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Mais do que um desenho (bem) simples

Mais do que um desenho (bem) simples

MH
18.01.2002, às 01H00.
Atualizada em 11.11.2016, ÀS 19H03
Boas novas chegam da Argentina. Apesar da recessão e do caos das instituições, o cinema dos hermanos mantém a sua produção e a sua força incólumes. Enquanto o cinema brasileiro discute meios estatais de incentivar a indústria e combater a influência norte-americana, na Argentina as produções caseiras acumulam bilheterias espantosas. Um caso especialíssimo ilustra bem a situação. Em 1999, o desenho animado "Manuelita", de Manuel García Ferré, levou 2,3 milhões de pessoas ao cinema, patamar superior àquele alcançado anualmente por Xuxa no Brasil, por exemplo. Acumulou mais público, aliás, do que o aclamado "Nove Rainhas" ("Nueve Reinas", de Fabián Bielinsky) e os seus 1,9 milhões de espectadores em 2000. Para completar de forma reluzente, "Manuelita" chegou a ser escolhida para concorrer a uma indicação ao Oscar de Filme Estrangeiro em 2000.

Agora, "A Tartaruga Manuelita", na tradução para o português, chega ao Brasil trazido pelo SBT, parceiro tradicional de produções latinas. Por tratar-se de uma animação feita com técnicas quase artesanais, à maneira do brasileiro "O Grilo Feliz" (2001), de Walbercy Ribas, os seus números assustam. Um aspecto singular, entretanto, explica o sucesso da tartaruguinha. Criada pela escritora María Elena Walsh no início dos anos 60, juntamente com vários outros personagens pitorescos, a canção de Manuelita se imortalizou de tal maneira no imaginário infantil e no folclore argentino que nove entre cada dez tartarugas do país ganham o seu nome. Celebre em sua pátria, María Elena teve textos infantis musicados até mesmo pela cantora Mercedes Sosa. Em Pehuajó, na província de Buenos Aires, citada na canção como lugar do nascimento de Manuelita, ergueu-se uma estátua do animalzinho na entrada da cidade.

A história começa com o nascimento da tartaruga, meiga e curiosa. Manuelita sonha em partir do seu vilarejo e conquistar o mundo. Então, quando ganha a chance de voar num balão, traça Paris como o seu destino. Diz a canção: "¿Manuelita, Manuelita, Manuelita dónde vas con tu traje de malaquita y tu paso tan audaz&qt;&" Apesar do apelo forte entre os argentinos, a ingenuidade saudável e a simplicidade da trama atingem em cheio qualquer criança com menos de seis anos. Numa perspectiva determinista - e, por isso mesmo, um tanto maquiavélica - é possível comparar a fábula com o estereótipo do cidadão portenho. Enraizado em costumes ditos europeus, um tanto xenófobo, relevaria qualquer aliança na América do Sul em busca de seu verdadeiro destino enobrecido. Claro, a análise cheira mais a provocação do que propriamente constatação. Mais importante que polemizar, não custa lembrar, é aplaudir a energia do cinema argentino.