1984.
Naquele mesmo ano, ganhei meu primeiro gibi, que, então, eu chamava de revistinha. Aos seis anos, muitas coisas em mim já denunciavam o futuro devorador de quadrinhos que eu seria. Personagens como o Homem-Aranha, Batman, Capitão América e Super-Homem, só para citar alguns, já eram parte da minha família. Munido de toda a ingenuidade e inocência daqueles tempos, eu era fã daqueles caras esquisitos com poderes estranhos e que usavam cuecas por cima da calça. De acordo com a minha mãe, aos dois anos, eu já assistia à TV fascinado com o live-action pastelão do Batman & Robin de Adam West e Burt Ward, a não menos tosca tele-série do Homem-Aranha, desenhos como Superamigos, Homem-Aranha e seus amigos, e por aí vai.
A obsessão era tanta que, quando fiz quatro anos, ganhei de uma tia aquele que considero o melhor presente de minha primeira infância: uma coleção de bonequinhos Marvel da Gulliver. E não eram nada dessas action-figures que se vê hoje, com trocentos pontos articulados, armas, máscaras, roupas diferentes, sons e por aí a fora. Era pouco mais de uma dúzia de figuras de plástico imóveis que, hoje em dia, servem apenas como decoração e olhe lá.
O importante é que eu descobri esse maravilhoso mundo dos quadrinhos de heróis graças à editora Abril Jovem. Naquela conturbada época política (Diretas Já!, transição ditadura/democracia, inflação disparada, e por aí vai), os gibis ainda representavam uma das poucas distrações baratas à disposição da garotada. Era formatinho, papel jornal, impressão podreira, cores chapadas, mas e daí? O que a gente queria era sentar e passar um tempo lendo, depois sair comentando com os amigos, discutindo, conversando, rindo e nos fantasiando daqueles heróis.
Depois daquele primeiro gibi do Homem-Aranha, eu me tornei um assíduo cliente da Editora Abril. E foi assim por mais de uma década. Expandi minha leitura, abracei não só o restante do Universo Marvel como também o Universo DC. Já nos anos 90, dei boas-vindas à Image com o formato americano.
Por isso tudo, quando a Abril anunciou que deixaria de publicar quadrinhos de heróis após 23 anos de mercado, fiquei muito chateado. Não vou aqui chorar e dizer que não esperava. Afinal, desde que a Abril cancelou os formatinhos para lançar a série Premium, estava na cara que havia alguma coisa errada. Dali em diante, foram tomadas muitas decisões editoriais que pareceram equivocadas para quem está de fora, culminando com a saída da Marvel e agora da DC.
É muito triste, porque dificilmente teremos de novo quadrinhos de heróis bons e baratos. O padrão de preço hoje parece ter se firmado nos salgados R$ 6,90. Esse valor, com certeza, espantaria o maníaco por super-heróis de seis anos que fui outrora.
Com raras exceções, essa fatia do público é formada por leitores da minha faixa etária - ou mais novos. Como eu, eles dificilmente seriam consumidores fiéis de quadrinhos de heróis sem a atuação da Abril ao longo das duas últimas décadas. Como eu, não começaram suas leituras com revistas importadas, artigos raríssimos da década de 80.