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Rouco e desacelerado, Paul McCartney ainda brilha

Como sempre, beatle faz belo show em São Paulo

16.10.2017, às 01H32.
Atualizada em 29.06.2018, ÀS 02H44

É difícil botar defeito em Paul McCartney. Aos 75 anos, fazer um belo show de quase três horas ininterruptas e com milhares de pessoas cantando junto em um estádio lotado é para poucos. E, se esta tivesse sido sua primeira vez no Brasil em anos, a apresentação seria só elogios. Feilzmente, esta foi a terceira passagem do beatle por São Paulo na década, e as comparações com performances recentes são inevitáveis.

Paul entrou no palco para começar o setlist com ”A Hard Day’s Night”, seguida por “Junior’s Farm” e “Can’t Buy Me Love”, e o ótimo começo já deixou o povo inteiro dançando, mas mostrou uma rouquidão. Desacelerado e grisalho, Paul trazia uma performance mais discreta do que as anteriores e, visivelmente, economizava sua voz. Foi na sétima música, “I’ve Got a Feeling”, que o problema ficou mais aparente. A apresentação sofre pouco, no entanto, auxiliada pela usual e impecável banda de apoio, e um mar de fãs que provou saber música atrás de música de cor. Infelizmente, tem faixa que só Paul sabe fazer, e no fim das contas, canções como “Maybe I’m Amazed” não tem tanto brilho sem o vozeirão.

Até o meio do show, Macca economizou energia. Simpático como sempre, o rockstar se garante com um carisma incontestável e, se faltou voz, ele compensou na relação com o público. Falando português com os “minos” e “minas”, Paul deu até reboladinha em “And I Love Her”, para delírio do público.

O setlist escolhido foi mais calmo do que estamos acostumados. A novidade, definitivamente um destaque da noite, foi Paul ter emendado a primeira música já gravada pelos Beatles (como The Quarrymen), “In Spite Of All The Danger”, com “Love Me Do”. Apesar de manjada, a faixa foi um dos destaques do show por ser anunciada como homenagem ao produtor George Martin, falecido no ano passado, e rendeu um momento emocionante. Isso sem contar com os comoventes tributos aos outros Beatles – a John em “Here Today” e a George em “Something” – que sempre acabam em lágrimas dos fãs.

Na segunda metade do show, Paul deu um gás e emendou “A Day In The Life”, “Ob-La-Di, Ob-La-Da”, “Band On The Run” e “Back In The U.S.S.R”, para provar que ainda tem energia para fazer um estádio tremer. A performance da metade para o fim, com as já garantidas “Let It Be” e “Hey Jude”, fizeram a economizada no início valer a pena. Na volta do bis, quando a banda retornou com a bandeira do Brasil, do Reino Unido e do orgulho LGBT, Paul ainda teve fôlego para as grandes “Sgt. Peppers”, “Helter Skelter”, “Birthday” e, antes de dar tchau definitivo, fazer o emocionante fim do Abbey Road.

O envelhecimento do beatle, que até pouco ainda parecia um garoto, é inegável e aparente. Não pelos belos cabelos brancos ou pela rouquidão, mas pela desacelerada no setlist, que refletiu sua vontade de se prolongar em músicas menos exigentes, como a dispensável "I Wanna Be Your Man". Mesmo assim, um show de McCartney é valioso demais para focar nos problemas. A vontade de ver mais um sempre fica, e se ele mantiver a promessa feita ao fim de “The End”, ainda veremos o beatle mais uma vez por aqui. Tomara!