Filmes

Crítica

Scoop - O grande furo

Woody Allen filma Scarlett Johansson como ninguém

15.03.2007, às 15H40.
Atualizada em 21.09.2014, ÀS 13H23

Woody Allen perdeu o timing. Scoop - O Grande Furo (Scoop, 2006) se emparelha com Dirigindo no Escuro e Igual a tudo na vida entre as comédias mais fracas de sua safra recente - idéias medianas mal executadas, dramaturgia frouxa, ritmo atravancado pela inserção de piadas textuais demais.

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Em dois aspectos, porém, Allen permanece genial: os nomes que inventa para os personagens e a maneira como filma as mulheres.

Scarlett Johansson é a nova Diane Keaton, a nova Mia Farrow, a musa da vez. Mais de um cineasta já capturou na tela a fotogenia mista de inocência e sensualidade da atriz. Scarlett transpira volúpia em Moça com brinco de pérola, Dália Negra, e mesmo em Match Point, a sua primeira parceria com Allen. Em nenhum desses casos, porém, a atriz vive uma personagem tão antiestética como em Scoop.

Na comédia ela interpreta Sondra Pransky, uma estudante de jornalismo estadunidense que está morando em Londres. É o estereótipo da nerd cabeça-de-vento: óculos que escorregam pelo nariz, cabelo preso com elástico, roupas largadas, braços caídos junto ao corpo, jeito deslumbrado de falar. Scarlett como Sondra, vista a três passos de distância, é o avesso de um objeto de desejo. Mas é só a câmera de Allen se aproximar...

A história começa com a morte do famoso jornalista inglês Joe Strombel (vivido galhardamente por Ian McShane). Na barca de Caronte que conduz a sua alma ao Além, o jornalista ouve um furo de notícia: o aristocrata britânico Peter Lyman (Hugh Jackman) é o assassino das cartas de tarô que a polícia britânica tanto procura. Strombel não pode deixar a história passar. Ele então aparece para Sondra, que aceita o desafio e promete investigar o caso. Ela leva consigo o mágico Sid Waterman (Allen), a única outra pessoa que viu o fantasma de Strombel.

Chegar perto de Lyman não é difícil. Ele frequenta a piscina de um clube de alta classe, e Sondra consegue um jeito, com a ajuda de Sid, de entrar no clube também. Neurótico como todos os seus personagens, Sid/Allen dá as dicas para a menina se aproximar do suspeito-galã: "Você é bonitinha, provavelmente esse cara se interessaria por você, particularmente se ele tiver uma mente doentia". Sid então fala para ela fingir que se afoga, para ver se Lyman acode.

O fato de Allen deixar a cena no momento em que Scarlett entra de roupão na área da piscina é como um sinal de que o seu lado ator ficou em suspenso e o lado diretor assumiu o negócio. Ela tira o roupão. Está de maiô vermelho, tipo Baywatch. É o único momento do filme em que Scarlett fica mais alta do que Jackman, que fora d'água deve ter o dobro do tamanho dela. A câmera acompanha a atriz entrando na água sem lhe mostrar o corpo inteiro. Ela encena, se debate, grita, Lyman ajuda. Quando Scarlett senta molhada na beirada, coluna ereta, ofegante, uma luz se reflete na água, uma epifania.

Permita a breguice: é como ver uma borboleta, mesmerizante, deixando o casulo de lagarta.

Esteta da palavra, Woody Allen mostra, em uma tomada, que ainda consegue ser um cineasta, um artista da imagem. Ele enxerga e desnuda o que há de mais erótico no recato da atriz. E Scarlett, em contrapartida, já à vontade no bombardeio de diálogos dos filmes dele, atua com o descompromisso que a situação pede. Ela finge que não é gostosa, Allen faz de conta que a enfeia. Nesse acordo quem sai ganhando é a atriz, que vê empinar o seu mito de menina-mulher.

Nota do Crítico
Bom