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The Handmaid's Tale | Campos de concentração, tortura e sangue marcam estreia da 2ª temporada

Episódio duplo de estreia segue ainda mais visceral e angustiante que o ano anterior

26.04.2018, às 18H55.
Atualizada em 02.05.2018, ÀS 16H04

A primeira temporada de The Handmaid's Tale introduziu um universo agonizante de Gilead e se despediu do público deixando o futuro da protagonista June/ Offred (Elisabeth Moss) em aberto. Em fuga, a personagem entrou em uma van sem saber se estava sendo resgatada pela resistência ou sendo levada pelos seus algozes - mesma cena usada na conclusão do livro O Conto da Aia, de Margaret Atwood, que serviu de base para o primeiro ano. Ganhando autonomia e indo além do material de base, a nova remessa de episódios começa dando seguimento à jornada sombria das vítimas da autocracia religiosa, seja tentando encontrar uma rota de fuga e se libertar, seja tentando apenas sobreviver ao regime opressivo.

"June" e "Unwomen", dupla de primeiros episódios da segunda temporada, trazem concretude para a situação de June - como era de se esperar, as coisas não são positivas. Logo na cena inicial, vemos a personagem sendo levada junto de várias mulheres para um estádio de baseball para o que parece ser um enforcamento coletivo. A sequência, carregada de tensão psicológica, é mais uma tática de tortura para controlar mulheres aprisionadas para fins reprodutivos e serve para ilustrar que as coisas devem ficar ainda mais tenebrosas no novo ano. Ao som de "This Woman's Work", de Kate Bush, a sequência inicial de quase de 10 minutos traz a mais genuína sensação de angústia do espectador ao mostrar os mais perturbadores detalhes do desespero frente à certeza da morte.

Além de chocar, os capítulos fazem as honras da casa ampliando o mundo distópico e mostrando seus impactos - tão severos quanto ou ainda mais - fora do campo de visão da protagonista. Através do olhar de Emily/ Ofglen (Alexis Bledel), o público conhece uma faceta perversa do regime que ainda não havia sido mostrada: os campos de trabalho forçado, as Colônias. Neles, vemos um grupo de mulheres condenadas à morte nas entrelinhas, vendo a saúde esvair graças ao efeito de trabalhar horas a fio em um solo contaminado pela radioatividade. Muito se falou alimentou em relação a quão assustadores seriam esses lugares e a série não teve medo de construir um cenário de horror.

Paralelamente, a série segue mostrando em flashbacks como a sociedade caminhou gradativamente para o colapso e para o regime ditatorial que transformou os Estados Unidos em Gilead. Após mostrar manifestações sufocadas com violência inesperada e direitos civis lentamente suprimidos, a nova temporada começa a se aproximar do momento de ruptura definitiva ao mostrar coisas como ataques terroristas comparáveis ao 11 de setembro e a revogação de documentos oficiais para impedir a saída de pessoas do país. Se na primeira temporada foi abordado o processo de negação em relação ao fato de que as coisas poderiam piorar, a segunda deverá mostrar a população lidando com a percepção de que a ficha caiu tarde demais.

Os dois primeiros episódios passam a sensação de frescor na possibilidade de se debruçar com calma em detalhes que foram coadjuvantes na temporada de estreia. Há um elemento de complexidade interessante de ser trabalhado na relação entre as mulheres relegadas ao posto humilhante de criaturas reprodutoras e as que apoiam o sistema por partirem de um lugar supostamente privilegiado - algo que já havia sido colocado em xeque através de Serena e volta a ser ressaltado com a chegada da sra. O’Connell (Marisa Tomei) às Colônias. Outra questão que ganha mais espaço é a criminalização da comunidade LGBT, algo que já havia sido visto no primeiro ano, mas que ganha contornos mais viscerais através da história de Emily e de Dan (John Carroll Lynch), seu chefe na universidade.

Se os dois primeiros episódios forem um retrato fiel do que a segunda temporada de The Handmaid’s Tale entregará, o público só não poderá respirar aliviado por não ser o tipo de reação condizente ao conteúdo da trama. Conservando as sequências aflitivas e o cuidado esmerado com a construção de imagens emblemáticas, a série caminha para se tornar algo ainda maior - e olha que estamos falando da ganhadora do Emmy de Melhor Série com a temporada de estreia. É irônico que The Handmaid’s Tale mostre ainda mais vitalidade após se desligar do livro original, conquistando previamente aquilo que seguirá sendo o objeto que desejo que norteará a jornada de June: liberdade.

A segunda temporada de The Handmaid's Tale é exibida pelo Hulu, serviço de streaming que não está disponível no Brasil. O canal pago Paramount Channel exibe a primeira temporada no Brasil.