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Se Não Nós, Quem? | Crítica

Filme alemão resgata a geração que mais sofreu com a herança maldita do Holocausto

10.11.2011, às 20H43.
Atualizada em 17.11.2016, ÀS 06H07

O alemão deve ser o único idioma que tem uma palavra específica - "schadenfreude" - para designar o prazer diante do sofrimento alheio. Há décadas o país tenta entender e expurgar o ódio que deu origem ao Holocausto, e Se Não Nós, Quem? trata da geração que mais sofreu com esse legado.

se não nós, quem

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Bernward Vesper (August Diehl) e Gudrun Ensslin (Lena Lauzemis) são filhos de colaboradores do nazismo. A justificativa de pais na época, além do desconhecimento do genocídio dos judeus, é que a família vem em primeiro lugar - e aderir à oficialidade em tempos de guerra seria a única forma de proteger os filhos de represálias.

Toda justificativa é insatisfátória, de qualquer forma, diante de crias dos anos 60 como Bernward e Gudrun. A geração famosa por questionar os paradigmas estabelecidos - do Maio de 1968 ao flower power e o movimento dos direitos civis - tem na contestação seu motor, e o filme do diretor Andres Veiel não deixa dúvidas de que sua intenção é filiar jovens alemães como Bernward e Gudrun a esse movimento.

Imagens de arquivo em preto e branco, ao som de canções pop em inglês, repassam momentos marcantes do pós-guerra de forma didática. O mais interessante é aquele que mostra que a geopolítica mundial tem um reflexo muito particular na Alemanha: a crise dos mísseis em Cuba e o temor de uma guerra nuclear aumentam em dez vezes a venda de enlatados e alimentos não perecíveis no país, um ganho que todas as ações do governo para incentivar o consumo e aquecer a economia não tinham alcançado.

Ou seja, há certos processos dentro do próprio "sistema", muitas vezes involuntários, que acabam sendo mais potencialmente transformadores do que as revoluções incubadas nos movimentos sessentistas. O momento de Se Não Nós, Quem? que resgata essa cena de arquivo sobre a crise dos mísseis é bem breve, mas ecoa ao longo do filme - que do meio para o fim começa a discutir se as "revoluções" funcionam para expurgar o passado.

Embora Veiel faça um filme bastante quadrado e expositivo - a todo momento fala-se de culpa e de reação a culpa em tom discursivo, como numa longa assembleia que avança além da hora - a história de Bernward Vesper segura Se Não Nós, Quem?. A geração dos extremistas alemães da qual Gudrun Ensslin faz parte, retratada em filmes como O Grupo Baader-Meinhof, lançado no Brasil em 2009, normalmente exclui a figura de Vesper. É nele, porém, que sente-se de forma mais dramática o peso hereditário do Holocausto.

Dramática porque Bernward Vesper é a pessoa, no filme, que trilha o caminho do expurgo da culpa sem negar o sistema. Ele inclusive estabelece o que há de mais próximo a uma familia tradicional, a contragosto de Gudrun, e nela parece encontrar um alívio, nem que seja provisório. O fato de essa expurgação também ser insatisfatória só revela a dificuldade que os alemães têm até hoje em superar essa má herança.

Se Não Nós, Quem? | Cinemas e horários

Nota do Crítico
Bom