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Crítica

O Grande Gatsby | Crítica

Elenco salva adaptação de Baz Luhrmann para o clássico de F. Scott Fitzgerald

06.06.2013, às 18H32.
Atualizada em 29.06.2018, ÀS 02H43

Baz Luhrmann conta que a ideia de adaptar O Grande Gatsby surgiu em uma viagem insone pelo Expresso Transiberiano: “Eram quatro horas da manhã, eu tinha uma garrafa de vinho e dois livros comigo. Um deles era O Grande Gatsby. Quando o terminei fiquei pasmo. Decidi que ia adaptá-lo um dia".

O Grande Gatsby

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O Grande Gatsby

Essa leitura ébria e “em movimento” talvez explique um pouco da sua versão para o livro de F. Scott Fitzgerald. Como as exóticas paisagens que ornam a viagem no famoso trem que liga Moscou a Pequim, o filme é esteticamente atrativo, graças a direção de arte e ao elenco perfeitamente caracterizado. A velocidade inebriada com que se move, contudo, impede a visualização de detalhes essenciais, fazendo com que passe pelos olhos do espectador apenas um belo borrão e não um retrato vívido das paixões humanas – como no livro publicado em 1925.

Como um leitor descuidado, preocupado apenas com o contexto, Luhrmann ignora a perspicácia de Fitzgerald e aplica cada conceito de forma exagerada, tomando simples metáforas como sentenças literais. Nem a característica narração em primeira pessoa do romance escapa. O depoimento de Nick Carraway (Tobey Maguire) precisa ser devidamente explicado, contextualizado. No filme, ele não é apenas a voz que testemunha a história de Jay Gatsby – seu misterioso vizinho bilionário que oferece concorridas e descontroladas festas na casa ao lado. Resgatando a figura do escritor desesperado que conduz Moulin Rouge, Nick é um alcoólatra moribundo que escreve seu relato por prescrição médica. As palavras tomam conta da tela inúmeras vezes, em um exercício óbvio de alertar ao espectador sobre a conexão entre as imagens e a palavra escrita.

Ainda emulando Moulin Rouge, a trilha sonora anacrônica funciona na teoria, sob a ideia de que Jay-Z e o Hip Hop seriam o equivalente contemporâneo à efervescência do Jazz da década de 20. Porém, Luhrmann, que já dominara a fórmula da sobreposição de épocas e estilos em Moulin Rouge e Romeu + Julieta, sintonizando perfeitamente a música pop à Belle Époque e a Shakespeare, perde a mão em O Grande Gatsby. As festas são tão belas e excêntricas como as de seus filmes anteriores, mas falta destreza na hora de conectar as músicas – interpretadas, entre outros, por Beyoncé, Lana Del Ray e Jack White – à realidade dos seus personagens.

Além da Era do Jazz

Há mais do que apenas caos e glamour nas reuniões na mansão Gatsby, mas o filme não passa da superfície. Se na versão de 1974, roteirizada por Francis Ford Coppola, faltava energia nas festas de Jay Gatsby (então vivido por Robert Redford), a adaptação de Luhrmann (escrita com o roteirista Craig Pearce), perde fôlego pelo excesso, em festas tão hiperativas que vão para todos os lados, mas não chegam a lugar algum. De profundo, apenas o 3D, que dá textura às cenas inundadas por papel colorido e reluzente e aos vestidos cheios de franjas, belamente bordados.

A salvação de Luhrmann está mesmo no elenco. Leonardo DiCaprio domina todas as marcas do clássico playboy e personifica Jay Gatsby para uma nova geração. Daisy Buchanan, a razão de ser da riqueza e das festas do personagem-título, ganha uma devida desconexão com a realidade nas mãos de Carey Mulligan, sem parecer tola como a mocinha de Mia Farrow na versão setentista. Tobey Maguire dá ao seu Nick Carraway, o jovem simples que chega a Nova York para ganhar a vida no mercado de ações, uma ingenuidade que contrasta perfeitamente com os desenganos amorosos e financeiros que o cercam.

Isla Fisher e Jason Clarke não são exceção, e conseguem criar na relação de Myrtle Wilson, a amante de Tom Buchanan, e seu marido, o mecânico George Wilson, o necessário contraste social entre tanta opulência – econômica e emocional. A grande surpresa, porém, fica por conta de Joel Edgerton (Tom Buchanan, o marido de Daisy) e Elizabeth Debicki (Jordan Baker, amiga de Daisy e potencial interesse amoroso de Nick). Edgerton atinge o equilíbrio perfeito entre o carismático e o desprezível, e Debicki expressa toda a classe e a força da sua personagem, uma jogadora de golfe nos primeiros passos da emancipação feminina – uma pena que acabe subaproveitada no filme.

O Grande Gatsby é um romance sobre desilusão. Baz Luhrmann, que se dizia preocupado em "capturar todo o espírito do livro e seu tempo", foi incapaz de entender que a importância da obra-prima de Fitzgerald transcende as marcas da agitação social da Era do Jazz e da Lei Seca nos EUA.  O livro contrapõe o sonho americano à natureza humana para revelar o vazio emocional dos personagens ao final de cada festa. Na sua leitura, Lhurmann viu apenas a chance de criar um novo Moulin Rouge. Falhou duplamente e o cinema continua sem uma boa adaptação da história de Jay Gatsby.

Nota do Crítico
Bom