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Crítica

The Boys: Diabolical usa animação para violência - mas é surpreendentemente doce

Largando mão da responsabilidade de continuidade, spin-off da franquia é recheado de bons momentos e tem um baita final

03.03.2022, às 10H25.

Não era difícil saber o que esperar do derivado The Boys presents: Diabolical. Prometendo uma antologia animada da franquia do Prime Video, a coleção de curtas do universo de The Boys angariou uma equipe de roteiristas e comediantes difícil de botar defeito, desde Garth Ennis, criador da HQ, até Awkwafina, passando por Ilana Glazer, Andy Samberg, Seth Rogen e Evan Goldberg. É claro que, com base no clima da original, uma série em animação de The Boys aproveitaria o gênero para entregar violência e gore extremos demais para o live-action. O que era imprevisível de Diabolical, porém,é sua ternura, e sua vontade de contar histórias adoráveis ao mesmo tempo em que espalha tripas e fezes por todo lugar.

São oito curtas, completamente diferentes entre si. E flutuando por diversos estilos, desde a energia de clássicos da Hanna-Barbera até o visual de animes matutinos e do terror sul-coreano, Diabolical transmite uma energia de desprendimento bem clara. A chance de fazer o que quiser com o universo de Ennis é uma oportunidade, não só para tirar qualquer maluquice da cabeça (e realmente, alguns episódios fazem isso), mas para reimaginar esse universo em um contexto totalmente novo.

A exceção, no entanto, vem logo de início, no primeiro episódio, escrito por Ennis e baseado no visual da HQ original. Aqui, o criador de tudo encontra um canal para focar na impiedade de Billy Bruto e sua aliança com Hughie (dublado pelo ator que inspirou o visual do personagem original, Simon Pegg) em uma parceria mais próxima - uma que, inclusive, a série de TV já deixou para trás. Aproveitando a chance para entregar um curta frenético e angustiante, Ennis abre a porta para que o resto de The Boys: Diabolical viaje por todo canto, e isso acontece até a reta final, quando a série dá a volta em si mesma, põe os pés no chão e entrega um presente que nem os fãs sabiam ser tão antecipado.

Pelo caminho, passamos pela visão de Justin Roiland, que tempera The Boys com o estilo de Rick and Morty em uma ótima história que, para fãs da série do Adult Swim, mais parece um segmento da “TV Interdimensional” da animação. Seu episódio é um auge do humor de Diabolical, que então passa pela tensão matrimonial de dois heróis em “Nubian vs Nubian”, de Aisha Tyler, pelo sofrimento de perder alguém, no tocante e belo “John and Sun-Hee”, de Samberg, e pela deliciosa referência a Ninguém Segura esse Bebê no episódio de Rogen. Entre todos eles, existe uma vontade clara de explicitar um elemento: a humanidade por trás desses personagens que conhecemos tão pouco.

Isto não é exatamente uma surpresa. The Boys sempre foi uma série com um coração grande, mas enquanto ela caminha cada vez mais ao niilismo e a ideia de que, talvez, ninguém pode nos salvar, Diabolical é doce e se aproxima de diversas pessoas comuns e suas vidas ordinárias, fornecendo um pequeno relance do que seria nossas vidas neste universo caótico. E nisso há simplicidade, esperança, desejo, otimismo e busca por companheirismo. 

Talvez ninguém exemplifique isso melhor do que Awkwafina, que faz de um episódio escatológico (com a rara presença de um dos Sete na coleção de curtas) um conto de amizade, identidade e aceitação. Com exceção de “Boyd in 3D”, de Eliot Glazer e Ilana Glazer, que não tem dó e desdobra uma história de amor em uma análise catastrófica do ego, The Boys: Diabolical diverte pelo contraste entre o absurdo e o fofo.

Quando chega em seu episódio final Diabolical surpreende novamente. Apesar de serem ótimos escapes de criatividade e divertimento certo, os curtas não conseguem chacoalhar a sensação de acessório, uma coleção de produções carismáticas que não avança qualquer tipo de história. Mas é aí que Diabolical arremata sua coleção com um episódio sobre a origem do Capitão-Pátria (ou Homelander), uma trama deliciosa e inesperada para os fãs de The Boys

Com grande parte do elenco original e escrito por Simon Racioppa (de Invencível), esse episódio derradeiro, intitulado “One Plus One Equals Two”, vem para dar um gosto da terceira temporada de The Boys e é, possivelmente, o auge de Diabolical, algo que não deixa de ser quase paradoxal. Existe, sim, o apelo em caminhar por novas histórias, se divertir por estilos diferentes e visualizar um relance do outro lado da vida deste universo. Mas, no fim das contas, o universo de The Boys conquistou fãs pelo seu leque de personagens estranhos e complexos, e revê-los em uma história que os leva para frente fornece um sentimento de propósito maior. O resultado de tudo isso é um derivado que soube fazer tudo - tanto fornecer uma vitrine de criatividade, quanto expandir a franquia.

Nota do Crítico
Ótimo