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Crítica

Ressurreição | Crítica

Filme revisita a história de Cristo como um curioso policial noir

17.03.2016, às 15H58.

O principal interesse de Ressurreição (Risen) depois de seu esperado e evidente apelo evangelizador é o fato de o filme de Kevin Reynolds não seguir o formato tradicional dos épicos bíblicos. Na história do tribuno romano encarregado de investigar o desaparecimento do cadáver de Jesus Cristo, após a Crucificação, o espectador encontrará um inesperado filme policial que segue alguns preceitos do noir.

Joseph Fiennes vive o tribuno Clavius, que se enquadra no perfil do detetive particular típico: veterano de uma vida de violência, sonha com a aposentadoria, enquanto aceita a contragosto um serviço ingrato. O Pilatos de Peter Firth serve aqui como a figura clássica do contratante que está preocupado com a manutenção do status quo, o velho político ameaçado pela boataria nas ruas. Até mesmo a mulher desviada da vida, que desperta no detetive um misto de perversão e senso de bom-mocismo, não falta em Ressurreição, embora Maria Madalena não seja exatamente uma femme fatale.

Enquanto joga com as situações e as viradas que configuram o noir, o filme de Reynolds consegue injetar suspense e alguma novidade numa das narrativas mais manjadas do Ocidente. Não só por acrescentar elementos curiosos (e frequentemente estranhos) ao contexto bíblico, como na cena em que o tribuno questiona seu informante sobre o local onde os apóstolos guardam suas armas, mas por reinterpretar nos tempos antigos as intrigas imorais que associamos ao gênero no século 20, como a cena no banho (e não num bar) em que Pilatos e Clavius declaram veladamente sua disputa por poder.

Se Ressurreição se torna um filme frustrante no seu terço final, não é somente porque as trocas lúdicas com o noir se esgotam. O que acontece no fim é a mais perfeita incompatibilidade: enquanto nos noir o anti-herói abraça seu destino trágico, num embate que muitas vezes resulta numa redenção pelo sangue, o desfecho de Ressurreição é apaziguador, anticlimático. No noir, o despertar para a perversão leva ao autoconhecimento. No Cristianismo em geral, os nossos pecados sempre devem ser purgados, mistificados, afinal foi para pagá-los que morreu o nazareno.

Nota do Crítico
Regular