Thriller de ação com pinceladas de sitcom de escritório e um quê de romance, Recruta tem a seu favor o fato de ser uma trama de espionagem que não se leva tão a sério. Investindo no humor de situações absurdas vividas pelo jovem advogado Owen Hendricks (Noah Centineo) em sua primeira semana de trabalho na CIA, a série criada por Alexi Hawley (The Rookie) consegue extrair bons momentos de uma história que pode soar bastante inverossímil à primeira vista - apesar de ser inspirada nos relatos do jornalista e ex-advogado da agência Adam Ciralsky, que é um dos produtores executivos da atração.
O pivô da trama é a misteriosa Max Meladze (Laura Haddock), ex-informante bielorrussa que promete revelar informações comprometedoras se os agentes não encontrarem um jeito de tirá-la da prisão. A ameaça cai no colo de Owen, que decide ir a fundo na investigação. Apesar de inexperiente, ele tem bom faro e iniciativa, como faz questão de frisar para o chefe, Walter Nyland (Vondie Curtis-Hall). A cada passo, o novato percebe ter em mãos um caso importante e complicado, mas ele precisa primeiro desvendar os meandros da própria agência para avançar no caso.
Em pouco tempo, Owen deixa de ser o recém-chegado inocente, que desconhece as práticas da instituição e cria, sem querer, mal-estar na primeira reunião de trabalho para se tornar o profissional malandro, que escapa de punições por atos impensados ou escolhas equivocadas graças ao código implícito de que tudo deve ser mantido em sigilo. O chefe não sabia? Ora, quanto menos ele souber, melhor!
O principal mentor do protagonista nessa jornada é Janus (Kristian Bruun), que vive em constante estado de paranoia e estresse e só dá conselhos a contragosto (e em troca de medicamentos). Bruun entrega uma atuação inspirada, e os dois atores formam uma ótima dobradinha em cena. Já a rivalidade entre o novato e a dupla Violet (Aarti Mann) e Lester (Colton Dunn) soa forçada: o comportamento dos veteranos, que se divertem criando situações embaraçosas para o recém-chegado, é previsível e repetitivo, além de nunca se justificar plenamente. Num sitcom aos moldes de The Office, o recurso pode funcionar, mas aqui cansa rápido.
O eixo mais interessante da série gira mesmo em torno de Max: ela é manipuladora e nem um pouco confiável, mas Owen precisa entrar no seu jogo para descobrir que segredos ela guarda. Perseguida por inimigos que desejam vê-la morta, a ex-informante é um perigo constante, especialmente porque é ela quem dá as cartas e o deixa no escuro a maior parte do tempo. Ainda assim, a sensação é de que essa relação de gato e rato foi esticada além da conta.
A história poderia ser contada de forma mais enxuta - os oito episódios, cada um com quase uma hora de duração, sofrem com um ritmo irregular, seja pela opção por subtramas maçantes, como as de Violet e Lester, ou pela aposta em dinâmicas que não funcionam, como a inexistente tensão sexual entre Owen e Max. Apesar da vocação de Centineo para o papel de galã, o romance mal resolvido do protagonista com a ex-namorada Hannah (Fivel Stewart) também não empolga e esfria demais a narrativa.
No geral, Recruta se sai melhor nos momentos de ação do que nas situações de tensão. Cada episódio tem pelo menos uma sequência de luta, perseguição ou tiroteio que cria um certo equilíbrio com as cenas que retratam o dia a dia mais mundano - e entediante - da CIA, com reuniões a portas fechadas, trabalho burocrático e politicagem. Por outro lado, passagens importantes, como a do banco em Genebra ou as que representam o impacto emocional de todos os acontecimentos em Owen na reta final, não alcançam a voltagem necessária e acabam prejudicadas com soluções rápidas ou preguiçosas.
Sem maiores pretensões e seguindo a cartilha do gênero, a temporada termina com reviravoltas e um grande gancho para uma nova leva de episódios, caso a série seja renovada. Resta saber se o recruta vai passar do período de experiência com o público.