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Um amor além do muro

A utopia segue viva na década da liberdade de amor e pensamento

MH
08.03.2007, às 00H00.
Atualizada em 21.09.2014, ÀS 13H22

O fim das utopias não impede que a juventude dos anos 60 continue sendo vista no cinema como um ideal de paixão plural e pensamento livre. Um amor além do muro (2006), de Dominik Graf, é o Sonhadores da Alemanha oriental.

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O título que Der Rote Kakadu ganhou no Brasil é equivocado. Para dar tragicidade à história de amor platônico, subverteu-se na tradução a premissa do filme. A trama não se ambienta durante os anos do Muro de Berlim, mas nos meses que antecederam a divisão da Alemanha em duas, em 1961. Não há concreto impedindo o trânsito de pessoas entre a porção comunista e a capitalista, e sim o acordo velado de não deixar os bens de consumo americanizados da RFA (Repúplica Federal da Alemanha) "contaminar" os ideais vermelhos da RDA (República Democrática Alemã).

Como no filme de Bernardo Bertolucci, há um triângulo de amigos/amantes que sabem valorizar uma boa cultura de massas - no caso, o rock dos Estados Unidos, muitas vezes contrabandeado em vinis. Em Dresden, o único lugar em que a música não chama demais a atenção dos comunistas é no tal Rote Kakadu, "Cacatua Vermelha", boate que funciona como espécie de zona desmilitarizada onde os protagonistas bebem, flertam e dançam rockabilly, com direito a big band improvisada.

Foi em uma manifestação contra a polícia que Siggi (Max Riemelt) se aproximou de Luise (Jessica Schwarz) e do marido dela, Wolle (Ronald Zehrfeld). Apaixonado por Luise à primeira vista, Siggi é chamado a conhecer o Kakadu. Aos poucos constrói uma amizade com Wolle, regada a bebida. Mas se o casal se engaja contra a repressão comunista a ponto de ser perseguido constantemente, Siggi tem planos de aderir - ele quer ser cenografista e o diretor do teatro de Dresden já disse a ele que, para subir na carreira, Siggi precisa largar as más companhias.

É a mesma estrutura de Os Sonhadores: há um estranho na trinca, como se seu mundo fosse diferente daquele que habita o casal, tentando puxar a garota para o seu lado. A cisão no triângulo é iminente - até chegar ao extremo que o título brasileiro fez o favor de contar por antecipação.

O diretor Dominik Graf conduz a história muito bem na sua porção feel good, quando Siggi está tomando contato com os prazeres da vida. Os indispensáveis alívios cômicos, na figura de um par de coadjuvantes, são um show à parte (e as sessões que a tia mediúnica de Siggi realiza, tentando envocar o espírito de um nazista para a sua viúva, são de um simbolismo bastante inteligente).

No fundo, porém, o que importa é a maneira como o trio principal se relaciona - e aí Graf escorrega, ao vilanizar a figura de Wolle e "facilitar" a torcida do espectador pelo romance de Siggi e Luise. Nesse ponto o filme deixa de ser parecido com um Bertolucci e ganha ares de um drama de novela. O herói, puro a ponto da ingenuidade; a mocinha, operando sacrifícios em nome do bem alheio; e o marido, eliminado por conta dos seus excessos. Três estereótipos massificados que a censura da fronteira da RDA não viu passar.