Di Ferrero sabe que deixou os fãs com um gostinho de “quero mais” na boca ao lançar o EP 7, no começo de abril - isso porque, apesar do título, o álbum conta com apenas três canções inéditas: “Som da Desilusão”, “Além do Fim” e “Universo Paralelo”.
Em entrevista ao Omelete, o cantor definiu o 7 como “o começo de algo novo”, embora não tenha se comprometido com o lançamento de um álbum completo tão cedo. Na longa conversa conosco, o vocalista do NX Zero ainda comentou sobre o legado da sua antiga banda no cenário do rock nacional, e se abriu sobre influências que se refletem em sua música - incluindo suas séries, animes, grupos de k-pop e videogames favoritos.
Confira tudo logo abaixo!
OMELETE: Bem-vindo ao Omelete, Di!
FERRERO: Obrigado! Bora trocar uma ideia?
OMELETE: Bora! Queria dizer que acabei de ouvir o seu EP mais recente, o 7, e achei incrível. Mas ele tem só três músicas, né? Deixa aquele gostinho de ‘quero mais’.
FERRERO: [Risos] Sim, verdade.
OMELETE: Queria saber então, esse é o primeiro passo para um novo álbum? O que vem por aí?
FERRERO: Ainda não sei se um álbum, mas é uma construção mesmo. São três músicas que são ligadas, tem uma conexão. E fazia o quê, mais de um ano que eu não lançava uma música inédita, então quis liberar essas porque gostei da sonoridade, desse caminho que se sugeriu ali. Então, é o começo de algo. Dentro do universo do 7 vai ter uma continuidade sim, vai ter mais coisa, até porque ali tem um conceito muito amarrado.
Eu escolhi o 7 não só por ser esse número cabalístico, mas também por representar um ciclo de mudanças. Aos sete anos de idade somos crianças, aos 14 estamos começando a entender onde a gente está, aos 21 começamos a entender o corpo. Tem tudo isso, todas as mudanças do sete, as sete cores do arco-íris, os sete mares, não falta exemplo. Mas é o horário mesmo das sete também, aquele momento em que o dia está terminando, o Sol se pôs, e a noite vai começando. Esse é o grande gatilho desse EP para mim, pensar naquela cor do céu que vai escurecendo, aquele azul, aquela introspecção. Por isso acho que as músicas saindo mais orgânicas - mas enfim, é o começo de algo novo.
OMELETE: Eu queria falar disso, da sonoridade do EP. Achei o máximo como ele mistura várias coisas - tem essa coisa mais orgânica, acústica, como você falou, mas também uns sintetizadores interessantes. Pra você, qual é o tesão de fazer esse tipo de mistura? E você tem vontade de lançar algo mais puramente dançante no futuro?
FERRERO: Tenho, claro. Eu sempre gosto de usar a tecnologia a meu favor, não tenho medo dela. Inclusive, o clipe de “Som da Desilusão”, que foi feito num take só, tipo [a minissérie da Netflix] Adolescência, foi feito com ajuda de inteligência artificial. Foi o Bruno Bock [Youtuber, fundador do canal Pipocando e artista audiovisual que tem experimentado bastante com a IA generativa] que fez. Isso é muito legal para mim.
Sobre sons mais dançantes, cara, eu comecei minha carreira solo com uma música chamada “Sentença” que era muito distante do som que eu fazia com o NX. Tentei fazer algo meio Nile Rodgers, meio CHIC, Daft Punk, por aí. Eu tenho isso em mim. E se você for pensar no conceito que eu te falei do 7, conforme o Sol vai se pondo e começa a noite, esse é o momento de dançar. Pode ser o meu caminho.
OMELETE: Legal! Bom, Di, você fez parte uma geração muito marcante do rock nacional, que moldou o gosto musical, até a filosofia de vida, de toda uma geração - e eu me incluo aí também. Olhando para trás, como você vê o impacto do NX Zero nessa geração, e como você avalia esse legado?
FERRERO: Olha eu fico muito feliz hoje olhando para tudo isso, vendo tudo o que rolou nessa geração da qual eu fiz parte, tudo o que eu pude viver ali. Na época, foi algo muito genuíno - não foi uma coisa pensada, de colocar o NX com aquelas outras bandas, e todo mundo também tinha vários projetos diferentes… era uma cena que pipocava gente o tempo inteiro, e gente que fazia música diferente. E eu acho que a época nos serviu muito bem, porque era o começo de uma nova geração, o começo das redes sociais, o mercado todo reclamando de não conseguir vender álbum, e eu feliz da vida porque as pessoas podiam baixar minha música. Não tava nem aí, só queria tocar!
Eu acho que a gente representou uma mudança na indústria. E, junto com isso, as questões da nossa geração. Hoje em dia a galera se abre mais sobre saúde mental, isso tem um nome, mas já naquela época a gente falava disso nas músicas. Frustrações, sensações, sentimentos que eram julgados. Era perigoso você levar porrada por falar disso, ou por se vestir de determinada forma. Nós trouxemos um enfrentamento disso! E é legal ver hoje porque você percebe o tamanho que isso foi, a junção dessas bandas - antes de chamar emo, ou o que quer que seja, já tinha um conjunto de bandas influenciadas pelo hardcore melódico e pelo punk.
Se você acompanha - Gritando HC, Street Bulldogs, Hateen, CPM 22, NX Zero, Fresno, Far From Alaska -, existe uma sequência ali. E é muito legal ter feito parte disso, foi muito incrível e hoje eu vejo que está mais vivo do que nunca. Continua muito forte, e isso acontece porque foi um movimento muito real, né?
OMELETE: Sim, incrível. Você também estava fazendo shows agora, na turnê Outra Dose, em que você misturava músicas novas e antigas. Como é sua relação com as duas partes dessa carreira? Ouvindo e cantando as músicas antigas, você vê a sua evolução como artista?
FERRERO: Sim, é verdade, com certeza vejo a evolução. E ainda bem, né? Estou ficando mais velho, vivendo e aprendendo mais coisas, até musicalmente falando. E tem o fato de que, como vocalista, eu sou o meu instrumento. Sempre me preocupo em cantar melhor, em evoluir nesse sentido. E na hora de compor, acho que estou conseguindo ser mais sincero comigo mesmo, falar mais das coisas, não ficar fazendo rodeios.
Mas adoro tocar as músicas antigas, também, contar aquela história, porque na hora tudo aconteceu de forma muito intuitiva. Essa turnê me deixou parar e contar essa história, e me deu várias outras oportunidades. Tem um cara que toca comigo, o Bruno Genz, que fazia parte da banda Cine, daí a gente brinca um pouco e toca uma música do Cine. Ele ajudou a produzir o meu álbum, junto com o Felipe Vassão, então é legal poder fazer isso com ele.
Acho que eu tenho feito um monte de coisas diferentes, esse ano fiz um bloco de Carnaval, chamei de Se Fui Triste, Não me Lembro. Eu toquei de tudo lá, fiz mashup de Paramore com Péricles, foi muito f*da. No show, ali na hora, você tem que tocar o que faz sentido para a galera. A galera tá pagando para ser entretida, para se divertir, para ter um momento de paz no caos que a gente vive. Então sim, eu consigo ir para as músicas antigas e lembrar, ter esse momento de festa também.
OMELETE: Di, você sabe que aqui no Omelete a gente é apaixonado por cultura pop, cultura geek. Queria saber que tipo de filmes, séries, te inspiram na hora de compor? Qual é aquela saga que você é super fã?
FERRERO: Nossa, algumas, né? [Risos] Nesse EP, o 7, tem uma música chamada “Universo Paralelo” que eu escrevi pensando naquela série, Matéria Escura. Achei uma história muito boa. Fiquei pensando nessa coisa de tentar consertar algo do passado, de qualquer jeito, mas cada coisa que você muda vai transformar tudo de uma forma que você não imagina. É impossível consertar.
Então sim, eu sou influenciado o tempo todo por livros, séries. Eu estava lendo A Coragem de Não Agradar, que é um autoajuda, enquanto estava compondo as músicas. Acho que foi bom para eu ser mais sincero comigo mesmo, sem ligar muito para fórmulas, algoritmo, tren, esse tipo de coisa. Cara, vamos só fazer música, sabe?
Enfim, são muitas coisas. Por exemplo, sei que o Adolescência agora trouxe de volta a coisa do take único, mas a primeira vez que eu pirei nisso foi no final de Cisne Negro, aquela coisa de manter a tensão - tentei trazer a mesma coisa para o vídeo do “Som da Desilusão”. E também tem coisas que vejo para me divertir, adoro The White Lotus - não me conta o final [da 3ª temporada] que ainda que estou esperando minha esposa para assistir.
E Pinguim, tá? Eu amei. A cena que eles incluem a música do The Cure, quando o Pinguim acha aquela estação de trem, achei incrível. [A canção “A Forest”, da banda de Robert Smith, toca no final do episódio 5 da série da HBO Max].
OMELETE: Perfeito, gosto muito também. E tem um outro lance que tá super em alta agora, que é a cultura asiática. Como é sua relação, por exemplo, com anime? É algo que você consome bastante?
FERRERO: Mano, eu comecei vendo Os Cavaleiros do Zodíaco, né? Eu e meus amigos, a gente brigava quando ia começar: ‘Pô, cala a boca aí!’. Cavaleiros do Zodíaco era incrível, mas também assisti algumas coisas do One Piece com o meu enteado, porque é o preferido dele. Para quem assistiu tudo, parabéns, viu? É muita coisa. [Risos] Mas o meu enteado se verte de Luffy para dar rolê, enfim, ele adora.
Gosto muito do Arcane também, a trilha sonora é incrível. Acho que só conheço os mais populares, mas essa coisa da cultura asiática é fascinante. A parada do k-pop que está rolando agora, acho incrível. A galera canta, dança, são artistas incríveis. Muitas bandas de k-rock, tem uma que fez um cover de “Razões e Emoções”, do NX, deu uma viralizada, ficou muito legal [referência ao 2Z, que de fato regravou "Razões e Emoções" em 202 - confira abaixo]. Acompanho muito!
OMELETE: Que legal! Você mencionou a música asiátia, o k-pop, o k-rock, o j-rock. Esse tipo de música influencia de alguma forma as suas composições o seu show? Você falou que eles são artistas completos - é algo que você olha e fica querendo incorporar?
FERRERO: Cara, eu lembro de fazer uma turnê no Japão, um bom tempo atrás. Aí eu fui no show de um artista de holograma, e isso ainda era muito novo. Inclusive, lá durante o show é cada um no seu quadrado, tá? Se você começasse a pular muito vinha o segurança e pedia para você parar.
Mas enfim, eu fui lá, assisti esse show, e comecei a brisar demais nessa coisa de brincar com a tecnologia, fazer holograma. Foi inclusive um dos motivos que eu dei uma pausa no NX, porque eu queria fazer algo diferente, criei um alter ego, tipo um Gorillaz meu. Voltei para o Japão para gravar o clipe desse ‘novo’ artista, que eu chamei de José. Gravei um álbum com 10 músicas, tem participações do Paulo Miklos, Mumuzinho, Emicida, Rael. Uma baita galera!
Nunca lancei, mas ele é meu alter ego. Está pronto, vai ser meu álbum póstumo.
OMELETE: Poxa, Di, que isso! Lança antes, pelo amor de Deus.
FERRERO: [Risos] É, eu queria lançar antes, mas tenho várias coisas pra sair e fico empolgado com as novas.
É isso, eu sou admirador da cultura asiática desde sempre. Em vez de tomar café, tomo matcha, adoro comida japonesa - tenho até um temaki tatuado na perna. É uma cultura que eu amo muito, ainda quero morar no Japão por um tempo.
OMELETE: Massa! E um outro negócio que faz parte da rotina de todo mundo hoje em dia é o videogame - queria saber, qual é a sua relação com isso? Qual foi o jogo que você ficou mais fissurado?
FERRERO: Sou viciado. E cara, eu sou das antigas, comecei jogando RPG - antes do computador até, eu jogava um que era no livro, na mesa, com uma trama de vampiro assim [Vampiro: A Máscara, lançado em 1991]. Depois chegou o computador, e quem tinha chamava os amigos pra jogar em casa - aí veio Warcraft, Age of Empires, depois aquele primeiro GTA em que a câmera era de cima. Tosco, mas ótimo, perdi muito tempo nele!
Claro que quando chegou o console minha cabeça explodiu, cara. Joguei muito Mario, porque era aquela coisa de querer pertencer - meus amigos jogavam isso, eu também queria jogar. Daí fui jogar FIFA, apesar de não gostar tanto, preferir os outros. Joguei Full Throttle, aquele de moto que tinha no computador. Anos depois, Red Dead Redemption, nossa, fiquei muito tempo nele. God of War eu gosto muito, Prince of Persia.
O Doom não foi o primeiro jogo de tiro em primeira pessoa?
OMELETE: Foi um dos primeiros, sim, lá no começo dos anos 1990.
FERRERO: Então, era super proibido, por ser muito violento, muito sangue. Você jogava escondido. Eu fui passando por todos esses jogos até que a banda começou a bombar e eu tive que escolher jogar menos - mas mesmo assim a gente levava o videogame pro quarto de hotel, pro ônibus da turnê.
OMELETE: Maravilha, Di. Muito obrigado!
FERRERO: Valeu, querido. Tamo junto!