Preacher | As 15 cenas mais pesadas que a série de TV não vai mostrar

Uma das marcas de Preacher, a HQ de Garth Ennis e Steve Dillon que atualmente vira série de TV na rede AMC, é a bizarria ligada a várias outras coisas que terminam em "ia": pedofilia, endogamia, bulimia, zoofilia e... existe carnefilia? Bom, em Preacher existe.

De passagem por Nova York, o trio Jesse, Tulipa e Cassidy deparam com o assassino serial que vem atacando a cidade: o Picador Retalhador. No caso de uma das suas vítimas, ele arranca a pele do rosto da pessoa ainda viva. E fica pior: ele prende o rosto de volta, com preguinhos. E fica pior: prende de cabeça para baixo (os olhos no queixo, o queixo na testa). A cena é das primeiras edições da série, só para Ennis e Dillon darem um toque do que vinha pela frente.

Na primeiríssima edição de Preacher, Tulipa arranca o queixo de um cidadão a tiro. O homem continua vivo, pelo menos em mais dois quadros, onde aparece com cara de chocado. Em entrevistas, o produtor Seth Rogen disse foi exatamente essa cena que fez cair a ficha que ele estava lendo um gibi muito diferente do tradicional - e deu início a seu amor que desemboca no seriado, 20 anos depois. Se a paixão vai colocar a cena na TV não depende só dele.

Com a adaptação, fica a dúvida se os produtores do seriado e a emissora vão topar as cenas mais pesadas ou mais polêmicas dos quadrinhos. Estão em jogo não só questões de bom gosto e puritanismo, mas também leis e as regras do mercado de TV nos EUA, quanto ao que pode e o que não pode ir ao ar.

Dando início a uma longa série de taras sexuais, temos a famosa dupla de assassinos Jody e T.C., caricaturas do caipira das grotas nos EUA, com uma mente assassina temível. E não só: T.C., principalmente, gosta de enfiar o pênis em bichinhos da fazenda. Uma das cenas mais fortes do início da série é a em que T.C. está fazendo, digamos, cloacafilia e depois corta a garganta de um garoto que assistia a seu ato. Mas os caipiras não estão sós: Jesus DeSade também tem uma cena com um tatu mais à frente na série que, felizmente, fica apenas sugerida.

Jesus DeSade é um milionário que promove festas de puro hedonismo: "Bebam! Comam! Injetem! Trepem!", como ele anuncia aos convidados. Até aí, praticamente tudo bem: orgias não são novidade na TV. Cassidy e Jesse inclusive acham a festa legal, na cena da HQ. A coisa muda de figura quando eles descobrem que Jesus está gravando um pornô com uma criança. Embora infelizmente não seja fantasia, até a sugestão de pornografia infantil é barra pesada para um programa de TV. Fora que o nome "Jesus DeSade" já levanta o problema da irreverência da HQ com a religião...

O negócio é que muito do que se viu em Preacher, a HQ, poucas vezes voltou aos quadrinhos dos EUA. Publicada na época de uma das piores crises econômicas do mercado de HQ, a série tinha carta branca da DC Comics para mostrar o que a imaginação desvairada de Ennis e Dillon inventasse. Quando o clima econômico mudou, a censura da editora também apertou - mas Preacher, que durou de 1995 a 2000, já tinha terminado.

A irreverência com a religião desemboca no Graal, a organização secreta e superpoderosa que protege a descendência de Jesus garantindo que seus irmãos e/ou primos se reproduzam entre si. Em 2.000 anos, a genética venceu e o último descendente de Cristo é um adolescente deficiente mental ("Demos sorte de ele não ter nascido com antenas", diz Herr Starr). O Graal já foi citado no seriado como "Grail Industries", mas falta saber se a organização terá personagens deformados e incesto a rodo como na HQ.

O líder do Graal, Grande Pai d'Aronique, é uma figura descomunal que se veste como o Papa e já deve ter passado dos 300kg. Suas refeições são uma sequência de pratos seguidos pelo ritual bulímico: ele enfia dois dedinhos de metal na garganta e força-se a vomitar tudo que comeu. Em seguida, servem a(s) sobremesa(s). O que não incomoda quem conhece a cena mais famosa d'O Sentido da Vida do Monty Python, mas pode incomodar quem sofre de bulimia nervosa - e um canal de TV talvez não queira provocar mais um grupo.

Confira na galeria abaixo o cardápio de escatologias e violência que os produtores do seriado têm a seu dispor - mas dificilmente terão colhão de filmar:

Herr Starr já fez uma participação rápida no terceiro episódio do seriado, na sessão de cinema snuff. Quem conhece a HQ sabe que a figura é essencial para todo o desenrolar da série. E uma das piadas recorrentes da HQ é a mutilação progressiva do vilão: ele perde uma orelha, uma perna, o pênis e, na crueldade criativa de Jesse, fica com um corte no meio da careca que deixa sua cabeça parecendo um prepúcio. Se o Cara-de-Cu já ganhou o estrelato, falta saber se o Cabeça de Piça vem por aí.

Preacher não pode dizer "Fuck!". Embora a AMC não esteja sujeita às leis da TV aberta que proibem palavrões, usar impropérios atinge a emissora no bolso: a AMC tem intervalo comercial, que depende de audiência para ser lucrativo, e a audiência depende de o canal entrar nos pacotes não-premium de TV a cabo, e para entrar nos pacotes não-premium de TV a cabo a emissora precisa ter conteúdo adequado a vários tipos de público. A AMC já liberou "fuck" em Breaking Bad, mas não em Walking Dead, por exemplo. Se você ver muitos "caramba" na legenda, já sabe o motivo.

Parte sátira de Ennis e Dillon à cultura gótica, parte inimigos fodões, a trupe adoradora de vampiros tem várias cenas misturando sexo e sangue. Talvez não seja nada demais para quem está acostumado a outros seriados recentes, como Penny Dreadful, mas vai exigir algumas conversas entre produtores e emissora para aparecer na TV.

Não é só John Wayne. O comediante Bill Hicks (1961-1994) faz participação especial em uma história. Kurt Cobain (1967-1994), o vocalista do Nirvana, tem relação direta com a origem do Cara-de-Cu. O escritor Neil Gaiman vira alvo de sátira. No caso dos falecidos, qualquer referência é sempre perigosa em termos jurídicos. Quanto a pessoas vivas, bom, depende do senso de humor delas. (Falando nisso: Seth Rogen e Tom Cruise são amigos, ok?) E, por conta do anacronismo, é provável que Cara-de-Cu e Kurt Cobain não sejam relacionados na TV.

Herr Starr, de novo Herr Starr. O motivo pelo qual ele fica sem uma perna é que ele cai nas mãos de três canibais que devoram seu membro. E um dos canibais, deficiente mental, só sabe dizer "iba, iba" - frase que Starr não entende, até o homem lhe trazer um papel higiênico e repetir: "iba". Então, sim, o cardápio inclui: limpar bunda suja de canibal. Que não é limpa há algum tempo. E é de um cara que só come carne humana.

John Wayne é uma figura recorrente na HQ. Espécie de amigo imaginário de Jesse Custer, ele conversa e ajuda nosso padre nos momentos de aperto. Fica inclusive a dúvida se ele é tão imaginário assim. O próprio John Wayne também aparece numa cena com o pai de Jesse, quando este está servindo no Vietnã. Usar a imagem do ator, falecido em 1979, envolveria burocracia e grana sérias, e mesmo transformá-lo em um caubói genérico de faroeste ainda pode render perigo de processo.

Se você acabou de conhecer Cara-de-Cu, não sabe o que lhe espera. Isto é, se a trajetória do personagem seguir a dos quadrinhos, na qual ele vira um astro do rock internacional (é sério) e tem alucinações que envolvem uma fada-madrinha Cara-de-Cu, bebês Cara-de-Cu soltando pum com o rosto e um planeta Cara-de-Cu. Enfim, se tudo der certo (ou errado, dependendo do ponto de vista), há pelo menos um belo episódio inteiro dedicado ao Cara-de-Cu no futuro do seriado.

Provavelmente só saberemos pelo final da primeira temporada se o seriado tem a mesma trama-mestre da HQ: Jesse, Cassidy e Tulipa procurando Deus para que o Todo-Poderoso assuma suas responsabilidades com a humanidade. Deus aparece na HQ - e é aquela figura raivosa e sacana do Antigo Testamento. No mundo religiosamente tenso que a gente vive - e depois da experiência dos produtores Seth Rogen e Evan Goldberg com o filme A Entrevista - é de se imaginar que o seriado não ouse mexer tanto com crenças. Ou não?

O dono de frigorífico que foi puxado para o início da história na TV (ele só aparece na metade final da série em quadrinhos), além de racista declarado e chefão no Ku Klux Klan, tem uma tara por carnes. Sua grande cena é a que ele aparece de calças arriadas, abraçado a um corpo de mulher feito com peças de carne e uma peruquinha loira. Os seios são dois perus. Interpretado por Jackie Earle Halley, Quincannon já se mostrou meio doido no seriado, mas sua paixão pelas carnes só começou a ser sugerida.