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Crítica

Room 104 - 1ª Temporada | Crítica

O céu é o limite na série paradoxalmente restrita pelas quatro paredes de um quarto de hotel

08.11.2017, às 18H00.
Atualizada em 09.11.2017, ÀS 11H57

Jay e Mark Duplass lançaram uma proposta curiosa - e um tanto quanto pretensiosa - em Room 104, série antológica exibida pela HBO: mostrar como uma premissa básica consegue ser fonte inesgotável de boas histórias. A atração funciona um pouco na lógica já conhecida de produções como Black Mirror, mas muito menos pretensiosa. A cada episódio, uma nova narrativa completamente desconectada da anterior é apresentada e concluída em cerca de 25 minutos. As tramas são tão variadas quanto a imaginação permite, passeando por gêneros absolutamente distintos como terror psicológico e drama familiar. Porém, há um único elemento em comum entre elas: todas se passam em um quarto de hotel.

Na época do lançamento da série, os irmãos Duplass contaram que a escolha do lugar que, no fim das contas, é o protagonista onipresente da série, se deu em função de ser um ambiente perfeito para observar a complexidade do comportamento humano. "Tudo pode acontecer em um quarto de hotel", disse Jay Duplass. "Eu acho que todos nós, quando estamos em um hotel, tomamos consciência de quão únicos e diferentes nós somos de todos os demais". Isso, de fato, permeia cada um dos episódios da trama, que gira em torno de histórias simples, mas bem amarradas e elaboradas sem excessos.

Além do quarto de hotel compartilhado por todos os 12 episódios da primeira temporada - já renovada para a segunda - há também um elemento que é comum a todos os capítulos: a simplicidade. Como é preciso contar algo com início, meio e fim em menos de meia hora, a série acaba de tornando um apanhados de relatos cotidianos e, mais que isso, vai além por ter de bônus a abertura para uma linguagem fantasiosa. Situações pontuais, sejam elas extremas ou não, são colocadas sob uma lupa e destrinchadas rapidamente diante dos olhos do espectador. No primeiro episódio, a história parte da premissa de uma mulher contratada como babá de uma criança e logo tudo se transforma em uma sequência de terror; no segundo, um entregador de pizza se vê preso com um casal com desejos que vão além do lanche.

É claro que, dentro dessa miscelânea de conteúdo, alguns episódios se revelam mais interessantes que os outros, mas todos apresentam uma reviravolta no encerramento que tem potencial para resignificar a trama inteira - isso é o ponto alto da série, o elemento surpresa. Isso vai desde um personagem que se revela algo que não era esperado até uma informação surpresa que faz com que tudo o que foi visto seja enxergado de outra forma.

Outro ponto favorável para a trama é a criatividade de narrativas e formatos: "Voyeurs", sexto episódio, por exemplo, é o melhor da primeira remessa de capítulos e conta com uma linguagem que foge do modelo mainstream de contar história, mas consegue montar o quebra cabeça daquela crônica de forma absolutamente emocionante. Nele, temos basicamente um balé de personagens que não falam nada em momento nenhum e, ainda assim, passam a sensibilidade necessária para que o espectador entenda tudo o que está acontecendo ali. Em "The Internet", outro bom capítulo, é difícil não se cativar pela história de um jovem escritor recém-formado que, em 1997, quando a internet ainda era terreno pouco desbravado, precisa ensinar a mãe a usar um computador para que lhe envie um documento capaz de definir as linhas gerais do seu futuro.

Entre os atores, estão diversos nomes que fazem a série - ou, pelo menos, o episódio em que eles estão - valer absolutamente a pena. O próprio Jay Duplass, que se tornou conhecido por atuar em Transparent, vive um homem preso a um trauma do passado em "I Knem You Weren't Dead". Outra pessoa de Transparent que tá na série é a atriz Amy Landecker, que vive uma mulher que tenta usar um acidente de avião para mudar sua vida em "Phoenix". Em "The Knockandoo", Orlando Jones, de Deuses Americanos, interpreta o representante de uma seita misteriosa; Keir Gilchrist (United States of Tara) está "Red Tent"; Nat Wolff (Death Note) está em "The Missionaries"; e Ross Partridge (Gypsy) está em "Ralphie".

Room 104 não é o tipo de série capaz de fazer com que as pessoas se apeguem a ela e fiquem ansiosas pelo próximo episódio, mas cumpre seu papel como a primeira coisa que vem a mente naqueles momentos de indecisão sobre o que assistir no tempo livre. Após a primeira temporada, fica no espectador a certeza de que o curto tempo dispensado em um ou dois episódios visto de cada vez será bem aproveitado, já que há uma boa curadoria das histórias encenadas. Jay e Mark Duplass já mostraram talento atrás da câmeras, com Togetherness, mas parece que Room 104 será uma boa válvula de escape criativa para eles - bom para o público.

Nota do Crítico
Bom