Nightflyers/Netflix/Divulgação

Séries e TV

Crítica

Nightflyers - 1ª temporada

Série inspirada em conto de George R.R. Martin ressalta os erros da humanidade em meio ao desenvolvimento

01.02.2019, às 17H15.

Uma das histórias mais exploradas pela ficção científica é a destruição do mundo, seja pela mão do homem, ou por alguma invasão de seres de outro planeta. A década de 90, em especial, foi repleta de histórias do gênero em que a humanidade triunfa em meio a todas as dificuldades. Mas claro que isso não aconteceria em uma história de George R.R. Martin. Inspirada em um conto do autor de Game of Thrones, Nightflyers é uma visão negativa, ainda que intensamente realista, dessa situação.

A história de fundo não tem muitos segredos e é pouco explicada. Sabe-se apenas que a Terra está com problemas e uma tripulação embarca na nave Nightflyer para buscar uma possível solução com uma raça alienígena. Essa motivação otimista (uma das únicas da série) é carregada por Karl D’Branin (Eoin Macken), que realmente acredita que uma nova raça ajudará a humanidade a lidar com seus problemas.

A nave que abriga a equipe é grandiosa, com vários espaços diferentes e até mesmo um local para o cultivo de plantas no espaço. Há um quê de Star Trek em tudo isso, mas enquanto a série clássica mostra a humanidade em paz explorando a fronteira final, aqui os homens e mulheres levam para o espaço todos os seus defeitos, o que se prova algo perigoso com o desenrolar da história. Quando a missão começa, fenômenos estranhos tomam conta da nave e a primeira reação de todos é culpar Thale (Sam Strike), um telepata poderoso que foi levado para ajudar no contato com os alienígenas. A palavra “aberração” é repetida várias vezes atestando como, apesar de rodeada de tecnologia e desenvolvimento, a humanidade continua ignorante ao lidar com os que são “diferentes”.

Mas não é somente a ignorância que enfraquece a tripulação. Usando flashbacks para desenvolver cada um dos personagens, o seriado explora os diferentes tipos de emoções humanas, como amor, desejo de poder, culpa, vingança, etc. Esse não é um conceito novo, já que vários filmes e séries já mostraram como são as emoções que tornam as pessoas fracas, apenas para depois (novamente remetendo aos filmes da década de 90) os homens se unirem e provarem o contrário. A resolução aqui não é de longe tão romântica, mas ressalta algo interessante: o que enfraquece os personagens de Nightflyers não é a presença de sentimentos, mas sim incapacidade de lidar com os mesmos. Um exemplo disso é Rowan (Angus Sampson), que lida com um grande trauma e ao não conseguir aceitar a tristeza, comete uma série de erros inimagináveis.

Aliás, todos os protagonistas enlouquecem durante a missão, seja de uma forma ou de outra. Absorto pela missão de fazer contato e salvar a humanidade, Karl é perseguido por visões de sua família e cria uma obsessão em concluir o objetivo; para lidar com a pressão de se conectar com a nave, Lommie (Maya Eshet) cria um mundo de fantasias apenas seu, onde pode ser feliz sem incomodar ninguém. No fim das contas, a missão é pesada demais para toda a tripulação e cada um encontra uma forma distorcida de escapar do que está acontecendo no mundo real. A única que se mantém sã até o final é Melantha, em uma atuação incrível de Jodie Turner-Smith.

A vilã e o motivo de tudo

No meio de todos esses conceitos sobre a mente humana, a trama de Nightflyers é baseada em um grande segredo e uma vilã, no mínimo, fora do comum. Quando os já citados fenômenos estranhos tomam conta da nave, o capitão Roy Eris (David Ajala) revela que sabia o motivo de tudo, mas não revelou para a tripulação por ser algo pessoal. Apesar dessa pequena justificativa, é estranho que o maior conflito do seriado seja baseado nesse segredo. Nada é muito explicado e os próprios personagens esquecem e “perdoam” o capitão rapidamente, focando em vencer a vilã. No contexto em que tudo é apresentado, caberia pelo menos alguma revolta ou questionamento, mas não há nada. Ele mentiu, colocou todos em risco e ficou por isso mesmo.

Interpretada por Josette Simon, a vilã Cynthia funciona mais fora da tela do que quando realmente aparece. Quando precisa se mostrar ameaçadora, a atriz arregala os olhos em um movimento caricato e exagerado que não condiz com a narrativa criada ao redor dela. Felizmente esses momentos estranhos são poucos e a personagem funciona bem, permeando toda a trama de medo até o final da temporada.

A direção de arte de Nightflyers é bem elaborada. Apesar da já citada comparação possível com Star Trek, o visual mais soturno e escuro da nave mostra desde o começo que são obras totalmente diferentes. Vez ou outra os famosos reflexos popularizados nos filmes de J.J. Abrams aparecem, mas eles somem tão rapidamente que parecem quase uma brincadeira dos criadores da série com a percepção do público. Já os efeitos visuais são dúbios. Em certos momentos são incrivelmente bons, em outros se destacam demais e evidenciam sua existência. Apesar disso, o saldo final é positivo nessa categoria, já que os erros são inferiores aos acertos.

O ciclo principal de Nightflyers se fecha no nono episódio, com uma trama já sinalizada anteriormente, deixando o décimo capítulo como um território totalmente novo. Essa decisão funciona bastante para manter o interesse do público, já que neste ponto da história os personagens já chegaram ao seus limites e tudo pode acontecer. A série termina com uma mensagem agridoce, misturado luto, caos e esperança, mas deixa claro que não importa qual planeta habite ou em qual lugar do espaço a esteja, a humanidade sempre levará a destruição consigo para onde for.

Nota do Crítico
Bom