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TWICE em imagem promocional do This is For (Reprodução)

Música

Crítica

This is For testa o TWICE de todas as formas possíveis - e elas sempre vencem

Lidando com pressões por todos os lados, grupo segue fazendo pop de primeiríssima

11.07.2025, às 16H15.

Não importa o ângulo pelo qual você olha, o mundo do k-pop já ultrapassou o TWICE. O público jovem que se aproximou da música sul-coreana nos últimos anos prefere grupos que estrearam junto com eles, é claro, e de qualquer forma esses grupos (KATSEYE, BoyNextDoor, ILLIT, etc) já nasceram dentro de um estrelato internacionalizado que, em sua narrativa mais relaxada e dada à “autenticidade”, pouco tem a ver com o tipo de idol de k-pop que as nove meninas do TWICE representam. Ademais, o grupo foi criado num cenário que prezava pela produção pop tradicional, com sintetizadores aéreos e melodias redondinhas pensadas para a pista de dança. “Feel Special”, “What is Love?”, “I Can’t Stop Me”... pop antes do pop virar peça de museu, substituído ou pelo “hiperpop” ou por lógicas de produção minimalistas emprestadas do indie.

O primeiro acerto do This is For, novo disco do TWICE, é encarar esse desajuste entre o grupo e o cenário de frente. A faixa de abertura, “Four”, começa com sintetizadores e percussão industrial por cima de cantos colados de “Run the World (Girls)”, de Beyoncé - também um hit de outra época -, mas os entrelaça com toques doces de teclado e uma abordagem rítmica que faz aceno ao k-pop etéreo que levou NewJeans e Le Sserafim à crista da onda do cenário. “Quando você nos ver/ Vai nos amar loucamente”, promete o refrão do interlúdio, que deságua imediatamente no rápido e rasteiro single “This is For”. Com enfurecedores 2:11 de duração, ele é uma anuência do TWICE às regras do jogo em 2025, mas também um primeiro olhar para a direção musical única do disco.

A dica vem nos créditos de produção: Stephen McGregor, mestre jamaicano do dancehall que ascendeu à fama ao lado de Sean Paul e já trabalhou com Nelly Furtado, Drake e Shakira, é quem dá à canção-título o sabor melódico caribenho que ressurge ainda mais forte na confiante balada mid-tempo “Options”, e na deliciosamente grudenta “Right Hand Girl”. No disco todo, Momo e Jeongyeon (os dois tons mais anasalados do TWICE) são especialmente recrutadas para entregar fraseados clássicos do dancehall - melodias terminadas em graves largados nas águas turvas de uma boa produção eletrônica como ganchos para fisgar a curiosidade do ouvinte. Para uma referência mais mainstream, pense em Rihanna cantando “Man Down” e “Rude Boy”, e você vai saber do que estou falando.

A alusão é tão específica e tão inesperada quanto genial, no contexto dos desafios postos pelo This is For para o TWICE. Se o cenário exige que se faça mais com menos tempo, o grupo recorre aos ritmos caribenhos para entender uma forma diferente de construir canções, que abra espaço para confecções sonoras satisfatórias sem precisar do espaço que antes parecia tão imprescindível. O dancehall tem algo de apressado, urgente, que faz bem ao disco. É uma alquimia acertada que culmina na atrevida “Peach Gelato”, com o seu violão acelerado e seu fraseado leve, encontrando uma forma milagrosa de envelopar uma refeição pop completa em 2:18 de uma musicalidade soltíssima. “Quando vi você balançando, pensei que tinha acertado na loteria, diz o refrão, e parece mesmo que elas encontraram o ritmo aqui.

A segunda metade do disco só faz aprofundar e ramificar essa inspiração. Um hip-hop mais franco entra em cena com “Battitude” e “Dat Ahh Dat Ooh”, canções confiantes levadas por batidas nada convencionais, que as cantoras carregam sem nem suar. “Let Love Go” vira o jogo com uma power ballad engraçadinha que não faria feio no repertório de Sabrina Carpenter, mas levada por acentos melódicos que não soarão estrangeiros para quem está prestando mais atenção ao álbum. E, se “Talk” opta por um R&B desacelerado que pouco se encaixa na tracklist, pelo menos ela dá espaço para o melhor dueto vocal do TWICE brilhar - os tons graves e poderosos de Jihyo e Nayeon dançam ao redor um do outro com elegância difícil de rivalizar.

Por fim, este ainda é de longe o disco mais anglófono do TWICE até hoje, reflexo da internacionalização do k-pop e da própria trajetória do grupo, um dos mais reconhecíveis do cenário fora da Coreia do Sul. Ou seja: há pressões o bastante sobre This is For para fazer malabarismo com elas. Eis um disco feito para lançar o TWICE nos EUA, lutar contra a obsolência do grupo entre o público jovem, provar que elas se encaixam na era rápida do streaming, mostrar que ainda fazem sentido como grupo dez anos e alguns álbuns solo depois… nenhuma missão fácil, enfim. Que essas nove artistas encontrem uma forma de fazer pop de primeira categoria enquanto encaram tudo isso é prova de uma força expressiva gigantesca, e um talento francamente geracional.

Nota do Crítico
Ótimo