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História do Rock no Cinema - parte 11: Óperas Rock

De Tommy a The Wall, os grandes momentos do gênero que marcou os anos 70

19.03.2007, às 00H00.
Atualizada em 21.09.2014, ÀS 13H23

A primeira ópera rock surgiu em 1969, com Tommy, um álbum duplo do grupo The Who. A partir da década de 70, essas óperas ganharam as telas dos cinemas e se tornaram uma das principais características da época. É bom fazer aqui uma distinção entre os termos "ópera rock" e "musical de rock". A ópera rock normalmente é uma obra que foi concebida por um artista ou banda e lançada inicialmente como disco. Numa ópera não há diálogos falados, tudo é cantado. O musical de rock, por sua vez, é uma produção que foi concebida como um espetáculo teatral ou diretamente como filme e não há ligação com uma banda específica. Um exemplo de musical é Hair, surgido no teatro e que ganhou posteriormente um filme (já abordado na parte 8 dessa série). Mas as fronteiras entre esses dois gêneros não são rígidas e os termos são normalmente confundidos.

JC Superstar

the wall

tommy

quadrophenia

lisztomania

Jesus Cristo Superstar

A segunda ópera rock criada foi a primeira a ganhar uma adaptação cinematográfica. Jesus Cristo Superstar, composto por Tim Rice e Andrew Lloyd Weber em 1970, era para ser um musical, mas como poucos produtores acreditavam no potencial do espetáculo, os criadores resolveram lançar o disco antes para saber se teriam sucesso ou não. Tim Rice não sabia como classificar sua obra, e como viu que Pete Townshend chamara Tommy de ópera rock, resolveu fazer o mesmo com seu musical. No LP, a parte de Jesus era cantada por Ian Gillan, o vocalista do Deep Purple, mas ele não pôde tomar parte do espetáculo teatral nem da adaptação para o cinema.

O filme foi lançado em 1973, com direção de Norman Jewison. A história mostra um grupo de jovens que encena Jesus Cristo Superstar nas ruínas de Avdat, em Israel. O que chama a atenção são os figurinos, que eram atuais (para a época do filme) ao invés de serem uma reconstituição. A história mostra os últimos seis dias de vida de Cristo, mas do ponto de vista de Judas Iscariotes, o que torna a abordagem de Jesus bem mais humana.

Philip Toubus, que interpreta o apóstolo Pedro, depois desse filme virou ator pornô, mudou seu nome para Paul Thomas e participou de quase 300 produções. A partir de 1987 passou a dirigir e já tem mais de 250 filmes no currículo.

Tommy

Apesar de marcar a estréia do gênero ópera rock, Tommy só estreou nos cinemas em 1975. O protagonista, que dá nome à obra, é um garoto que sofre de um bloqueio psicológico e fica cego, surdo e mudo após presenciar a morte do pai. Já adulto, vira o rei das máquinas de pinball e quando recupera seus sentidos, torna-se um messias.

Com direção de Ken Russell o filme levou dois anos para ser concluído. É uma tradução visual do disco, pontuado pelas músicas do grupo. Não há nenhum diálogo falado normalmente. Todas as falas são as letras das canções. Mesmo hoje, passados mais de trinta anos, o longa ainda mantém sua força, ainda que uma cena ou outra pareça datada.

O álbum original não foi utilizado na dublagem do filme. Todas as canções foram regravadas e os próprios atores cantam suas partes. Algumas músicas foram escritas especialmente para o cinema e outras foram alteradas em relação ao original, como é o caso de "Pinball Wizard", que ganhou uns versos extras.

Um dos grandes trunfos do longa foi o seu elenco. Roger Daltrey, o vocalista do The Who, é o personagem-título e os outros membros da banda também aparecem em algumas cenas. O baterista Keith Moon é o tio depravado de Tommy. Outros astros da música também marcam presença. Eric Clapton é um pastor guitarrista, Tina Turner é a Rainha do Ácido (para esse papel foi cogitado David Bowie, o que também seria uma escolha interessante). Uma das participações mais lembradas é a de Elton John como o Pinball Wizard, performance que para alguns é a melhor da sua carreira - para outros, a única relevante. Ao final da música "Pinball Wizard", o The Who aparece quebrando os seus instrumentos, uma das suas marcas registradas. O elenco também contou com ótimos atores, como Oliver Reed, Ann-Margret (indicada ao Oscar por sua atuação como mãe de Tommy) e uma pequena participação de Jack Nicholson.

Lisztomania

Aproveitando o embalo de Tommy, o diretor Ken Russell reuniu parte do elenco do filme e realizou Lisztomania, lançado também em 1975. É uma fantasia musical sobre a vida compositor clássico Franz Liszt, visto como um astro pop e também interpretado por Roger Daltrey. Há ainda uma breve aparição de Ringo Starr no papel de Papa. A trilha sonora foi produzida e interpretada por Rick Wakeman, que aparece atuando como Thor, o deus do trovão. Talvez por abusar de situações grotescas e caricatas o filme não tenha feito muito sucesso.

Quadrophenia

O The Who lançou outra ópera rock em 1973, um álbum duplo chamado Quadrophenia. A obra foge um pouco dos padrões do gênero. É mais um monólogo do que um drama com vários personagens dialogando. O personagem principal, Jimmy, conta a história de sua vida, quando era um mod, nos anos 60. O título é um neologismo criado a partir de esquizofrenia, no caso, referindo-se às quatro personalidades que Jimmy assume (também pode ser referente às personalidades dos quatro integrantes da banda). Não chegou a ter o mesmo sucesso que Tommy, mas é considerado um grande disco do The Who.

A versão cinematográfica foi lançada em 1979, uma produção inglesa com direção de Franc Roddam. Algumas novas músicas foram compostas por Pete Townshend para a trilha sonora. Além disso, existem canções de James Brown, Marvin Gaye, The Supremes, The Kingsmen, Manfred Mann e Booker T and MG's, sucessos dos anos 60.

Dessa vez, nenhum integrante do The Who aparece atuando. Eles ficaram com o cargo de direção musical, talvez porque Keith Moon havia falecido no ano anterior. O filme marca a primeira participação de Sting como ator de cinema.

The Wall

O disco The Wall, lançado pelo Pink Floyd em 1979, conta a história de um cantor que está sozinho num hotel e rememora alguns fatos de sua vida. Melancólico, vai afundando na sua própria loucura e criando um muro mental que o separa do restante do mundo. O enredo mistura fatos do passado do cantor e baixista da banda, Roger Waters, e do fundador do Pink Floyd, Syd Barret.

Assim como Quadrophenia, foge um pouco dos padrões da ópera. O protagonista passa a maior parte do tempo em um monólogo. Outros personagens só aparecem na cena do julgamento.

O filme chegou às telas em 1982, com direção de Alan Parker. O roteiro é de Roger Waters, que incluiu novas músicas e alterou algumas faixas do disco original. Os outros integrantes da banda participaram das gravações da trilha sonora junto com outros músicos. Waters é o único integrante do Pink Floyd a aparecer no longa, na cena do casamento, como um convidado. A produção conseguiu reproduzir os delírios da mente do cantor de forma bastante eficiente, utilizando atores e animações. Tanto Parker quanto Waters manifestaram insatisfação com o resultado do filme. Os fãs, porém, o consideram uma notável tradução visual do disco, além de ser uma obra respeitável para o cinema.

Para a cena em que o cantor torna-se um líder fascista foram contratados neonazistas de verdade. Posteriormente, o símbolo dos martelos foi adotado por um grupo racista chamado "hammerskins", causando espanto em Parker e Waters, pois o filme é claramente antifascista.

Para o papel principal foi escalado o cantor Bob Geldof, vocalista da banda Boomtown Rats. Além deste trabalho, ele é conhecido também por ter organizado os grandes concertos para ajudar a África, como o Live Aid, em 1985, e o Live 8, em 2005. Na sua autobiografia, Geldof declarou que quase não aceitou o papel porque nem gostava muito de Pink Floyd.

Na cena em que raspa as sobrancelhas, o cantor improvisou e começou a raspar os pelos do corpo inteiro. Geldof também é famoso por não gostar de banhos, mas teve que fazer uma cena em que fica flutuando numa piscina. Sem saber nadar, teve o auxílio de um molde de plástico, similar ao usado nas cenas de vôo de Superman (dizem que era o mesmo utilizado em Supergirl).

No próximo artigo: os musicais da década 70