várias vezes, as histórias em quadrinhos têm sugerido o futuro.

Desde o Flash Gordon de Alex Raymond, com suas especulações científicas, antevendo as viagens espaciais e a minissaia, até American Flagg! de Howard Chaykin, o qual antecipou o atual mundo multipolarizado e a brasileirização da sociedade ocidental, quando esta se abrigou da violência urbana em fortalezas sociais, como condomínios - shopping centers fortificados.

Outro autor que tem infelizmente acertado em suas profecias é Frank Cavaleiro das Trevas Miller.

No polêmico Cavaleiro das Trevas 2, o homem que levou Batman de volta ao topo exibe um panorama sombrio da sociedade norte-americana, confirmado nesse momento da Guerra Contra o Iraque. Concluído após o episódio das torres gêmeas, sem fazer concessões ao trauma da tragédia, mantendo o ataque dos vilões a Metropolis, Frank Miller não poupou ataques ao neoconservadorismo dominante na gestão de Bush Jr..

Logo na primeira página, vemos o mundo soterrado pela mídia, o marketing, a ciranda financeira e a mentira. Um presidente dos Estados Unidos virtual é contestado por um envelhecido e cansado Jimmy Olsen; atrás do discurso de paz e segurança, está a ação camuflada de um estado totalitário.

As semelhanças entre o construto digital presidente Rick Rickard e o texano George W. Bush saltam aos olhos, não só pela semelhança da retórica simplista, mas também pela construção da imagem governamental pelas corporações da imprensa no informal esforço de guerra.

Até mesmo o pau momentâneo da imagem do títere de Luthor e Brainiac remete a uma falha da televisão americana nesse lado de cá dos comics, quando ela é obrigada a nutrir sua programação com material das emissoras árabes, como da pioneira TV Al Jazeerah. As televisões do oriente médio mostram a outra versão do conflito, com imagens em primeira mão do pequeno apocalipse via satélite, colocando em dúvida a justiça libertadora da máquina norte-americana e a credibilidade do império do jornalismo da América do Norte, a CNN.

Mesmo o amargo Jimmy Olsen tem sua contraparte no mundo real na fúria corajosa do cineasta Michael Moore. O documentarista em plena entrega do Oscar, a celebração maior do sonho americano, questionou severamente quão realista é a legitimidade da investida militar e da própria administração atual, eleita de maneira suspeita, arrancando vaias e aplausos da audiência presente de astros do celulóide.

Porém, do mesmo modo que Frank Miller grita contra a opressão, também nos lembra o quanto desse clamor é perdido na enxurrada ruidosa da Era da Informação. Demonstra na crítica ferrenha de Olsen, naufragada entre anúncios e informes financeiros e futilidades. Nos diz, através de Lex Luthor, o qual se transmuta de gênio cientifico para um vilão maior, o articulador político: Liberdade de expressão é uma maravilha... Contanto que ninguém esteja escutando.

O que foi o desabafo de Michael Moore? Talvez só mais uma parte do espetáculo ficcional que ele tanto condenou.

Entretanto, Miller não deve ser considerado um autor pessimista e sim um realista, pois também há o movimento e a contradição em seu vaticínio. Na minissérie, contra aqueles que fizeram refém o Super-Homem, os descontentes se unem. Se a mídia está dispersa, então, estes fazem centrar a sua atenção no problema. Subvertem o entretenimento. Atuam na brecha da programação. As pessoas em roupas chocantes saem às ruas para dizer não ao estado das coisas... tal como agora, quando os pequenos indivíduos sensatos marcham contra a guerra?

Arrisca-se a dizer que Miller acertou tanto na ação quanto na reação sobre os protocolos de Washington. Novamente, as artes dizem ao que vieram: Reconhecer a vida, refletir e propor futuros a partir da atenta sintonia.

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