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Crítica

Batman: A Guerra das Piadas e Charadas

Tom King cria um clássico ao explorar lado obscuro do herói e revoluciona a história do Homem-Pipa

24.08.2018, às 00H04.
Atualizada em 24.08.2018, ÀS 12H41

Desde que assumiu a série mensal do Batman, o roteirista Tom King tentou explorar um lado mais humano do Cavaleiro das Trevas. Colocou o relacionamento conturbado com a Mulher-Gato no centro da HQ, mostrou como Bruce Wayne lidou com a depressão em “Eu Sou Suicida” e criou uma das melhores histórias do Cavaleiro das Trevas em A Guerra das Piadas e Charadas, arco publicado recentemente no Brasil pela Panini. Na HQ, ele mostra uma faceta oculta do herói ao mesmo tempo que transforma um vilão medíocre do Cavaleiro das Trevas em um personagem muito mais complexo.

Se você não tem acompanhado a série mensal do Homem-Morcego, esse é um ótimo arco para começar. A história tem início na edição 13 no Brasil, pouco depois de Bruce Wayne pedir Selina Kyle em casamento. Antes da vilã dizer “sim”, ele decide relembrar seus primeiros dias como Batman e fala sobre como lidou com a Guerra das Piadas e Charadas – uma batalha que dividiu Gotham City em duas gangues e foi encabeçada por dois de seus principais vilões. O prêmio da guerra? Matar o Cavaleiro das Trevas. 

Incapaz de rir desde o aparecimento do herói, o Coringa é retratado como uma presença mortal e imprevisível ao longo de toda a história. Ele assassina, fere conhecidos e rivais e faz de tudo para reencontrar sua gargalhada. Contudo, cada tentativa é frustrada e o deixa apenas mais amargurado e assustador. Em um momento brilhantemente desenhado por Mikel Janín, ele para na frente de um espelho e força sorrisos e risadas, mas não encontra nada.

Ao mesmo tempo, King exalta a inteligência do Charada como sua maior arma nessa batalha. Além de não se importar em lutar quando necessário, ele é articulado na hora de criar alianças e consegue mexer com a mente das pessoas ao seu redor. Uma prova disso é a sua fuga do Asilo de Arkham, de onde escapa sem levantar um dedo e usa somente palavras para intimidar os guardas. Especificamente nesse momento, é possível ver nos traços de Jenín inspiração no psicopata Alex DeLarge, personagem vivido por Malcom McDowell em Laranja Mecânica.

É interessante ver como o Batman lida com o fato de ser um coadjuvante dessa batalha. King aproveita o fato do herói ter uma das melhores galerias de vilões dos quadrinhos e coloca confrontos fantásticos como o Exterminador em uma luta física e mental contra o Pistoleiro – tudo isso em tons épicos graças a arte de Janín. Aos poucos a cidade é destruída e cabe ao herói somente limpar a bagunça e lutar para não perder a cabeça.

Isso o leva, inclusive, a usar sua identidade civil para tentar encontrar um meio-termo para o confronto. Em um dos momentos mais interessantes do arco, Bruce Wayne dá um jantar em sua casa para estudar os rivais de perto. Cada prato dá início a um tema diferente, onde eles explicam por que, como e onde matariam o Batman. O texto e os desenhos tem um ritmo tenso que é um reflexo do conflito e, apesar de não ter nenhuma batalha, esse é o ponto de virada da história, pois a partir daí o herói escolhe um lado para acabar logo com o conflito. Além disso, a história abre espaço para o grande destaque desse arco: o Homem-Pipa.

O vilão criado nos anos 70 sempre foi uma grande piada no universo do Homem-Morcego. Tom King, inclusive, se aproveitou disso e o colocou como um alivio cômico ao longo das primeiras edições da série. Contudo, nessa história o autor decide explorar a origem do personagem e mostra um lado tragicômico nunca antes visto – revelando uma pessoa muito mais complexa por trás do Homem-Pipa.

O personagem é a prova que a comédia e o drama andam lado a lado. Conforme King passa a explorar mais de perto a natureza atrapalhada do vilão, aos poucos ele deixa de ser engraçado, vira digno de pena e em pouco tempo o leitor passa a se sensibilizar com a história de um homem lutando para sobreviver nessa guerra ao mesmo tempo que lida com uma perda pessoal.

King coloca o Homem-Pipa no centro da ação na parte final do arco e ele ganha uma importância tão grande que é fundamental para o fim do conflito - que é resolvido em uma luta entre o Charada, o Coringa e o Batman. É nesse momento que o herói revela seu lado mais obscuro, um segredo que o faz acreditar ser impossível uma outra pessoa amá-lo.

A história mostra que o Batman também falha e, apesar de ser um herói, ele tem um limite e por muito pouco não se juntou aos vilões que jurou combater em Gotham City. O Homem-Morcego é um dos personagens mais complexos dos quadrinhos e, graças a King, ele acaba de ganhar uma nova camada.

Nota do Crítico
Excelente!