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The Witcher | Leia o primeiro capítulo de Encruzilhada dos Corvos

Novo livro da saga de Andrzej Sapkowski.chega em 30 de setembro

13 min de leitura
20.09.2025, às 06H00.
Atualizada em 22.09.2025, ÀS 10H57

The Witcher: Encruzilhada dos Corvos, novo livro da saga criada por Andrzej Sapkowski, chega às livrarias em 30 de setembro com lançamento da Editora WMF Martins Fontes, mas você pode ler o primeiro capítulo na íntegra da obra aqui! O Omelete recebeu com exclusividade as primeiras páginas do que marca uma nova fase na jornada de Geralt de Rivia.

Confira a sinopse: Em Encruzilhada dos Corvos (Rozdroże Kruków), os leitores acompanharão Geralt de Rívia aos 18 anos, em sua primeira missão após deixar a fortaleza de Kaer Morhen. É a oportunidade de ver o bruxo ainda jovem e inexperiente, enfrentando monstros, traidores e novos aliados, enquanto descobre o peso de ser um witcher — temido, odiado e forjado pelas próprias escolhas.

“Em Encruzilhada dos Corvos, retorno às raízes da jornada de Geralt — não como o destemido matador de monstros que conhecemos, mas como um jovem bruxo, ainda descobrindo o peso de seu destino. Esta é uma história de crescimento, onde o idealismo encontra a dura realidade, e escolhas forjam uma lenda. Mal posso esperar que essa nova história chegue aos leitores de todo o mundo para que caminhem ao lado do jovem Geralt", diz Andrzej Sapkowski sobre o novo livro.

Vale lembrar que a quarta temporada de The Witcher, série da Netflix inspirada nos livros de Sapkowski, estreia em 30 de outubro no serviço de streaming. Será a primeira com Liam Hemsworth no papel de Geralt de Rivia. Ele substitui Henry Cavill, que deixou a produção para outros compromissos profissionais.

Leia abaixo o primeiro capítulo de Encruzilhada dos Corvos:

Kaedwen é um país localizado entre as Montanhas dos Dragões a norte, os Montes Roxos a leste e selvas impenetráveis a oeste. Lá governam os reis da estirpe dos Topp. Foi sua primeira capital a antiga Ban Ard. Contudo, no ano 1130 post Resurrectionem, o rei Dagread doou aos feiticeiros tal urbe para que lá fizessem sua escola, transferindo a capital para Ard Carraigh, no centro do país.

Outras urbes importantes de Kaedwen são Ban Fearg, Daevon, Ban Fillim e Ban Gleann.

O brasão dos Topp e de todo o país foi, desde tempos imemoriais, o unicórnio – d’or, licorne effrayée de sable.

No entorno das terras reais de Kaedwen ficam as terras de fronteiras, a todos pertencentes, denominadas Marcas ou marquesados. Tais terras são entregues à administração dos margraves, ou seja, dos marqueses, tanto aqueles de linhagem quanto aqueles pelo rei nomeados. Seu nome vem do fato de que tais terras funcionam como uma linha de frente e, à medida que avançam, devem trazer conquistas e arrancar novos territórios dos elfos para Kaedwen, deslocando as fronteiras e estabelecendo Marcas, id est, marquesados, cada vez mais distantes. As Marcas são: Ocidental, do Norte, dos Lagos e do Sul.

Geralt, apesar da mais sincera vontade – e de motivos muito importantes –, não conseguia se concentrar de jeito nenhum no falatório do intendente Bulava. Toda a sua atenção era absorvida por uma grande gralha empalhada na mesa da autoridade à sua frente. A ave, olhando com seus maliciosos olhos de vidro para o bruxo, estava numa base de cera pintada de verde, na qual suas duas perninhas afundavam. Portanto, ela de modo algum poderia estar viva, ainda que sua aparência passasse tal impressão. Por que então, e Geralt não pôde deixar de se admirar, a gralha piscou várias vezes para ele com seus olhos de vidro? Seria magia? Provavelmente não, pois seu medalhão de bruxo não tremeu nem vibrou em nenhum momento, nem um pouquinho. Seria uma alucinação? Um delírio provocado por ter sido várias vezes golpeado na cabeça?

– Repetirei a pergunta – repetiu o intendente. – Repetirei, embora não seja de meu feitio repetir.

Ele já tinha assegurado diversas vezes a Geralt que repetir não era de seu feitio. Apesar disso, repetia a cada passo. Era visível que gostava da repetição, mesmo que não fosse de seu feitio.

– Repetirei minha pergunta: o que de fato aconteceu? O que você tinha contra esse desertor para arrebatá-lo com tanta violência? Alguma antiga animosidade? Pois, veja bem, de modo algum acreditarei que se tratou daquele caipira e da honra da filhinha dele. Que você correu em seu auxílio. Que nem a porra de um cavaleiro errante.

A gralha olhava maliciosamente. Geralt mexeu as mãos amarradas por trás, tentando despertar a circulação sanguínea. A corda lhe cortava dolorosamente os pulsos. Ouvia, às suas costas, a respiração pesada do brutamontes caipira. O sujeito estava a um palmo de distância, e Geralt tinha certeza de que apenas esperava um pretexto para novamente lhe esmurrar o ouvido.

O intendente arfava, esparramava-se na cadeira, estufava a barriga e o cafetã de veludo. Geralt contemplava a frente do cafetã e ia identificando o que Bulava havia comido hoje, ontem e anteontem. Observou que pelo menos uma dessas refeições contivera molho de tomate.

– Eu pensei – disse enfim o intendente – que nunca precisaria ver um de vocês, bruxos. Fazia anos que não se via nenhum bruxo. Falavam que, depois do ano 1194, poucos haviam restado vivos lá nas montanhas. Depois veio a notícia de que também os que restaram haviam morrido, de fome ou da peste. E de repente aparece um desses exatamente no meu vilarejo. E a primeira coisa que faz é cometer homicídio. Pego em flagrante, ainda tem a audácia de invocar uns éditos de merda.

– Por força do édito nominal do ano 1150 – resmungou Geralt, após limpar a garganta –, decretado por Dagread, rei de Kaedwen e das Marcas fronteiriças, primo: autoriza-se o livre exercício do ofício dos bruxos nos territórios do reino e das Marcas e se os afastam da jurisdição das autoridades locais…

– Primeiro primo – interrompeu-o bruscamente Bulava –: logo já terá passado meio século desde que Dagread virou pó e, junto com ele, seus éditos nominais autocráticos. Segundo primo: nenhum rei vai afastar nada de mim, porque o rei está em Ard Carraigh, longe daqui, e aqui governa a autoridade local. Ou seja, eu. Terceiro primo: você foi preso não por exercício de seu ofício, mas por assassinato. Caçar lobisomens e matar leshys é sua tarefa de bruxo. Mas nenhum rei te deu o direito de estraçalhar pessoas.

– Agi em defesa…
– Daryl!

O brutamontes obedientemente acertou Geralt com o punho, dessa vez na nuca.

– A sua lenga-lenga – o intendente olhou para o teto – é irritante. Você sabe até onde a irritação pode levar mesmo um homem calmo como eu?

A gralha olhava com seus maliciosos olhos de vidro. Geralt ficou em silêncio.

– Você não é um bruxo – disse finalmente Bulava. – Você é um defeito. Você precisa de conserto. É necessário levá-lo de volta ao refúgio nas montanhas sobre o qual as pessoas tanto falam. Não sei como é que fazem lá. Pode ser que uma falha como você seja desmontada em componentes para serem usados na produção de bruxos novos e melhores. É assim que fazem lá, não é? Os bruxos são feitos de partes de vários humanos costuradas, coladas ou seja lá o que for. As pessoas dizem coisas diferentes. Então, para não ficar falando à toa… Bruxo malsucedido, eu te degredo de volta para as montanhas, além do Gwenllech. Daqui a uma semana.

Geralt ficou em silêncio.
– Você não vai nem mesmo perguntar por que daqui a uma semana? – O intendente mostrou os dentes amarelos. – Você gosta de invocar éditos e leis. Eu também gosto da lei. E ela diz que não é permitido aos forasteiros portar armas neste condado. E você entrou aqui com uma arma.

Geralt queria explicar que não entrou, e sim foi arrastado para dentro. Mas não conseguiu.

– A pena são vinte chibatadas – anunciou Bulava. – Ela será aplicada pelo nosso Daryl, e ele tem a mão pesada. Você não vai se aguentar em pé antes de uma semana. Peguem-no. Levem-no para o pátio e o amarrem no poste…

– Alto lá! – Os brutamontes a quem o intendente dera a ordem foram interrompidos por um homem que entrava no cômodo vestindo uma capa grosseira, bastante suja na barra. – O que você quer, Bulava, levando com tanta pressa o bruxo para o poste e a chibata? Você quer feri-lo? Basta. Nada disso. Preciso dele inteiro e saudável no canteiro de obras.

– E por que – o intendente pôs as mãos na cintura – você está se metendo na execução, Blaufall? Já me basta suportar você sempre pegando meus camponeses para a corveia. Mas não se meta na minha jurisdição. Ela não é da sua conta. O crime deve ser punido…

– Xiu! Nada de crime – interrompeu-o Blaufall. – Não há aqui nenhum crime. Foi legítima defesa e socorro a pessoas. Não faça essa cara, não faça essa cara, pois tenho aqui uma testemunha. Permita-me, estimado senhor. Eia! Não tenha medo. Conte-nos o que houve.

Geralt reconheceu o camponês. O mesmo que no dia anterior ele havia salvado de um roubo e que se escondeu na floresta em vez de lhe agradecer. Era o pai da moça de quem ele se lembrava despida da bata.

– Eu dou testemunho de que… – balbuciou o camponês, apontando o dedo para Geralt. – Eu dou minha palavra de que o rapaz aqui presente veio em meu socorro contra os bandidos… Salvou meus bens… E salvou minha filha da desonra… Livrou a inocência dela das garras dos bandidos…

– E aquele desertor lançou-se sobre ele com um machado – sugeriu Blaufall. – O rapaz apenas se defendeu. Legítima defesa. Confirme, caro senhor, que foi assim.

– Foi assim… bem assim! O rapaz é inocente! – O camponês estava pálido e falava estranhamente alto. – Senhor intendente, liberte-o, eu te peço! E, por favor, aceite… A título de, hum, de algum custo ou prejuízo… eu gostaria de repará-lo…

Inclinando-se de modo servil, o camponês entregou ao intendente uma bolsinha de moedas. Bulava rapidamente a guardou no bolso de suas calças bufantes com tamanha habilidade que a bolsinha nem fez barulho.

– Legítima defesa! – zombou. – Cortou um homem ao meio com sua espada, um moço inocente… Ah, se dependesse só de mim…

Saíram para o pátio. Os brutamontes empurraram Geralt para fora, sem lhe desamarrar as mãos.

– E você, Blaufall? – perguntou o intendente. Está tão escaldado nessa água que até me arrastou para cá uma testemunha? Precisa tanto desse bruxo?

– Então você não sabe? Estamos fazendo a estrada, a Grande Estrada, saindo de Ard Carraigh, passando pelas florestas e chegando até Hengfors. É uma coisa séria, a Grande Estrada. Por lá passará o comércio entre nossas províncias e o Norte. Dizem que o próprio rei mandou nos apressarmos. E tem monstros na floresta e nos pântanos. Volta e meia morre um trabalhador, abatido por um monstro ou levado embora…

– E desde quando você se importa com trabalhadores? Você sempre dizia que o trabalhador não importa; se não tiver um, vai ter outro…

– Os trabalhadores que se fodam, a maioria é da corveia. Mas, às vezes, um desses monstros mata um capataz, aí me desorganiza tudo, o ritmo de trabalho vai por água abaixo. Falar mais o quê? Estou dizendo, eu preciso do bruxo. Se perco o prazo, dane-se o prêmio, mas, poxa, vão mandar a auditoria. E o auditor…

– Sempre vai encontrar alguma coisa – assentiu Bulava. – Aqui é exagero na compra de materiais, ali vai ser excesso de gastos, lá…

– Não fuja do tema – ofendeu-se Blaufall. – Liberte já o bruxo, sem demora. Já vou levá-lo para a obra… Mas o quê… O que está acontecendo?

– São os desmanivrados da guarnição. – O intendente fez sombra para os olhos com a mão. – O exército de Carleton.

Levantando poeira e assustando as galinhas, uma dezena de cavaleiros entrou a galope no pátio. Armados. Roupas coloridas, chamativas, mas um tanto esfarrapadas. Somente os dois à frente estavam mais elegantes: o comandante, um bigodudo usando um gibão de couro de alce, pingente dourado e chapéu com penas de avestruz; e um elfo cabeludo, com uma faixa na testa, vestindo o uniforme verde de batedor.

– Senhor capitão Reisz Carleton – saudou Bulava, indo até eles. – Saúdo-o, saúdo-o. A que devo a honra?

O capitão Reisz Carleton inclinou-se na sela e escarrou. Em seguida, fez um sinal para o batedor. O elfo cavalgou até o poste com a trave e habilmente jogou uma corda com um laço por sobre a viga.

– Arrá… – Bulava pôs as mãos na cintura e verificou se os brutamontes estavam atrás dele. – Vê-se que o senhor capitão veio até meu vilarejo para um enforcamento. Ora, e até mesmo vejo de quem hoje o destino será o laço. Vejo bem, vejo bem… aqueles dois acorrentados. Ora, ora… Pois então o senhor capitão capturou os desertores de sua guarnição. Aqueles que se embrenhavam na minha floresta e atacavam os camponeses e as moças.

– Aqueles – o capitão torceu o bigode – nem penso em enforcar. Os dois serão açoitados em público, um fustuarium. Para que se lembrem. E é isso. Eu tenho poucos homens para os enforcar por qualquer coisa. E para que um vagabundo qualquer os mate impunemente.

O capitão se endireitou na sela e ergueu a voz, discursando não apenas para o intendente, mas também para os brutamontes do vilarejo, para Blaufall e seus capangas e para o pequeno grupo de moradores que já ia se formando.

– Pelo que deveria punir meus soldados? Pelo quê? Por se afastarem sem permissão? Por quererem trepar com uma moça? Aqui na guarnição é como no fim do mundo, no exílio. É como se fosse uma punição. Você não vai encontrar aqui nem cerveja nem mulher. Não é surpresa que os rapazes queiram dar uma saidinha às vezes, pegar uma…

Reisz Carleton ergueu ainda mais a voz.

– Que porra as mulheres vão saracotear na floresta? E esse senhor aqui presente? Precisava ir com essa senhorita justamente por lá? Não lhe passou pela cabeça deixá-la em casa? Não é de estranhar que os rapazes quisessem… Eu não aprovo isso! Não aprovo, mas entendo. Aelvarr? Está pronto?

– Pronto, capitão.
– Pois então me passe aqui esse bruxo, Bulava. Matou um soldado meu, vai para a forca. É preciso dar o exemplo pelo terror. E não o retire de lá, intendente. Deixe-o pendurado, como advertência aos demais.

Blaufall deu um passo à frente, dando a impressão de que queria se pronunciar. Desistiu. Os brutamontes agarraram Geralt, mas hesitaram. Como se revelou, tinham razão para tanto.

De súbito fez-se um estranho silêncio.

Vindo de trás do celeiro, entrou lentamente no pátio um cavalo preto como a noite. Trazia um cavaleiro de cabelos brancos, vestindo um gibão de couro negro adornado por tachas prateadas nos ombros. Sobre seu ombro direito destacavam-se os punhos de duas espadas.

Lentamente, até mesmo com graça, o cavalo preto passou pelos camponeses e pelo intendente até parar diante da cavalaria do capitão Carleton.

O silêncio reinou por um momento. Depois, o cavalo preto sacudiu a cabeça. Os anéis do freio tilintaram.

– Senhor intendente Bulava – rompeu o silêncio o cavaleiro de cabelos brancos –, liberte imediatamente o jovem bruxo. Devolva-lhe seu cavalo, sua arma e seus pertences. Imediatamente.

– Sim… – O intendente pigarreou. – Assim será, senhor Holt. Vamos…

– Senhor capitão Carleton. – O cavaleiro curvou-se levemente. – Minhas saudações.

– Senhor bruxo Preston Holt. – Reisz Carleton tocou a aba do chapéu. – Minhas saudações.

– Senhor capitão – o cavaleiro ergueu a voz –, tenha a bondade de tirar daqui esse elfo, sua corda e seus demais subordinados. Vocês não são mais necessários. O linchamento de hoje foi cancelado.

– De fato? – O capitão se endireitou na sela, apoiando a mão na guarda de sua espada. – O senhor está tão certo disso, senhor bruxo?

– Sim, de fato estou. Despeço-me dos senhores. Senhor intendente, o rapaz está livre? Suas coisas foram devolvidas?

– Ah, seu filho da puta! – berrou um dos cavaleiros de Carleton, arrancando da bainha a espada e esporeando a montaria. – Vou te…

Não terminou a frase. Preston Holt ergueu a mão e fez um gesto curto. O ar uivou e assobiou. Os camponeses cobriram os ouvidos. O cavaleiro gritou e foi arremessado da sela como de uma funda, caindo pesado e morto sob os cavalos de seus companheiros. Os animais se assustaram, relincharam, bateram os cascos, sacudiram a cabeça, um deles empinou. O cavalo do derrubado saiu em disparada entre as casas, coiceando e arqueando o traseiro.

Fez-se um silêncio absoluto.

– Mais alguém? – Preston Holt ergueu a mão enluvada. – Algum voluntário para oferecer resistência? Bancar o herói? Não? Foi o que eu pensei. Despeço-me dos senhores soldados. Jovem bruxo, já na sela?

– Já – respondeu Geralt.
– Pois então vamos seguir nosso caminho. Atrás de mim.