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J. Edgar | Crítica

Clint Eastwood vai aos heróis como ícones para encontrar um Hoover em conflito com sua própria imagem

26.01.2012, às 20H00.
Atualizada em 29.06.2018, ÀS 02H40

Primeiro diretor do FBI, cargo que ocupou por 37 anos, John Edgar Hoover (Leonardo DiCaprio) decide que precisa contar sua história, a história do Bureau. Pede que sua secretária (Naomi Watts) encontre nas fileiras da casa um agente para datilografar a narrativa. Hoover, já calvo e obeso, não se contenta com nenhum, troca-os compulsivamente. São agentes moços e belos; o diretor Clint Eastwood parece tê-los escolhido (atores como Miles Fisher e Ed Westwick) pela fotogenia.

j. edgar

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Na verdade o elenco masculino de J. Edgar dá a impressão de ter sido todo selecionado, antes de mais nada, por critérios estéticos. Quando o jovem Hoover atravessa um corredor para inspecionar os novatos do recém-fundado FBI, em 1935, a maioria é formada por tipos apolíneos. Já personagens com desvios de caráter têm também, em alguns casos, "desvios de feição" (o nariz cartunesco de Richard Nixon, o queixo vilanesco de Bruno Hauptmann). Se as escolhas de elenco de Eastwood têm essa preocupação, pouco importa. O fato é que elas realçam o principal tema de J. Edgar: o herói como ícone.

É um tema que Eastwood - ator de heróis que se impunham mais pela presença do que pela palavra, como Dirty Harry, o Homem sem Nome dos faorestes de Leone, até o Walt Kowalski de Gran Torino - entende bem. Um herói se define por seus atos, mas um herói no cinema define-se também por sua imagem. O diretor do FBI sabe disso, nem que seja inconscientemente, por inveja ou vaidade: o único agente que ele demite durante aquela inspeção no corredor é mais alto e mais forte que Hoover.

Eastwood não só dá atenção especial aos momentos públicos de construção de imagem de Hoover (a visita ao alfaiate, os almoços, a mise-en-scéne de seu escritório), como entende que a mítica do FBI se estabelece de vez já no ano de fundação do Bureau, quando o público dos cinemas deixa de torcer para os gângsteres e passa a torcer pelos agentes, em filmes como G-Men Contra o Império do Crime, daquele 1935. O herói como ícone é um herói perene e inconteste.

Mas o legado do FBI (que Eastwood iguala em importância à Biblioteca do Congresso, em um paralelo no início do filme) não é o foco. Se Eastwood propõe reavaliar a pessoa de John Edgar Hoover, então, a única forma de fazê-lo é questionar a própria iconografia. Daí entra o tão importante e competente trabalho de maquiagem, que associa a ruína física do Hoover de DiCaprio ao peso dos anos represando sua homossexualidade e forjando uma nova imagem de si, à semelhança das estátuas que ele coleciona em seu quarto. Os arrojados saltos no tempo - Hoover entra velho no elevador e sai jovem, por exemplo - servem para reforçar a transformação física.

O tempo inteiro o filme sugere que Hoover se auto-impõe essa transformação para agradar a mãe. Por mais que reduza a complexidade do biografado, essa leitura edipiana feita pelo roteirista Dustin Lance Black (Milk) rende pelo menos um belo momento, a cena de J. Edgar em que Hoover se traveste de mulher. Para quem tudo era uma questão de imagem, o vislumbre de uma feminilidade, materializada diante do espelho, devia ser a mais sentida dor.

J. Edgar | Trailer legendado
J. Edgar | Cinemas e horários

Nota do Crítico
Ótimo