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Crítica

Magic Mike XXL | Crítica

Filme de estrada movido a whey exorciza as nossas diferenças

30.07.2015, às 17H28.
Atualizada em 29.11.2021, ÀS 14H24

"Não embarque nessa viagem se não quiser ir até o fundo da toca do coelho, cara", pede Joe Manganiello para Channing Tatum no começo de Magic Mike XXL, a continuação de Magic Mike que deixa de lado as problemáticas questões morais do primeiro filme para aderir ao road movie mais reflexivo. É nesse gênero, surpreendemente, que o Mike Mágico se realiza, entre tangas, doces e vinhos caros.

Uma constatação que não deveria ser tão supreendente assim. Porque se a estrada sempre foi o caminho dos grandes processos contraculturais dos EUA, de Pé na Estrada de Jack Kerouac ao Sem Destino de Dennis Hopper, não haveria motivos para não receber bem também os strippers de Steven Soderbergh (que deixa a direção nesta continuação para Gregory Jacobs, mas continua responsável pela câmera e pela montagem, sob pseudônimos). Na era do macho em crise, Mike e seus amigos marombeiros são os nossos beatniks, os nossos hippies - tipos à margem do sistema, ridicularizados, em busca de uma nova legitimidade, entre um lap dance e outro.

Das cenas de Magic Mike XXL que existem em função desse sentimento de deslocamento - o noivo frustrado que refuga no flerte, os brancos emasculados diante dos negros "evoluídos", os pobretões hospedados na mansão do ricaço (o grande macho alfa do filme, estrategicamente ausente em cena) - nenhuma é mais sintomática dessa realidade do que o momento em que Manganiello é desafiado pelos amigos a seduzir uma caixa de loja de conveniência de beira de estrada. O sorriso discreto que ela dá ao final do striptease dele pode ser entendido tanto como encanto quanto como compaixão: aquele aceno condescendente que damos às pessoas loucas, para não contrariá-las.

Essa cena também exemplifica o tipo de humor que torna Magic Mike XXL uma comédia tão bem sucedida na modulação que faz o tempo inteiro entre o sarcasmo e a empatia. É essa modulação que permite que o filme trate de assuntos do momento (a crise econômica, a libido feminina) sem cair na mesma armadilha do primeiro Magic Mike, de tratar seus subtextos com tanta gravidade. No mais, é realmente impossível levar tão a sério um road movie que vai só de Tampa a Myrtle Beach, percurso que deve dar umas nove horas de carro, se muito.

A tentação de encarar Magic Mike XXL como uma grande piada, porém, talvez impeça o espectador de notar como a fotografia de Soderbergh cuidadosamente traça uma fantasmagoria desses espectros que assombram o sonho americano. Não é por acaso que a personagem de Jada Pinkett chama Mike de "fantasma". Das silhuetas no escuro da praia à noite, passando pela luz negra da festa da cafetina (momento mais surrealista desta toca do coelho carrolliana), aos galhos das árvores que envolvem a viagem como uma floresta encantada, paira sobre o filme essa carga, essa presença sem nome - cuja dança hipnótica de Channing Tatum cuidará, ao fim, de exorcizar.

O longa de Jacobs não é o primeiro a desmistificar o corpo em nome de uma nova harmonia social - vêm logo à memória os strippers de Ou Tudo ou Nada (1997), comédia inglesa que hoje é como uma tia piegas e cheia de pudor na comparação com Magic Mike XXL - mas poucos filmes hoje conseguem operar de forma tão eficiente um consenso entre alteridades. O branco e o negro (espelhados e igualados no número musical final), o homem e a mulher, o coletivo e o capital (com a chuva de dólares no 4 de julho sacramentando uma paz reencontrada no consumo) formam pares perfeitos de uma dança sexual que Magic Mike XXL realiza frontalmente, sem medo de ser feliz.

Nota do Crítico
Excelente!