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Last Days | Crítica

<i>Last Days</i> - Festival do Rio

23.09.2005, às 00H00.
Atualizada em 06.11.2016, ÀS 20H04

Last days
EUA, 2005
Drama, 97 min.

Direção: Gus Van Sant
Roteiro: Gus Van Sant

Elenco: Michael Pitt, Lukas Haas, Asia Argento, Scott Green, Nicole Vicius, Ricky Jay, Ryan Orion, Harmony Korine, Rodrigo Lopresti, Kim Gordon

Mesmo consagrados, alguns diretores ousam em mudar de estilo. Outros se utilizam da chamada licença poética como uma forma de homenagear seus ídolos. Um exemplo disso são os filmes no estilo que Ingmar Bergman e Woody Allen vêm fazendo há tempos. Normalmente, não são por essas películas que eles são lembrados, mas isso não significa que o filme não tenha relevância dentro da sétima arte. Gus van Sant é mais um desses casos. Depois de um início de carreira exuberante, com Garotos de Programa, Drugstore Cowboy e Um Sonho sem Limites, ele resolveu mudar seu estilo de fazer filmes.

Desde Gerry, Van Sant vem experimentando sons, imagens e conteúdos. Ele abandonou a fórmula habitual de se fazer dramas (Gênio Indomável) e vem se especializando em contar histórias de forma não linear, com foco no ambiente e na textura. Seu objetivo é colocar seus espectadores num espaço emocional e físico ao mesmo tempo. Sua câmera é tão distante que nos remete ao sentimentos de um voyeur. Com esse método, ele foi premiado em Cannes, em 2003, por Elefante - supervalorizado na opinião de alguns críticos.

Em Last Days (2005), inspirada nos últimos momentos de vida do cantor Kurt Cobain, essa experiência chega ao nirvana (não resisti ao trocadilho). Parece um filme feito em casa, com pouca edição, diálogos e imagens estáticas que nos apresentam os pensamentos mais profundos do protagonista. Blake é uma estrela de rock solitária que passa quase todo o seu tempo desmaiado ou perambulando pela casa. Às vezes, pega seu violão e toca alguns acordes.

A melancolia reina. Blake está em busca de algo. E por mais que procure, não consegue encontrar. Esse ciclo nunca se completa, pois Blake está vazio por dentro, como se tudo tivesse sido sugado de sua vida. Dizem que os suicidas sentem esse vazio. A morte é a única solução para tal agonia. E foi nesse vazio, o mesmo que teria sentido Kurt Cobain, que Van Sant se inspirou para construir seu filme. Não é uma cinebiografia do ex-líder do Nirvana, mas sim um retrato do seu interior, sua aflição.

O elenco não poderia ser melhor. Van Sant optou por Michael Pitt para viver Blake. Ator de poucos gestos e palavras, Pitt foi uma escolha acertada. O restante do elenco não importa muito. Todos estão lá como párias, verdadeiros sanguessugas. Blake os evita. Para os cinéfilos, os rostos mais conhecidos são Lukas Hass e Asia Argento. Como sempre, Hass faz um cara introvertido e esquisito, e Asia aparece de calcinha fio dental para variar.

Mas todos (inclusive Blake) tornam-se irrelevantes já que o verdadeiro tema do filme é a procura. A procura do protagonista por uma porta de saída para seu tormento. Sem julgamentos, Van Sant lhe abre literalmente uma janela de escapatória. Alguns viram nessa imagem uma metáfora para Stairway to Heaven, música do Led Zeppelin.

Independente das interpretações e devaneios, Van Sant perdeu uma ótima oportunidade de criar uma pequena obra-prima. Se ele tivesse seguido com mais afinco o seu próprio cinema, com certeza teria alcançado tal objetivo. Incomoda a pretensão de sua película. Sem contar o agravante de beber além da conta nas fontes dos mestres Luis Buñuel e Jean-Luc Godard. Mas isso não desabona suas intenções, pois qualquer que seja o experimento de Van Sant, ele sempre terá relevância.

Nota do Crítico
Bom