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Scooby-Doo: O Filme | Crítica

Defensável sob diversos aspectos, mas desprezível sob vários outros

03.10.2002, às 00H00.
Atualizada em 21.09.2014, ÀS 13H13

É difícil abordar um filme como Scooby-Doo (idem, 2002). Como muitas produções inconstantes, o trabalho do diretor Raja Gosnell é defensável sob diversos aspectos, mas desprezível sob vários outros. Eis dois tópicos esquemáticos: 

Por que ver?

A adaptação da história aos cinemas ficava dificultada pelo ingrediente do dogue-alemão falante e medroso. Pois os efeitos especiais da atualidade cobrem qualquer falha. O filme preenche com louvor a lacuna estética, dos fantasmas e monstros, dos cenários, dos figurinos e da construção digital do cachorro. O furgão da Mistério S.A. fica impecável. Matthew Lillard (o assassino do primeiro Pânico), no papel de Salsicha, rouba a cena, por mais que o clichê esteja desgastado. E Scooby está perfeito.

O espírito aventureiro e a procura por mistérios se mantêm. No entanto, a trama começa com uma premissa excêntrica. A sintonia entre Fred (Freddie Prinze Jr.), Daphne (Sarah Michelle Gellar), Velma (Linda Cardellini) e Salsicha já não é a mesma de outros tempos. O sucesso diante das câmeras de TV e algumas vaidades pessoais causam o rompimento do grupo. Dois anos depois da separação, um estranho convite reúne involuntariamente os detetives. Emile Mondavarious (Rowan Atkinson, o Mr. Bean), dono da Ilha do Terror, anda preocupado com terríveis acontecimentos em seu parque: os visitantes encerram sua estadia traumatizados de verdade.

Já que os roteiros do desenho não primavam pela verossimilhança, a trama estapafúrdia do filme não incomoda tanto. O clímax de trapalhadas e a revelação final continuam lá, assim como os pequenos detalhes - a gulodice de Salsicha, os biscoitos Scooby, etc. Vale ainda conferir a versão dublada, pelos desempenhos marcantes de Mário Monjardim, como Salsicha, e Orlando Drummond, o Seu Peru da Escolinha do Professor Raimundo, como Scooby. Para um fim-de-semana sem muitas pretensões, vale o ingresso.

Por que questionar
(ou, até, abominar)?

Acontece que a construção dos personagens não é tão fiel quanto a reconstituição dos figurinos. Daphne tornou-se uma moça mais do que sensual. Um Fred metido ridiculariza uma Velma tímida e revoltada. E a sugestão de um Salsicha maconheiro, envolvido em larica e fumaça, antes velada, acaba escancarada. O bobalhão, inclusive, apaixona-se por uma garota chamada Mary Jane, uma associação nítida com marijuana. Os mais velhos podem rir com a brincadeira, mas o desrespeito com Hanna e Barbera é absurdo.

Se Scooby-Doo fosse um herói de quadrinhos, Gosnell seria satanizado como um Joel Schumacher herege. É bem possível que o diretor, responsável por filmes sem identidade, como Nunca fui beijada (Never been kissed, 1999) e Vovó...zona (Big mommas house, 2000), tenha apenas assinado uma obra manejada por seus produtores e astros, como o casal-modelo Prinze e Buffy.

Lógico, fica difícil julgar Scooby-Doo, diante de um público jovem acostumado ao besteirol e à escatologia. A inocência do desenho (e de grande parte das criações infanto-juvenis pré-década de 90) ficaria deslocada, ingênua demais. Este tipo de discussão, além de espinhoso, merece uma atenção maior. O caso é que o filme de Gosnell não precisava apelar tanto para situações adultas e um humor inclassificável (a disputa de gases entre Salsicha e Scooby é o melhor exemplo), já que o carisma das personagens garantiria sozinho, sem apelações, o sucesso da produção.

Nota do Crítico
Regular