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Histórias Mínimas | Crítica

<i>Histórias mínimas</i>

22.06.2004, às 00H00.
Atualizada em 21.09.2014, ÀS 13H16

Histórias mínimas
Argentina, 2002
Drama - 92 min.

Direção: Carlos Sorín
Roteiro: Pablo Solarz

Elenco: Antonio Benedicti, Javiera Bravo, Javier Lombardo, Carlos Montero, Aníbal Maldonado

A visão que a maioria dos brasileiros tem dos argentinos é a da sua capital Buenos Aires, a mais européia de todas as cidades sul-americanas. Histórias Mínimas (2002) começa desmontando esta idéia de que todos os argentinos têm cabelos e olhos claros. María Flores (Javiera Bravo), uma das personagens principais, mostra que não é nada disso. Sua pele é escura, seus cabelos são negros e seus traços são típicos de uma índia. Ela mora num vilarejo na Patagônia e acaba de ser sorteada por um programa de TV. Para participar de um jogo de sorte ao vivo e voltar para sua casa com um prêmio, ela terá de se dirigir até San Julian, onde ficam os estúdios da emissora.

A cidade é destino também de Don Justo (Antonio Benedictis), um homem de 80 anos que espera sua hora bebendo chimarrão e olhando para a estrada à frente da mercearia local, que um dia foi sua, mas hoje é gerenciada por seu filho e sua nora. Um dos motoristas que sempre passa por ali avisa o velho que viu seu antigo cachorro em San Julian. Sem muitas perspectivas por ali, Don Justo começa também sua caminhada até a cidade.

O último deste trio de protagonistas é Roberto (Javier Lombardo), um vendedor que, como um marinheiro das estradas, tem uma namorada em cada porto. Desta vez, os ventos o levam, claro, a San Julian. Uma criança de lá vai fazer aniversário e ele leva um bolo surpresa, como forma de conquistar a mãe. Lombardo é o único ator profissional dos três. Javiera é uma local da Patagônia e Benedictis é um uruguaio de Montevideo e esta foi a primeira vez que ambos trabalharam em frente a câmeras.

O cineasta Carlos Sorín, premiado diretor publicitário argentino, teve esta idéia de não usar profissionais quando filmava uma propaganda que mostraria um pequeno vilarejo em polvorosa com a chegada do telefone. Momentos antes de começar seu serviço, ele olhou em volta e viu que todos os habitantes daquele pueblozito estavam realmente em êxtase com a presença de câmeras e toda aquela parafernália técnica. Sua primeira ação foi dispensar os atores e procurar pessoas da região para o comercial.

Além da síndrome do segundo filme

Histórias mínimas é a terceira experiência de Sorín no cinema. Em sua estréia, La película del rey (1986), conseguiu ir diretamente ao Olimpo e ganhou um leão de prata em Veneza. Em seguida, com co-produção inglesa fez Eversmile, New Jersey (1989), estrelado por Daniel Day-Lewis. O filme foi mal e não chegou a entrar em cartaz nem na Argentina. Em 2002, 13 anos depois de conhecer o fracasso, este Histórias mínimas não apenas lhe trouxe de volta a alegria de voltar ao cinema como a de ganhar prêmios - os mais importantes sendo os do Festival de San Sebástian e o Goya de melhor filme estrangeiro.

O formato do road movie é, segundo Sorín, uma escolha lógica para um filme passado na Patagônia. A região, presente de alguma forma nas três aventuras do diretor pela sétima arte, é cenário perfeito para um filme quase documental como este, pois naquele deserto não há um único lugar que seja perto de onde você está. Por isso, o carro é considerado muitas vezes um bem mais importante do que a própria casa.

É nesta árida estrada que seremos apresentados às duras vidas de María, Roberto e Don Juan, veremos sua interação com outros personagens, descobriremos seus dramas e compartilharemos suas dúvidas. Há humor. Há drama. E, principalmente, há muita realidade em mais este belíssimo exemplar do cinema argentino.

Nota do Crítico
Ótimo