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A contribuição alemã para a 28ª Mostra BR está longe de ser desprezível. São dezesseis longas do país, mais dezessete co-produções. Tem desde uma minissérie em seis partes produzida pela German TV Group, Heimat 3 (2004), de Edgar Reitz, até O Milagre de Berna (Das Wunder von Bern, de Sönke Wortmann, 2003), filme-panfleto que levanta a moral tedesca ante os preparativos da Copa do Mundo de 2006. Em meio à vasta oferta, Estrela do Norte (Northern star, 2003) entra nessa seleção de forma tímida.
A criação crua e naturalista do diretor e roteirista Felix Randau não faz muito barulho: não se arrisca em experimentalismos nem se rende à narrativa comercial. Numa eventual estréia no circuito, o seu discurso seco e a sua trama intimista podem se destacar melhor do que no meio de uma mostra de altas expectativas.
Anke (Julia Hummer) viu o pai se suicidar. Era pequena, tinha cinco anos, e ainda não compreendia, mas a lacuna familiar fez com que crescesse rancorosa. Aos dezoito, culpa a mãe (Lena Stolze), supostamente adúltera, pela morte dele. Não fosse a tragédia, a família embarcaria no pequeno veleiro zelado por ele, numa viagem apaixonada pelos mares, sem volta definida.
Anke ainda vê o veleiro, de nome Estrela do Norte, empoeirado no jardim de um jovem vizinho, Ulf (Nicolas Romm), que o comprou há anos. Coincidência, o pai de Ulf também já morreu. Mas ao contrário da moça, ele não tem amargura, muito menos saudade. Quando Anke descobre que a mãe planeja trazer para casa o seu novo namorado, ela foge. Sem ter para onde ir, hospeda-se na casa de Ulf. E acaba gostando da idéia dele de arrumar o barco e partir ao mar.
Randau, roteirista e diretor, trata essa premissa meio lírica, meio shakespeareana, vale repetir, de forma agressivamente lacônica. A introspectiva Anke limita os próprios sentimentos à raiva. Ulf poucas vezes esboça, como ela, alguma satisfação. Até mesmo a angústia da mãe, diante da partida da filha, logo desemboca na desesperança. Isso embute uma fraqueza e uma virtude no filme. A dureza e o distanciamento sugerem que até mesmo Randau julga a história desimportante. Por outro lado, é assim, na realidade, que o amadurecimento caminha à vida adulta: ressentimentos raramente são verbalizados.
É o jeito alemão de se esquivar do chavão "só o tempo fecha feridas".