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Sonhos de Peixe | Crítica

Sonhos de Peixe - 30a. Mostra Internacional de Cinema

19.10.2006, às 00H00.
Atualizada em 09.11.2016, ÀS 07H03
Sonhos de Peixe
Rússia/Brasil, 2006.
Drama - 115 min.

Direção e roteiro: Kirill Mikhanovsky.

Elenco: José Maria Alves, Rúbia Rafaelle da Silva, Chico Diaz, Phelippe Haagensen, Yves Hoffer, Demóclito da Silva "Nego".

Apaixonado pelo Brasil, o diretor russo Kirill Mikhanovsky - ou KM, como é conhecido por aqui - filmou em 2004, ao longo de seis semanas no litoral do Rio Grande do Norte, uma co-produção Brasil-Rússia.

É curioso como o estilo de Mikhanovsky, que também assina o roteiro, de russo tem pouco. O filme é absolutamente brasileiro e fala de questões recorrentes na nossa cinematografia, com um olhar fascinado pela cultura nordestina e seu povo.

O drama acompanha a vida de Juscelino (José Maria Alves), órfão e filho de pescadores que segue a perigosíssima profissão do pai: mergulha com bomba para pegar lagostas. Empenhado, o jovem tem o sonho de ter seu próprio barco e, para tanto, trabalha duro ao lado do veterano João (Chico Diaz). Apenas uma coisa o distrai: o amor por Ana (Rúbia Rafaelle da Silva). O problema é que a paixão não é correspondida - Ana quer mais da vida que ser esposa de pescador - e Juscelino enxerga seu futuro ali mesmo, levando a vida de forma tão regular quanto as marés.

Com orçamento enxuto, a produção contou exclusivamente com locações reais e um elenco amador, formado por pessoas que realmente vivem ali, na pequena Baía Formosa. Os únicos nomes conhecidos são os de Chico Diaz (Os Matadores) e Phelippe Haagensen (Cidade de Deus), mas os demais integrantes do elenco principal não fazem feio. Prova dessa ajuda em âmbito municipal ao filme são os créditos... devem haver uns mil nomes ali, pelo menos!

O roteiro é bem trabalhado, cria interesse e insere conflitos nos momentos certos, fazendo com que as crenças sobre o protagonista mudem aos poucos. A competição com um "bugueiro" local (Haagensen), pelo lugarzinho na sala de Ana na hora da novela, por exemplo, dá uma injeção de ousadia no coração de Juscelino, criando momentos memoráveis na segunda metade do filme. Contá-los arruinaria gratas surpresas, mas vale dizer que são algumas das cenas mais cheias de agonia consumista do cinema nacional recente.

Mas a preocupação de Mikhanovsky não é puramente estética ou narrativa, assim como suas intenções não são apenas o registro do "exótico" Brasil. Ao se entranhar na vida desses brasileiros que tiram seu sustento do mais caro fruto do mar existente em nossas peixarias, o cineasta nos traz uma realidade difícil de engolir. A que custo chega o belo crustáceo à mesa dos afortunados? Com a pergunta, fica evidente o parentesco russo da produção.

Nota do Crítico
Bom