Netflix

Crítica

Awake tem bom diretor e ótima reviravolta, mas negligencia seus personagens

Filme da Netflix estrelado por Gina Rodriguez entrou no catálogo em 9 de junho

10.06.2021, às 13H25.

Não é novidade que a Netflix virou o novo lar preferencial dos filmes de ação e ficção científica "médios", daqueles que não fazem parte de grandes franquias, não custam muito dinheiro e provavelmente iriam parar direto no DVD alguns anos atrás. Agora, eles são lançados na plataforma sem muito barulho, procurando por um público que, às vezes, acaba abraçando a novidade - como vem acontecendo com Awake, adicionado ao catálogo no último dia 9 de junho.

No novo filme do diretor Mark Raso (Kodachrome), a atriz Gina Rodriguez (Jane the Virgin) interpreta uma ex-soldada que vive, ao lado dos filhos, um evento apocalíptico no qual aparelhos eletrônicos param de funcionar e todos os seres humanos da Terra perdem a habilidade de dormir. Isto é, quase todos: a filha mais nova da protagonista, Matilda (Ariana Greenblatt), é uma das raríssimas exceções.

É o que os americanos chamariam de ficção científica high concept - ou seja, inspirada por uma ideia curiosa, até inovadora, e que procura explorar as ramificações dela dentro de uma trama limitada pelo ponto de vista de um grupo específico de personagens. O problema de Awake é, precisamente, que o filme pouco investe nesses personagens.

O roteiro, assinado pelo diretor ao lado de Joseph Raso (SEED) e Gregory Poirier (A Lenda do Tesouro Perdido 2) constrói os protagonistas de maneira vacilante. Por exemplo: nossa heroína, Jill, é muitas coisas - uma mãe desesperada, uma ex-viciada em drogas que ainda recorre a atividades ilegais para sobreviver, uma mulher traumatizada com a sua experiência no exército -, mas Awake não parece particularmente interessado em nenhuma delas.

Os coadjuvantes têm menos sorte ainda. Dos filhos da protagonista, que demonstram ser jovens espertos e carismáticos, mas nunca ganham personalidades próprias; ao presidiário Dodge (Shamier Anderson), cujas ações não fazem o menor sentido na trama; todos passam pelo filme como meras engrenagens para que ele chegue onde quer chegar, diga o que quer dizer. Mas o que é isso, exatamente?

Mais frustrante do que qualquer outra coisa em Awake é perceber que o filme não faz a menor ideia do seu motivo de existir. Às vezes, ele parece ser uma história sobre como a nossa concepção de sociedade cai por terra a partir do momento em que um elemento de caos é introduzido em nossa vida (relativamente) ordenada. Às vezes, quer ser um manifesto anti-autoridade, anti-instituição, pró-individualismo - seus maiores atos de heroísmo são, no fim das contas, pessoais, e não coletivos.

Awake nunca para por tempo o bastante para refletir sobre nenhum desses pontos, no entanto. O ritmo alucinante da trama, inclusive, é sua maior deficiência. As revelações e insights que poderiam existir na história são jogadas no diálogo com descaso, e nunca se expandem para o que vemos em tela.

O diretor Mark Raso cria cenas de ação envolventes, é verdade. Seu uso de takes longos e sua movimentação sábia de câmera são apreciados em um cenário de cinema comercial norte-americano obcecado por cortes rápidos e truques visuais. E a reviravolta nos últimos minutos de Awake é bem engendrada, satisfatória - mas isso é pouco para um filme que falha na missão mais básica do gênero apocalíptico: permitir que o espectador se sinta no lugar dos personagens.

Nota do Crítico
Regular