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The Red Turtle anima San Sebastian com discurso ecológico

Premiado em Cannes e confirmado no Anima Mundi, longa é um poema visual sem diálogos

18.09.2016, às 19H56.

Por onde se olha no Festival de San Sebastián, em uma 64ª edição lotada de astros (Ewan McGregorHugh GrantEthan Hawke) e medalhões da direção autoral (Oliver StoneBertrand BonelloEmir Kusturica), o que mais se destaca entre o público, não importa de que idade, são os filmes de animação, num cardápio de dar inveja às maiores mostras do setor. Só neste domingo, dois exemplares mais populares do setor mobilizaram filas quilométricas: Cegonhas, abrilhantado por um time local famoso de dubladores, e Festa da Salsicha, que virou um cult instantâneo entre os adultos pela boca suja de seus embutidos tagarelas.

Igual sucesso, porém mais entre espectadores com dentes de leite, fez Ma Vie de Courgette, um stop-motion suíço sobre um bando de crianças que faz da amizade uma arma contra a carência e contra o bullying. Mas a febre animada nº 1 do evento espanhol é uma trama ecológica definida pela imprensa europeia como o maior candidato do continente ao Oscar: The Red Turtle. A direção é do animador holandês Michael Dudok de Wit (oscarizado em 2001 pelo curta Father and Daughter), que contou com o suporte técnico dotradicional Studio Ghibli, do Japão, onde nasceram pérolas do mestre Hayao Miyazaki (de A Viagem de Chihiro).

Eu fui procurado pelo Ghibli de uma maneira muito generosa, com liberdade para oferecer produtos, e respondi que, apesar da honra, tinha medo de não ter algo que pudesse ser lucrativo, afinal, meus filmes são muito autorais, muito pessoais”, disse Dudok em entrevista ao Omelete, direto de Cannes. “Mas a resposta que tive foi das mais confiantes. Eles me disseram que não se preocupavam com lucro, mas com a arte. Segui em frente e propus algo que abordasse a condição humana a partir do respeito com a Natureza. Queria contar uma história sobre tolerância”.

Como resultado por sua confiança na oferta do Studio Ghibli, Dudok acabou sendo laureado com o prêmio especial do júri no Un Certain Regard do Festival de Cannes, em maio, de onde saiu ovacionado. O mesmo se deu aqui em San Sebastián, onde The Red Turtle foi exibido na sexta. Reações parecidas são esperadas da passagem do filme pela programação do Anima Mundi 2016 (no Rio de Janeiro, ela vai de 24 a 30 de outubro; em São Paulo, de 2 a 6 de novembro).

Animação é uma forma de sensibilizar nosso olhar pelo que preservamos de mais lúdico: a fabulação que transcende o realismo”, disse o animador. 

Sem diálogos, alimentado por uma inquietação diante da preservação da Natureza, o filme acompanha os esforços de um náufrago para sobreviver nula ilha deserta, onde uma exótica tartaruga vermelha gigante esconde segredos em seu casco. Com apenas 1h20m de duração, The Red Turtle esgarça todas as fronteiras de linguagem dos desenhos, trafegando entre o realismo e a fábula, numa espécie de poema visual.

A questão mais delicada era imprimir mobilidade com o máximo de verossimilhança aos animais, dando sobretudo à tartaruga uma paleta ampla de movimentos”, disse Dudok. 

Nesta quinta, numa seção especial dedicada a mestres da direção, San Sebastián joga seus holofotes sob a produção animada adulta do Japão, com a love story paranormal Your Namecom fôlego de sobra para demarcar a fúria narrativa de Makoto Shinkai, um mestre do desenho. O festival espanhol chega ao fim do dia 24, com a entrega de prêmios de júri oficial e popular, e a exibição do cinebiográfico L’Odyssée, um drama sobre a vida do oceanógrafo pop Jacques-Yves Cousteau, vivido por Lambert Wilson.