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Secret Empire | Da Frigideira

Saga começa privilegiando a ação, e série paralela do Capitão América se mostra indispensável

29.05.2017, às 16H43.
Atualizada em 29.06.2018, ÀS 02H42

Com duas edições já publicadas, de um total de dez, Secret Empire começa mostrando que há certas regras consagradas nas suas sagas que a Marvel Comics nunca quebrará. Do personagem desimportante mas querido dos leitores, que é morto logo de cara, à premissa que desestabiliza o status quo e tira os heróis de sua zona de conforto, a minissérie do Capitão América da HYDRA atende a expectativas sem subvertê-las demais.

Mas, ao mesmo tempo, a HQ traz uma novidade que oxigena o formato dos grandes eventos da editora: a noção de que pelo menos uma série paralela, a do próprio Capitão América, é de leitura essencial para acompanhar a narrativa principal. Os chamados tie-ins das sagas da Marvel sempre foram um luxo reservado aos completistas; a saga principal nunca sofre muitos buracos se o leitor deixar as revistas complementares de lado. No caso de Secret Empire, ler em paralelo a HQ do Capitão é ter um ponto de vista privilegiado da saga.

Nas duas edições de Secret Empire, o que vemos é a organização em subgrupos da resistência ao regime da HYDRA nos EUA. A ação move a narrativa, e não seria diferente; o ataque a Las Vegas na primeira edição é a senha para colocar todos os atores em movimento, e sempre vale a pena ver como Vingadores interagem entre si em situações de exceção. O cenário montado na saga é bem consistente, porque a HQ não perde tempo em mostrar que, em tempos de guerra, a primeira coisa a despontar são os oportunistas enxergando vácuos de liderança, como testemunhamos o Rei do Crime na segunda edição.

O roteiro de Nick Spencer sabe dar atenção aos dramas de câmara de Steve Rogers, que luta sem sucesso para não sujar suas noções de nobreza com as concessões do poder, mas é justamente na série solo que o escritor dá vazão às analogias que certamente motivaram Spencer a criar Secret Empire. Publicada na semana passada, a edição #17 de Captain America: Steve Rogers é um tie-in crucial porque podemos enfim entender como Rogers vê a si mesmo no poder e, principalmente, como enxerga seus interlocutores.

É aí que Secret Empire traça então seus paralelos com os EUA de Donald Trump, com sua liderança que antagoniza com a mídia e, como resposta, recebe relatos e interpretações que só fortalecem ainda mais a impressão de polarizações de posições. Se o mundo do Bem contra o Mal das historinhas em quadrinhos tomou conta da nossa realidade, nada mais justo que as HQs a reivindiquem de volta, e Captain America #17 se esmera em traçar paralelos de teatro geopolítico: os Inumanos isolados numa "solução provisória" são como o tratamento dado a refugiados sírios (com a devoção dos inumanos à sua família real servindo de crença islamita) e a cooptação de Magneto por Steve Rogers lembra as alianças de não-agressão dos EUA com seus aliados de ocasião.

Finalmente, a realização de que a guerra é uma questão econômica, usada para consolidar poder em tempos de crise, é a verdade que Steve Rogers se vê forçado a ouvir, e só por isso já valeria a pena ler não apenas Secret Empire mas também a narrativa paralela de Captain America. O que Spencer almeja traçar aqui é um panorama em que os tie-ins se prestam não apenas a cumprir tabela ("descubra o que o herói fulano estava fazendo durante a saga") mas principalmente a dar forma e engrossar a narrativa central.

Secret Empire | O que você precisa saber antes de ler a saga