Existem séries que voltam ao passado, e as que são sobre o passado. Pode parecer estranho, mas embora tudo fale a respeito de uma época, as abordagens em cada caso são diferentes: algumas vezes produções como Downton Abbey são todas sobre o passado, mas como pano de fundo para uma história que até depende de elementos desse tempo, mas com uma dramaturgia que não se baseia nele. Já em produções como Stranger Things, até mesmo o marketing estabelece a época onde ela se passa é um dos protagonistas, o que significa investir em signos específicos daquele período, dando muita importância, inclusive, a como aquele momento da história influenciou a cultura pop. Séries de TV se especializaram em voltar a décadas específicas, e por causa delas é que o gênero da “época” sofreu essa pequena subdivisão.
A próxima novela das 19 horas da Rede Globo pode não ter a sutileza como palavra de ordem, mas vai tentar trazer os anos 90 de volta para o centro das atenções. Verão 90, trama escrita por Izabel de Oliveira e Paula Amaral que foi apresentada aos jornalista em evento no Rio de Janeiro, situará sua história, personagens, símbolos e características na década em que tudo na arte estava se transformando.
Rio 90 Graus
A arte é um ponto importante a ser considerado porque boa parte dos elementos de Verão 90 serão dispostos em torno dela. A história gira em torno de um trio musical infantil que foi um fenômeno cultural ainda na década de 80. A referência é clara: o Trem da Alegria da realidade virou a Patotinha Mágica da ficção. Os três - dois meninos e uma menina - fizeram muito sucesso, mas o tempo avança até os anos 90 e todo esse sucesso ficou para trás. Rafael Viti e Jesuíta Barbosa fazem os meninos do grupo, que também são irmãos e apaixonados pela menina, Isabelle Drummond, que era parte do grupo. João, personagem de Viti, conseguiu manter um pouco da própria evidência através de um programa musical nos moldes da MTV. Já Jerônimo, personagem de Barbosa, caiu no esquecimento e se ressente da separação e do anonimato. Manuzita, a menina, nunca teve talento, mas sua mãe delusional vivida por Claudia Raia, a convence a continuar tentando a fama.
Essa base dramatúrgica é completamente folhetinesca, mas é apenas uma forma de começar o investimento da metalinguagem que permeará a novela. Por ter personagens perseguindo a fama, envolvidos com música, a produção investirá pesado em tudo que era vigente naquela época. Jorge Fernando, o diretor, é um símbolo teledramaturgico desse período: a novela terá ares de Rainha da Sucata, brincará de Caçadores de Emoção, terá uma Brasília amarela, um canal de música cheio de videoclipes, citações, referências, atores de pornochanchada e até uma vidente (vivida por Fabíola Nascimento) que vai fazer previsões de um futuro que o público já conhece.
No próprio evento de lançamento da novela, tudo foi preparado para transportar os presentes para aquela época: um ônibus decorado pegou os jornalistas no Arpoador e até o trajeto aos Estúdios Globo, todos tinham que responder a um quiz sobre a década de 90, ganhando brindes que tinham a ver com o mesmo período. Nos estúdios os jornalistas foram recepcionados pela Priscilla, da TV Colosso; e também puderam conhecer o set da boate frequentada pelos personagens principais. A trilha era tomada de Roxette, Information Society, A-ha, Pet Shop Boys, enquanto a comida também ajudava no clima quase sinestésico da ocasião. O elenco – inteiro – chegou a preparar um flashmob para apresentar aos jornalistas. Uma imersão total.
Autoras, diretor, elenco, todos os envolvidos parecem ter um único objetivo em comum: não apenas usar os anos 90 como ilustração lúdica, mas trazer de volta o espírito transgressor e politicamente incorreto daquele momento da nossa história; recuperar o exagero, a liberdade de expressão e o desapego a convenções visuais. A ideia é reproduzir a época através de seus códigos culturais e artísticos, o que aproxima a novela desse híbrido serialesco que pode ser a tendência dos anos 2000 (passível de resgates quando nós formos o passado).
Verão 90 estreia em 29 de janeiro e também tem no elenco nomes como Claudia Ohana, Humberto Martins, Dira Paes, Totia Meireles, entre outros.