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Crítica

Penny Dreadful - 3ª Temporada | Crítica

Cancelada precocemente, série tem conquistas louváveis que não serão esquecidas tão cedo

27.06.2016, às 14H35.

Penny Dreadful acabou de forma inesperada. Após a exibição do nono episódio da terceira temporada, o Showtime, ao lado do criador John Logan, informou que a série seria cancelada. O motivo oficial não é audiência, que nunca foi das mais altas, mas sim um planejamento - a ideia sempre foi terminar o projeto em três temporadas. A sensação no último episódio não é exatamente essa, mas não há como negar que o arco de Vanessa Ives, a protagonista vivida por Eva Green, chega ao fim. Depois de idas e vindas, a personagem encontra um final digno da qualidade da série, que terá um lugar especial no gênero de terror e suspense da TV atual.

Depois de passar dois anos com foco no pseudo-romance de Vanessa e Ethan (Josh Hartnett) e nos problemas familiares de Sir Malcolm (Timothy Dalton), John Logan decidiu explorar com mais afinco seus dois melhores coadjuvantes: Brona/Lily (Billy Piper) e o Monstro (Rory Kinnear). A primeira desfila todo seu talento, mostrado nas temporadas anteriores com certa parcimômia, ao liderar um exército de prostituas dispostas a mudar o status quo a partir de uma revolução silenciosa. Piper consegue transmitir bem a sutileza das dúvidas e do desafio que é estar no fronte de um pelotão de mudanças, sempre rodeado por uma sociedade machista.

Na violência das reuniões entre as mulheres, Penny Dreadful se permite discutir e deixar explícito o abuso diário que muitas delas sofrem no trabalho, em casa ou na rua. Lily passeia entre o êxtase da liberdade e a tristeza da repressão em vários episódios, sem deixar de pontuar para o espectador que o real problema está nos conceitos velhos e antiquados que a sociedade daquela (da atual) época segue. Dorian Gray (Reeve Carney) continua sem se destacar, mas aqui ao menos age como o homem ameaçado, representando um ótimo contra-ponto para a jornada inteira de Brona/Lily.

No mesmo ritmo em que Billy Piper roubava a cena de um lado da série na segunda temporada, Rory Kinnear fazia a mesma coisa em outra ponta. Ao viver o Monstro/John Clare, o ator concentrava em si toda a angústia e formalidade da série. O personagem é o símbolo da depressão, mas por meio de poesia e brutalidade conseguia exprimir algum sentimento do espectador - e depois também de Vanessa Ives. A dupla expande o relacionamento na terceira temporada e, com isso, apresenta os melhores momentos destes últimos episódios.

Em "A Blade of Grass", quando a passagem de Ives pelo manicômio é explicada, Kinnear e Green mostram domínio completo sobre os personagens que construíram ao longo de dois anos. Vanessa se nega a permanecer sóbria, Clare é mostrado de um jeito completamente diferente das temporadas anteriores. Em cena, Kinnear se transforma diversas vezes, sem que em nenhuma delas apresente o Monstro. Ele vive o enfermeiro, o esposo, o demônio e o Drácula com a mesma sensibilidade, diferenciando cada um em detalhes como o ritmo da fala ou o olhar. Neste episódio, um dos melhores da série, a dupla se complementa pelo esforço físico de Green e pela delicadeza de Kinnear.

A trama paralela de Ethan não é ruim, tem o ótimo Brian Cox, mas perde espaço perante aos acontecimentos em Londres - ainda mais quando se tem o Drácula como principal vilão. Christian Camargo é o responsável por viver o personagem, que não figura entre os melhores monstros apresentados pela série. Apesar disso, a forma como é retratado merece elogios por não descambar para o típico vampiro violento e sedutor - as características estão ali, mas mostradas com um tom e ritmo diferentes.

Penny Dreadful termina a história de Vanessa Ives, mas deixa um vazio. O mundo criado por Logan tem tantas possibilidades que é difícil não imaginar novos personagens da cultura pop espalhados por uma Londres cheia de mistério, neblina e monstros. Nestes três anos, ao menos, a série não decaiu e conseguiu apresentar uma nova abordagem para contos famosos - uma tarefa louvável e que não será esquecida tão cedo.

Nota do Crítico
Ótimo