Divulgação

Séries e TV

Crítica

A Sogra Que Te Pariu honra tradição de sitcoms brasileiras, mas ousa pouco

Série protagonizada por Rodrigo Sant’Anna tem um punhado de boas ideias, mas acaba se desgastando com humor repetitivo

22.04.2022, às 13H47.
Atualizada em 22.04.2022, ÀS 15H05

A tradição de sitcoms brasileiras é uma das poucas constantes do audiovisual nacional que se mantém fortes, mesmo diante das inúmeras tendências que surgiram no cinema e na televisão no século XXI. Do sucesso histórico de Sai de Baixo até o mais recente Vai Que Cola, que já teve 9 temporadas no Multishow, o formato sempre teve espaço entre o público que busca comédia na TV. Agora, a Netflix quer aproveitar essa cultura brasileira em sua nova aposta: A Sogra Que Te Pariu.

A série é a primeira sitcom brasileira original do principal serviço de streaming do mercado, e chega justamente apostando nesse histórico bem-sucedido do formato para fazer sucesso. A trama nos apresenta à Dona Isadir (Rodrigo Sant’Anna), uma senhora que, durante a pandemia, se vê sem alternativa a não ser trocar seu humilde apartamento no Cachambi, bairro de classe média da Zona Norte carioca, pela mansão de seu filho Carlos (Rafael Zulu), localizada na Barra da Tijuca, bairro dos ricos e emergentes da Zona Oeste do Rio de Janeiro. 

Como já aconteceu em Sai de Baixo, A Sogra Que Te Pariu aposta principalmente no humor de situações cotidianas que reiteram as diferenças sociais entre os personagens. No caso, o principal conflito é o que dá título à sitcom: Isadir está em constante atrito com sua nora, Alice (Lidi Lisboa), uma advogada bem-sucedida com origens mais elitizadas em relação ao seu marido, que assim como sua mãe, é de um bairro menos nobre.

No geral, A Sogra Que Te Pariu é mais forte na proposta do que na execução. Se ter um elenco inclusivo e que inverte estereótipos (principalmente os raciais) é sempre bem-vindo, principalmente quando não reduz a existência dos personagens às discussões sobre suas raças, a série perde várias oportunidades de ir além da média. Quando a mãe de Alice é introduzida, por exemplo, uma “segunda sogra” está em cena e traz uma perspectiva social completamente diferente, mas basta uma piadinha aqui e ali para que sua participação seja encerrada sem mais acrescentar.

As discussões são abordadas sempre de maneira periférica. Enquanto a série está sempre trabalhando em cima da piada urgente e do humor situacional gerado pelo atrito de classe, aqui e ali algum acontecimento planta a semente de uma discussão mais robusta. Porém, essas discussões são sempre negligenciadas, ao ponto de parecer que A Sogra Que Te Pariu aborda alguns temas apenas para não dizerem que passou batido.

Por mais que seja típico das sitcoms não aprofundar diretamente nos assuntos políticos e sociais, é um pouco triste constatar que, no caso de A Sogra Que Te Pariu, mesmo sem os tirar do pano de fundo para dar mais destaque, esses tópicos poderiam ser melhor aproveitados ao longo dos 10 episódios de 25 minutos. Em vez disso, a estrutura e o desenvolvimento narrativo da série estão muito mais investidos em repetir piadas três, quatro e até cinco vezes ao longo da temporada, o que, de certa forma, desgasta a experiência.

Por outro lado, a série traz algumas articulações visuais que enriquecem o todo. Se as cenas na mansão de Carlos e Alice são sempre encenadas honrando as fortes raízes do teatro presentes nas sitcoms, quando a história nos leva para o Cachambi, essa lógica de encenação teatral, com uma blocagem (o deslocamento dos atores no espaço) que entrega a artificialidade, é quebrada. Há mais close-ups, há mais diálogos serenos e menos intercalados com piadas. É como se a série conseguisse construir um mundo real no Cachambi que inexiste na Barra da Tijuca.

No fim das contas, A Sogra Que Te Pariu até honra o legado das sitcoms citadas, mas passa longe de ter audácia, característica tão típica das obras que a inspiraram. A oportunidade esteve ali, diante dos realizadores, mas parece ter passado direto por seus olhares, sem muito alarde. Não que a dominância do humor seja ruim – afinal, é uma sitcom –, mas em vez de repetir a mesma piada um punhado de vezes, por quê não apresentar mais momentos que questionem as dinâmicas distintas em espaços sociais tão diferentes como os apresentados?

Nota do Crítico
Regular