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Como a quarentena está influenciando a criação de conteúdo na cultura pop

Confinamento é o maior tema da humanidade no momento e isso é refletido em filmes e séries

03.08.2020, às 15H57.

Não é segredo para ninguém que a cultura é um retrato da sociedade. É comum, por exemplo, que a produção de filmes de guerra aumente durante a época de conflitos, e que acontecimentos da vida real inspirem obras de ficção. O interesse do público em tais obras acontece por motivos óbvios: é interessante ver em tela personagens passando por situações com as quais é fácil se identificar.

Quando o coronavírus se tornou uma pandemia, a vida de todas as pessoas do mundo foi afetada. Em questão de semanas, coisas comuns como trabalhar presencialmente, ir ao cinema ou socializar com os amigos no bar não eram mais possíveis e a humanidade começou um longo e estranho processo de adaptação. E já alguns meses depois começaram a surgir obras inseridas nesse contexto.

No Brasil, uma das primeiras foi Alta Sociedade, Baixa, uma instasérie (série do Instagram) sobre uma socialite que burla a quarentena para fazer uma festa. Curiosamente, apenas alguns dias antes, quando a ideia da série já estava pronta, a influencer Gabriela Pugliesi tinha desativado suas redes sociais após dar uma festa no meio da pandemia e ser criticada ao postar vários stories mostrando o encontro.

É importante lembrar que há também vários desafios de produção durante um período como esse. Exibida na Warner Channel e disponibilizada no YouTube, Carenteners teve toda a sua produção feita à distância, com os atores gravando suas próprias cenas usando suas casas como cenário. “Eu nunca tinha colocado um celular num tripé. E aí, de um dia para o outro recebi os equipamentos em casa, coisas que eu não conhecia. Mas a equipe está se ajudando muito, com toda a paciência do mundo para colocar a luz no lugar certo, etc. Então além de atuar, de construir a personagem, tem esse outro lado. É um desafio, mas é maravilhoso. Espero que a gente consiga se conectar em prol de uma paixão e uma causa, além da parte física (presencial)”, explica Ana Tardivo, que faz o papel da protagonista Cecília, que se apaixona por Marcos (Mateus Sousa) antes da quarentena e tenta adaptar o relacionamento aos novos tempos.

Além de inovar na forma de fazer, a quarentena também trouxe outros formatos de lançamento. Carenteners, por exemplo, conta com 10 episódios de aproximadamente 5 minutos cada, que utilizam muita linguagem das redes sociais, como a reproduções de stories, áudios de WhatsApp, etc. A ideia surgiu de uma conversa entre Aline Diniz e Érico Borgo, ex-Omeletes, que fundaram a produtora Huuro Entretenimento. “O desenvolvimento foi bem rápido e isso também é refletido na série, que é esse momento inesperado que estamos vivendo. É bizarro ver algo que surgiu de um bate-papo tomando forma com tanta rapidez. Foi questão de uma semana entre ter a ideia e começar a colocar tudo de pé, de fato”, explica Diniz. Já finalizada, Carenteners atingiu um público de 600 mil pessoas com TV paga no Brasil e é considerada um sucesso. “[Carenteners] trouxe novos desafios a todos os envolvidos na produção. Ver como a equipe e os atores trabalharam juntos para superar cada uma das adversidades que apareceram, encontrando soluções criativas sem nunca perder a qualidade do produto final foi o nosso foco. E os números confirmam que tudo valeu a pena”, completa Diniz.

Disponível no Globoplay e exibida também na TV aberta, Diário de um Confinado é outro bom exemplo de produção que trata da rotina durante a pandemia. Mas ao invés da história de um casal ou uma festa, a série aposta no simples e mostra a rotina de Murilo (Bruno Mazzeo, idealizador do projeto), um (não tão) jovem que mora sozinho e tenta enfrentar todas as dificuldades trazidas pelo momento - desde o stress de ficar confinado no apartamento, até a dificuldade em fazer simples tarefas de casa, as chamadas de vídeo pedindo ajuda para a mãe, etc. Ao ler os comentários sobre a produção é fácil entender o motivo do sucesso: as situações absurdas vividas por Murilo são a realidade de muitos atualmente e ver isso pela ótica do humor ao invés do drama, faz com que seja mais leve passar por alguns perrengues.

A Netflix também utilizou o momento da pandemia para a criação de Feito em Casa (Homemade), uma série antológica com curtas dirigidos por vários cineastas, mostrando histórias de todo o mundo durante a pandemia. Entre os nomes que comandam episódios estão Paolo Sorrentino, Pablo Larraín, Maggie Gyllenhaal, Kristen Stewart, Sebastián Lelio, etc., que mostram tramas sobre chamadas de vídeo, convivência de casais, monotonia do isolamento social, e vários outros temas. 

A indústria do entretenimento foi uma das mais afetadas pela pandemia, afinal cinemas, teatros e museus seguem fechados e as gravações presenciais também foram paralisadas. É um momento difícil para uma área que estava em pleno crescimento e ainda é cedo para saber como será a realidade após a vacina. No entanto, há certa esperança em ver a produção artística continuando mesmo em um momento tão difícil e não há dúvidas de que, presencialmente ou à distância, a humanidade não perdeu sua capacidade de sonhar e criar obras que nos fazem pensar, sorrir, chorar e imaginar dias melhores.