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Um dia no set de Caçadores de Emoção - Além do Limite

Esportes radicais, alguma ação e um visual de encher os olhos

27.01.2016, às 16H08.

Chegar ao set de Caçadores de Emoção - Além do Limite não foi uma tarefa fácil. Além do voo de São Paulo até Frankfurt, mais dois aviões foram necessários para chegar ao local. Um da Alemanha para Viena, capital austríaca, e outro para Klagenfurt, uma pequena cidade da Áustria.

Quando saí do avião teco teco que sobrevoou montanhas cheias de neve, jurei que o set estava ali naquele vilarejo com pouco mais de 90 mil habitantes. Ledo engano. Foi preciso dirigir mais duas horas e meia de carro pra chegar até uma vila ainda menor, que servia de acampamento para os Alpes onde, enfim, o filme estava sendo rodado.

Essa jornada, apesar de cansativa, foi ilustrada pelas paisagens mais lindas que meus olhos testemunharam. Dos picos brancos de neve até os campos verdes com vaquinhas marrons e árvores altíssimas, tudo caracterizava um paraíso campestre europeu - e era exatamente este o sentimento que os produtores do novo Caçadores de Emoção queriam passar.

A intenção era se distanciar um pouco da maresia californiana do primeiro filme, estrelado por Patrick Swayze (Bodhi) e Keanu Reeves (Utah). Além do Limite deu a volta ao mundo, explorou paisagens em todos os continentes e trouxe do longa original somente os nomes os protagonistas e algumas referências ao modo de vida de Bodhi, aqui vivido por Edgar Ramirez. Apesar de se atrelar à obra de Kathryn Bigelow, este é um projeto diferente do filme cult de 1991.

Do alto da montanha

Vestido (eu achava) para aguentar o frio dos Alpes, juntei-me à equipe da produção para ir ao set. O relógio marcava 10h quando chegamos ao bonde que nos levaria até o topo das montanhas - o lugar é frequentado por inúmeros turistas na alta temporada, mas, naquele momento, a atração estava fechada para o filme.

Os protagonistas Luke Bracey e Edgar Ramirez já estavam no set desde as 5h, assim como o diretor Ericson Core. O tempo não ajudou as filmagens, pois a quantidade de nuvens no local era bem grande. “Todo mundo acordou e correu para a montanha quando viu que as nuvens iam tomar conta. Por sorte elas começaram a dissipar e a gente vai poder assistir à filmagem sem neblina”, conta um dos assistentes da produção que nos acompanha no bonde.

Quando o veículo começa a parar e as portas se abrem, sinto uma pequena dor de cabeça e falta de ar. Não é pra menos, estamos a quase cinco mil metros de altitude e sob um frio de cinco graus negativos. De cara, percebo que não estou agasalhado de um jeito apropriado. Uma calça, duas camisas e um casaco não foram o suficiente para aguentar as rajadas de vento. Quando chegamos ao topo das montanhas e no set do filme, porém, a tremedeira se foi e um arrepio subiu a espinha. De cima dos rochedos, conseguíamos ver uma paisagem que até então ninguém havia reparado: uma mistura de pedras grafite, neve, florestas e um imenso lago que se escondia no meio dos Alpes.

O que será que filmaram aqui”, pensei de imediato. “Eles já fizeram as cenas do skydiving. Ontem, um grupo de atletas radicais pulou daqui e foram até lá em baixo apenas com um wingsuit”, disse um outro membro da produção. ‘Inacreditável’ era a única palavra que vinha à cabeça - pelo lugar e pela atitude dos esportistas. E pelo que o briefing do filme passava, aquilo era apenas uma das loucuras deste novo Caçadores de Emoção. “Vamos atravessar o mundo e mostrar paisagens incríveis com cenas intensas focadas na prática de esportes radicais”, disse o ator Luke Bracey.

O caso Bodhi x Utah

Depois de passar pelo precipício de onde os malucos pularam, atravessamos o cenário do trecho que seria filmado no dia. Vários caminhões perfilados e algumas motos jogadas no chão construíam uma emboscada que teria no centro Johnny Utah e Bodhi. Bracey e Ramírez estavam com vestes de motoqueiros e com alguns arranhões no rosto, além de muito suor - a perseguição deve ser intensa.

No primeiro "ação" de Core, Bracey sai correndo em direção à Ramirez, aponta uma arma para ele e se revela do FBI. “Por favor, pare”, pede o Utah. Bodhi está com um explosivo na mão. Sereno e com algum desprezo nos olhos, Ramirez pede para ele desistir e aciona o dispositivo. “Corta”, grita o diretor. Ali, vi um pedaço da sinopse do filme em ação. Utah é um agente do FBI apaixonado por esportes radicais, que acaba envolvido em um caso sobre ladrões que praticam esportes radicais e tiram dinheiro dos ricos para dar aos pobres.

A cena foi rápida, mas exemplifica o centro da trama de Cacadores de Emoção: a relação entre Bodhi, líder do grupo de ladrões, e Utah. O primeiro deixa de ser o criminoso bon vivant da época de Swayze e se torna um ativista. “Esse Bodhi é mais responsável, mais preocupado com a natureza do que com a própria vida”, disse Ramirez, carregando um espírito muito mais tenso do que Swayze transmitia no filme original.

"Bodhi é o cara que une esse lema de aproveitar a vida, assim como no primeiro filme, mas sem esquecer de zelar pelo planeta. E claro, todos os membros do grupo são aficcionados por esportes radicais", disse o ator. O ator venezuelano não tinha familiaridade com snowboarding, motocross e paraquedismo, mas já surfou, então conseguiu se acostumar bem com o papel. “A parte mais difícil ficou com os dublês, que eram atletas profissionais”, completou.

Luke Bracey, por outro lado, pediu para fazer tudo que pudesse. Saltar de uma montanha a cinco metros de altura não deve ter sido permitido, mas surfar, esquiar e pilotar uma moto não foi tão difícil. “Sou australiano e usufrui bastante de esportes radicais na minha adolescência. Sou surfista até hoje, então foi unir o útil ao agradável”, falou o ator, que ainda achou mais um - o mais importante - ponto positivo quando conseguiu o papel de Johnny Utah.

Utah era como um dos nossos heróis [na Austrália]. E como eu surfo desde criança, minha ligação com ele e Bohdi era muito natural. Um dos momentos mais felizes da minha vida foi quando consegui o papel e soube que ia reviver o que Keanu Reeves fez tão bem na década de 1990. É uma grande responsabilidade, mas uma grande alegria também”, contou. Apesar de estar super empolgado para a entrevista, Luke não pode conversar conosco e deixou a barraca onde estávamos correndo de volta à filmagem. “Desculpe pessoal, mas vou voltar a ser Utah”, se despediu.

Depois de mais quatro ou cinco takes com a mesma cena, chegou a hora de voltar ao bonde e tomar o caminho do hotel. O deslumbre que as paisagens causaram no caminho de ida não diminuiu na volta e a única coisa que vinha à cabeça era ‘quão belo isto pode ficar em uma tela de cinema’. Independente da qualidade do longa, existiriam cenas ali que valeriam o ingresso, principalmente pelo 3D e, pela primeira vez,  por exibirem cenas de uma GoPro com resolução 4K.

Uma beleza radical e ecológica

Além do bromance complicado entre a dupla protagonista, o grande chamariz de Caçadores de Emoção - Além do Limite é a fotografia. A equipe filmagem principal e a segunda unidade (responsável por várias cenas importantes do longa) atravessaram o globo em busca de lugares que impressionassem na tela. Venezuela, Havaí, Itália, Áustria, Austrália e México foram alguns dos países pelos quais passaram. E em todos eles, os melhores esportistas de cada modalidade filmada esteve em cena, o que garante tomadas dignas de um especial sobre esporte radicais de alta qualidade.

Quem estava ainda mais feliz que Bracey era Ray Winstone, veterano de filmes de máfia, que aqui vive um agente veterano do FBI residente em Londres. O ator havia terminado seu trabalho no set e agora estava no hotel se preparando para entrevistas. "Apesar de eu odiar esportes radicais [um dos temas principais do filme], eu achei o máximo viajar para Venezuela, México, Áustria, Itália e outros tantos”, contou, com um sotaque britânico super puxado.

Sobre o seu personagem, Winstone admitiu que não o vê fugir do estereótipo que permeia sua carreira. “O Pappas é uma figura. Um ex-ladrão que fala milhares de palavrões e é super engraçado. Acho que com ele o filme equilibra bem a ação e a história de amor entre dois sujeitos com diferenças aparentes, mas que têm muita coisa em comum”, descreve o ator.

A pouca vontade para responder sobre detalhes da trama sumiu quando começamos a falar sobre a ‘falta de cérebro’ em alguns filmes de ação recentes - algo pelo qual a audiência parece sedenta e feliz ao consumir. Será que Caçadores repetiria isso ou teria uma vibe mais humana, como seu antecessor? "A audiência é burra pelo que damos a ela. Não podemos julgar se não damos algo para pensar. E em Caçadores não tem isso, tiramos essa necessidade de não pensar. O filme fala sobre o cuidado com a natureza e como devemos lidar com isso", opinou.

De fato, cutucar um veterano com perguntas deste cunho é pedir para ganhar respostas atravessadas como essa - ao mesmo tempo que é o único jeito de sair do ‘feijão com arroz’ que permeiam boa parte destas entrevistas. Por sorte, Winstone seguiu a linha do ator desbocado e garantiu ainda que Além do Limite não é um remake. “Para que vamos fazer de novo se o primeiro é bom? Isso aqui é uma históra diferente, uma nova visão sobre um tema que eles exploraram há vinte anos”, disse.

Realmente Caçadores de Emoção - Além do Limite carrega pouco do original. Nomes e alguma citação sobre a ambientalismo talvez sejam as únicas coisas que mantém essa ligação. De resto, a visita ao set na Áustria mostrou que o filme de Ericson Core vai encher a tela com sequências de esportes radicais e locais ricos em beleza natural. Empenho para transformar esta proposta em um longa com personalidade a equipe de produção mostrou ter, falta conferir o resultado em uma (grande) tela de cinema.