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Narcos | Da Frigideira

História de Pablo Escobar contada por José Padilha e Wagner Moura começa marcada pela previsibilidade

04.08.2015, às 17H49.
Atualizada em 29.06.2018, ÀS 02H43

Não é só de Tropa de Elite que as pessoas vão lembrar imediatamente quando virem Narcos, a série da Netflix sobre Pablo Escobar que reúne Wagner Moura e o diretor José Padilha. A julgar pelos três primeiros episódios, a estrutura conhecida dos policiais de Padilha se combina aqui com a gramática consagrada de O Poderoso Chefão e Os Bons Companheiros.

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Nesses três primeiros episódios se inscreve toda a ascensão de Escobar (Moura), de líder do cartel do narcotráfico da cidade de Medellín a candidato a novo salvador bolivariano da pátria. A frustrada tentativa de se tornar político, no terceiro episódio, deve demarcar tanto o começo do fim para Escobar quanto a escalada definitiva de violência - que já pontua as cenas de ação desde o episódio inicial e que Padilha (diretor dos dois primeiros) filma com visível disposição.

Esse é o primeiro traço reconhecível em Narcos do criador de Tropa de Elite. O segundo, e o principal, é a criação de um painel supostamente complexo de fatores econômicos, sociais, políticos e comportamentais, sustentado na didática narração em off, para dar conta da intrincada realidade mostrada na série. Como em Tropa de Elite, os inimigos são sempre muitos (o dinheiro, os políticos, o estrangeiro, a cocaína, o sexo, o ego) mas os protagonistas operam numa nota só.

No caso de Boyd Holbrook, narrador da história, que faz o agente americano do DEA encarregado do tráfico na Colômbia, o momento que o define já vem no primeiro episódio, quando ele surge dentro de casa com a esposa e precisa fazer seu bebê parar de chorar, enquanto todos os outros personagens estão em bares ou restaurantes. É o sacrifício da família em nome do ofício - que Padilha replica do Capitão Nascimento - que acompanhará o agente como uma assombração. Engessado nessa função, Holbrook pelo menos tem o mérito de ser um bom narrador: ele repete sempre as mesmas expressões ("não esqueçamos que estamos na Colômbia", "especialmente se for na Colômbia", "é assim que as coisas são na Colômbia") sem perder a gravidade.

Já Moura faz do seu Escobar um tipo mais malandro do que psicótico. Se o ator brasileiro parece à vontade no papel, é porque cabe a ele boa parte das cenas de humor pensadas para desarmar a dramaticidade de Narcos. Ele não é uma máquina de gerar bordões como em Tropa de Elite, mas oportunidades não faltam: Padilha dá sempre a Escobar a última palavra, a punchline, e Moura responde bem aos momentos mais cômicos, embora isso tire um pouco a dimensão trágica de seu personagem.

De qualquer forma, a vocação de Narcos não parece ser mesmo para o drama. Padilha está mais disposto a emular a narrativa autoimportante dos filmes de máfia americanos, tanto na estrutura de história oral (a narração devagar e envolvente lembra Os Bons Companheiros, e a relação de Ray Liotta e Robert De Niro no filme de Martin Scorsese tem muito em comum com a de Holbrook e Moura aqui) quanto na própria execução de cenas (o revide à distância de Escobar no fim do episódio três é igual ao de Michael Corleone no final de O Poderoso Chefão).

Sem tanta necessidade de expor contextos e conexões, a tendência é que Narcos fique menos didática nos sete episódios restantes, e a queda de Escobar pode enfim exigir de Wagner Moura sua versatilidade. Até agora, a série fica marcada mais por sua familiaridade do que como uma novidade.

Os dez episódios de Narcos estreiam na Netflix em 28 de agosto.