As últimas palavras de Florence Welch no show apresentado no Anhangabaú como encerramento do MITA de São Paulo são apropriadas: “this is a gift”. A frase que fecha a faixa “Rabbit Heart (Raise It Up)”, parece embalar tudo que aconteceu com uma cereja no topo. Sim, é um presente ter recebido Florence + The Machine e testemunhar o espetáculo pelo qual a banda é conhecida. Não é exagero dizer que foi uma performance impecável. Florence e sua banda entregam absolutamente tudo que um show pede, com uma multidão conduzida pela postura messiânica da frontwoman.
E o nível não estava baixo, porque algumas horas antes quem havia passado pelo Palco Centro do MITA foi o trio das Haim, que animou a pista comum e pista premium no som de um rock empolgante e realmente divertido. Teve Xuxa, claro, teve hits, teve coreografia, piada, teve de tudo. Haim deixou o palco como quem precisa retornar em breve, e com a promessa de que ficariam por ali para chorar por Florence. Elas não foram as únicas.
Isso porque o que Florence Welch entrega no palco é realmente impressionante de ver. A começar, porque a banda não atrasou nem um minuto, e quando deu 20h20 tudo se apagou para luzes discretas encherem o palco e a gritaria começar assim que é possível ver o vulto da cantora surgindo no canto. A performance de “Heaven is Here” é o momento para aquecer o público, e é na segunda música, “King”, que tudo vai abaixo. Sim, Florence é rei, e com seu longo vestido translúcido cumpre as expectativas de uma presença encantadora. Não é somente um visual arrebatador. Florence sabe muito bem como comandar uma plateia. Sua voz preenche o Anhangabaú por completo, e sem nunca desafinar ela caminhou por “Ship to Wreck” e trouxe o vale abaixo com “Dog Days are Over”, momento em que pede que todos guardem o celular e sintam o momento. O pedido dá certo, só para comprovar a magia da banda.
Durante “Dream Girl Evil”, “Big God” e “What Kind of Man” - faixas que compõem o miolo do show - Florence não para no palco, descendo consistentemente para abraçar o público e cantar colada na grade. Alguns sortudos são abençoados por sua presença, e ela faz questão de passar por quase todos os fãs que se espremeram por horas. O comprometimento é lindo de ver, mas é quando Florence volta para cima do palco que tudo reaquece. Sua figura é tão única que é difícil não cair em clichês. É fato: com movimentos que parecem mágicos e a habilidade de comandar coros como ninguém, com seus longos cabelos esvoaçantes e entoando letras lindíssimas, Florence se torna realmente uma bruxa, uma fada, uma feiticeira no palco.
A potência vocal do Florence + The Machine é tanta que é quase fácil esquecer que ela está sendo apoiada por um grupo impressionante de músicos. Ela passeia pelas batucadas, violinos, pianos e harpas em sintonia perfeita, que chamam atenção principalmente em “My Love”, faixa que rende um momento bem bonito na reta final do set principal. A cantora lembra que o hit faz parte do álbum Dance Fever, gravado durante a quarentena, quando encontros assim, shows e performances, não eram possíveis. Ela então pede que todos se abaixem para criar um clima de “ressurreição da música”, e sai do palco deixando um público tonto.
Como tradição, Florence + The Machine deixam uma expectativa de retorno para o bis, uma que não prometia grandes surpresas porque o setlist foi bem semelhante ao do Rio de Janeiro. Mas eles retornaram com um carisma quase insuportável, com Florence dizendo que atenderia os pedidos da plateia pela faixa “Queen of Peace”. “Não planejamos tocar esta música então ensaiamos agora nos bastidores. Eu errei a letra então peço desculpas, mas vamos fazer uma tentativa”, ela diz, com a voz surpreendentemente tímida. Com o apoio do público, já entregue aos poderes de Florence, o momento foi comovente, e preparou o terreno para o combo final formado por “Never Let Me Go” e “Shake it Out”.
As apresentações de Florence + The Machine são famosas por sua magnitude, mas é difícil realmente imaginar o que há de tão mágico nesta apresentação até testemunhá-la. Sim, Florence é bruxa, é fada, é rei, é Messias. E o que mais ela quiser ser.